Estava frio. A temperatura era mais baixa do que Naruto gostaria que fosse, mas não se importava tanto, desde que estivesse em seu quarto aquecido. Estava feliz pelo vento frio só estar do lado de fora, não ali, então se sentia protegido.
Em sua posição mais habitual, sentado no chão e encostado na cama, ele jogava um jogo qualquer, o qual já havia finalizado muitas vezes. Era um bom sábado no meio do outono e as provas já haviam passado. Todo o sufoco de estudo de última hora e cansaço acumulado estava sendo bem recompensado com longas tardes tranquilas, em que nada de novo acontecia. Era a paz do outono pós-provas.
Na cama de Naruto, estava Sasuke. Após as provas, quando pôde parar de pensar um pouco em todas as matérias, o garoto ia ali frequentemente. Sua figura encostada na parede do quarto, apoiado por um travesseiro e segurando um livro com uma expressão sonolenta, já havia se tornado parte da paisagem. Inevitavelmente Sasuke começava a ficar viciado em não ficar sozinho em sua casa e, paralelamente, Naruto se viciava em ficar em silêncio com o outro garoto em seu quarto. No fim, o silêncio nunca era absoluto quando estavam juntos.
— O que você acha do que aconteceu com o Wander no fim de Shadow of the Colossus? — perguntou Sasuke, de repente. Naruto olhou por cima do ombro, notando que o amigo não estava mais com os olhos no livro que antes lia. Eles já haviam zerado aquele jogo duas vezes, mas o garoto de cabelos negros continuava pensando sobre ele, ainda preso. Recusava-se a jogar outra coisa, ainda ligado à obsessão pelo jogo.
— Eu acho que ele mereceu aquele final. Seria difícil imaginar um final feliz para esse jogo… — Naruto nunca tinha pensado muito sobre isso, na verdade.
— É difícil determinar se ele mereceu ou não, mas uma certeza que eu tenho é que ele sabia que não eram coisas boas que o aguardavam. Se nós sabíamos, ele sabia — murmurou Sasuke. — A cada gigante morto, o Wander desmaiava e sua aparência mudava. Ele sabia que era errado, mas continuou. Nós julgamos se as ações que fazíamos como ele eram corretas, mas eu acho que ele também se julgava. Sofria por isso, mas não podia deixar que alguém que ele amava morresse… — A voz do garoto sumiu pouco a pouco na última frase, desvanecendo. Naruto deixou que o silêncio se prolongasse, porque provavelmente o amigo estava pensando sobre o que havia dito.
As pernas de Sasuke pendiam na lateral da cama, ao lado do rosto de Naruto. O garoto de cabelos negros usava bermuda, apesar do frio do lado de fora da casa e, enquanto se perdia no vortex de pensamento, o loiro voltava a pensar que suas canelas eram finas e elegantes. Estavam próximas o bastante para fosse possível sentir o brando calor emanando da pele.
O jogo estava pausado e Sasuke em sua auto hipnose de pensamentos. Naruto também estava em seu próprio transe curioso, lembrando-se de quando eram crianças e dormiram na mesma cama estreita, cada um para um lado. Naquela época, eles eram tão pequenos que os pés de Sasuke ficavam na altura da cintura de Naruto, com eles em casa uma das extremidades da cama.
No segundo seguinte a esses pensamentos, beijou suavemente a perna de Sasuke que estava mais próxima ao seu rosto. Foi rápido, tão rápido que Naruto não teve tempo de pensar no que deveria fazer depois, se deveria sorrir e fazer alguma brincadeira. Sua mente estava tão imersa em memórias que ele simplesmente permaneceu sério e olhou para o amigo de infância sentado na cama. Sasuke fatalmente também não sorria, porque havia sido tirado muito rapidamente de seu devaneio, então também não processou.
Não tiveram tempo de fazer alguma brincadeira depreciativa antes de o clima denso se instaurar. E aquela foi a primeira vez que isso aconteceu, de um tenso e confuso misto de intensidades vagar entre eles. Assim, de forma corriqueira e simples, talvez lenta, como as árvores perdendo suas folhas para o inverno.
Naruto voltou-se rapidamente para o seu jogo, sem dizer nada. Porém, a cada segundo a mais de silêncio, seu rosto adquiria um tom cada vez mais avermelhado. O silêncio sem fim, o ar tão pesado que tornava difícil a simples tarefa de respirar. Deveria ter rido, feito alguma piada sobre as pernas de Sasuke serem finas, mas fez aquilo consigo mesmo, entrando naquele espiral infinito…

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A Cidade no Quintal
Fanfiction[CONCLUÍDA] Sasuke sempre ia para o quintal de Naruto pela tábua solta na cerca, escondido. Ali, ele sempre sentiu que podia ser criança de verdade, longe do mundo cinza, próximo a toda cor e som que emanava do garoto de cabelos loiros. Eles sempre...