Capítulo 42

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Passados cinco minutos debruço-me na bagageira do carro para procurar pelo colete refletor e pelo triângulo fluorescente que precisa de estar a uns metros do carro, isto, depois de ficar a encarar o fumo sair do meu carro durante tempo sem fim.

Mas não tenho tempo de me afastar do carro porque um SUV preto estaciona em frente à minha máquina avariada. 

Olho pelo vidro do meu porta-bagagens e murmuro uma centena de palavrões tão rapidamente que até tenho dificuldade em entender-me. 

Respiro fundo com muita muita força assim que vejo Ethan sair do carro e aproxima-se do desastre em que me encontro.

– O que raios estás aqui a fazer? Andas-me a seguir, por acaso? Como é que sabias que eu estava aqui? – questiono entre dentes enquanto o fuzilo com o olhar, assim que deixo de estar quase toda dentro da minha bagageira. 

– Venho ajudar e ainda és mal agradecida? – ele levanta uma sobrancelha, obviamente a troçar da minha situação desastrosa. 

– Que eu saiba, não te pedi ajuda! – reviro os olhos. – Então posso ser mal agradecida o quanto eu quiser! – retruco. – E ainda não me disseste como é que sabias que eu estava aqui. – procuro pelo triângulo fluorescente outra vez.

– Estava no Chibchas' com os rapazes e as tuas amigas apareceram lá, depois uma delas recebeu um telefonema e disse que tinhas tido um problema no carro. 

Quando ele confessa, eu levanto a cabeça depressa para ver se a sua expressão denuncia verdade mas acabo por bater com a nuca na bagageira e gemer de dor.
O déjà-vu atinge-me, e desta vez nem estou bêbada. 

– E decidiste vir ajudar-me? – questiono enquanto tenho a mão na cabeça e ele me olha com uma sobrancelha levantada. – Não preciso da tua falsa generosidade, já disse uma vez. 

Ele olha para o relógio no seu pulso e encara a estrada vazia à nossa volta. 

O.k., estou necessitada no quisito ajuda e tenho uma pequena nuvem de azar a pairar sobre mim neste momento, mas não estou totalmente sozinha... vez ou outra passa aqui um carro. 

– Precisas que te avise que são quase dez e quinze da noite e estás numa estrada deserta? – pergunta com desprezo. 

– Eu consigo-me desenrascar sozinha, porra! – puxo o triângulo de dentro da bagageira e caminho um pouco para o colocar a uns metros do carro. 

– Nota-se! – ele desdenha.

– Epah, vai-te embora. – resmungo, a querer que ele saia de perto de mim porque está a atrofiar os meus sentidos.

Quando me viro, ele está debruçado sobre a roda da minha máquina adormecida e a remexer em alguma coisa que eu não faço ideia do que seja. 

Não me bastou ter discutido com o Parker e ter ficado com um carro morto, senão ter que levar também com este gost-emplastro a tentar ajudar-me? 

A irritação toma conta de mim mais uma vez e aproximo-me decidida. Puxo o seu ombro para ele me encarar e fito os olhos verdes penetrantes de forma intensa. 

– Podes ir embora que eu sei mudar a porcaria de um pneu! – estreito os olhos e ele aproxima o rosto do meu, fazendo-me inspirar fundo.

– Então muda, que eu quero ver! – ele desafia. 

Duas, três, quatro, cinco vezes merda.
Mudar um pneu? Nunca na vida fiz isso, mas espero que os tutoriais que vi nos filmes sirvam de alguma coisa neste exato momento. 

Puxo a "mola" de dentro do carro, porque não sei realmente o nome daquilo, mas a minha mão vermelha faz-me deixá-lo cair antes que eu o retire completamente da bagageira, e isso deixa o Ethan trabalhar para pegar nele e o colocar no chão com cuidado. 

– Mas que raio? – ele resmunga. – Foste mesmo meter a mão na porcaria do motor a ferver? – ele questiona irritado e em tom alto. 

– Não. – nego, a conter a expressão de dor. 

– Não? – levanta as sobrancelhas. – Olha-me para esses dedos vermelhos, estão piores que uma malagueta! 

– Estou bem. – reviro os olhos e tento pegar na "mola" que está no chão, mas ele impede-me e segura no meu pulso. 

– Deixa de ser casmurra, porra! – encara-me de forma intensa e que me faz estremecer por dentro. 

Por momentos, consigo ver o antigo e protetor Ethan que me dava a sensação de conforto, mas a imagem evapora quando ele se afasta de mim e vai até ao seu carro, deixando-me para trás a olhar para ele ainda perplexa.
Ele vai ficando mais longe das luzes acesas da minha máquina.

Inspiro fundo e revivo o momento em que tínhamos quinze anos e eu caí no alcatrão em frente à minha casa.
Fiquei com o joelho direito em carne viva e cheio de sangue e ele correu para ir buscar o kit de primeiros socorros para fazer um penso como se fosse um profissional. 

Nesse dia os meus pais não estavam em casa porque a minha mãe tinha ido a uma consulta, para mais tarde descobrimos que ela tinha sido diagnosticada, e então o meu melhor amigo cuidou de mim. 

Não brincámos mais nesse dia e ficámos a conversar no meu quintal enquanto escrevíamos com pauzinhos na terra seca. 

Desperto da famosa sensação de déjà-vu assim que ele se aproxima de mim. Ainda estou na mesma posição e vejo uma caixa branca nas suas mãos a ser pousada na minha bagageira ao mesmo tempo em que a abre. 

Relutante, sento-me na ponta do carro quando ele me encara com uma expressão fuziladora. 
Travo o maxilar quando ele segura no meu pulso e estende a minha mão para ele, para ver a vermelhidão com a ajuda da luz da bagageira.

O.k. Os dedos estão realmente piores que uma malagueta e ardem como o caralho quando ele limpa com soro, mas não lhe vou dar esse gosto de vitória ao saber que tem razão. 

– E vieste aqui por que razão? – estreito os olhos para fingir que estou realmente curiosa, até estou um pouco mas o que eu pretendo é disfarçar a dor nos meus dedos. 

– Porque sei a fama desta estrada e seria uma irresponsabilidade que alguém meu conhecido estivesse aqui sozinho a estas horas e eu não viesse ajudar. – ele diz enquanto se concentra. 

– Alguém teu conhecido... – eu murmuro. – Às vezes, és tão engraçado que até me esqueço de rir. – ele revira os olhos. – Não foi isso que passámos a ser, na realidade? 

– Não comeces! – ele avisa. 

– Por quê, vais fazer o mesmo que tens feito e evitar falar da nossa discussão? – digo entre dentes porque sinto que ele limpa a pequena gota de sangue que escorre nos meus dedos. – Não queres aproveitar que estamos aqui e falamos das merdas que me disseste? 

Ele fica em silêncio e respira fundo, assim como eu. 
Ele remexe qualquer coisa na caixa branca e pega no que reconheço ser uma pomada para queimaduras e coloca uma quantidade generosa no dedo da mão que tem uma luva azul.

– Aai, porra!! – eu resmungo de dor e seguro na mão dele com a minha mão livre, para o afastar, e isso faz com que nos entreolhemos rapidamente. – Desculpa. – murmuro.

– Pronto. – diz quando termina e, nesse exato momento, o reboque chega e eu agradeço aos céus por ele ter sido mais rápido do que eu esperava. 

Afasto-me de Ethan no mesmo instante porque a proximidade me está a afetar a forma de raciocinar e aproximo-me do senhor de meia idade que vem até mim.

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Ihhh, temos um herói que veio salvar a dama resmungona.

Vamos ver o que sai daqui...

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