Sacos de lixo e bolas de baseball

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— Não tem nada nessa cidade tediosa — resmungou Temari.

— Ah, têm algumas coisas legais se você procurar bem — argumentou Ino, com um ar pensativo. — Mas com certeza ver o Gaara peneirando areia não é uma delas.

As duas garotas estavam sentadas na margem do rio Kagayaku, sobre pedaços de saco plástico preto, para não molharem as roupas com a grama úmida, mas de aspecto quebradiço. O céu estava cinzento e claro, o que indicava que não havia perigo de nenhuma nevasca naquele momento.

Mais próximo do rio, onde os sedimentos se acumulavam trazidos de lugares mais altos, o garoto de cabelos ruivos pegava punhados de areia e usava uma peneira para separar os grãos mais finos dentro de um saco. Isso já era algo peculiar por si só, mas somado com a maquiagem escura ao redor dos olhos, a ausência de sobrancelhas e as roupas escuras de estilo punk, fazia com que qualquer um que passasse na ponte olhasse para baixo com estranheza. Gaara, por sua vez, apenas continuava seu trabalho calmamente, sem se importar com os transeuntes.

— Por que ele decidiu que precisava de areia no meio das férias? — perguntou Ino, indicando o ruivo com a cabeça. — E, a pergunta que não quer calar, porque você me chamou para isso?

— Bom, sobre a primeira pergunta: Logo a neve vai se acumular e ele não iria conseguir mais pegar areia na margem do rio. As salas dos clubes ficam inacessíveis nas férias de inverno e toda a areia que o Gaara usa para fazer suas imagens está lá, então iria ter uma abstinência artística — explicou Temari, dando de ombros como se aquilo fosse a coisa mais normal de se dizer. — Acredite, esse garoto sem nenhum material para extravasar as emoções vira um demônio com desânimo.

Ino não pôde deixar de rir, fazendo com que Gaara olhasse para trás de soslaio, mas depois voltasse sua atenção para a areia. Temari também não conseguiu deixar de sorrir de canto. Ambas sabiam como a maioria daquele clube era excêntrica, mas nunca tinham conversado sobre isso em um tom de humor.

— E eu te chamei para vir porque a Hinata ia sair com aquele garoto amigo de vocês, e o Kangaroo viajou para algum país tropical com a família. O Gaara não gosta de conversar enquanto peneira a areia dele, porque trata como um ritual sagrado e me preocupo de ele tropeçar e ser levado pelo rio se eu não vier junto. Inclusive, acho que ele se irritou de você ter rido alto enquanto ele peneira a areia — Temari falava tudo com tanta impassibilidade, que Ino teve que rir novamente das descrições curiosas sobre o amigo punk. O riso fez Gaara olhar por cima do ombro mais uma vez e a garota de cabelos compridos ergueu as mãos, como em um pedido de desculpas.

— Você tem amigos estranhos — comentou Ino, vendo o garoto erguer as barras da calça para não molhá-las no rio. — Mas acho curioso que, você, a popular dos não populares, tenha me chamado como a terceira opção para acompanhá-la nessa aventura emocionante.

— Também acho — foi a vez de Temari dar um sorrisinho de canto, abraçando os próprios joelhos contra o peito. — Mas você seria a primeira opção mesmo que os outros dois não estivessem ocupados, porque eu queria te ver.

Ino a observou, surpresa. A garota olhava para frente, na direção do rio, como se não tivesse dito nada demais, mantendo sua postura de durona, mas suas maçãs do rosto coradas entregavam um pouco o jogo. Ela pressionava o lábio inferior contra as costas da mão, em um ato de nervosismo, enquanto puxava a manga da blusa de frio de mangas listradas com a outra mão. Como sempre, o delineado em seus olhos estava perfeito e as sobrancelhas um pouco bagunçadas, para combinar com os cabelos. Ino nunca tinha pensado sobre Temari ser bonita, mas, agindo daquela forma, ela conseguia ficar bonita em um contraste do selvagem das calças jeans rasgadas e do adorável do rosto corado.

— Eu gosto de como você parece mais sincera agora — respondeu Ino, que notou o olhar dela sobre si.

Nos dias que haviam se passado do baile, no qual elas dançaram juntas, o pensamento de Ino constantemente voltava para ela. Lembrava-se da textura da mão dela contra a sua, macia, mas com calos nas pontas dos polegares por tocar instrumentos de corda. Também gostava de fechar seus olhos à noite e pensar no rosto dela, em como tinha ficado radiante quando elas dançaram juntas e seus olhos de um azul escuro profundo e raro, brilhando. Apesar de ter sonhos românticos, Ino nunca tinha pensado sobre alguém mais do que pensava nos seus ídolos inalcançáveis. Porém, o sorriso sarcástico da garota e a intuição de Ino, dizendo que Temari gostava dela, não saíam de sua mente.

A Cidade no QuintalOnde histórias criam vida. Descubra agora