Os tons do outono

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Seus olhos ainda ardiam quando ela chegou na saída do fliperama. Ainda não acreditava que realmente havia dito aquilo a Kiba, mas não podia voltar e dizer o contrário. Seria uma mentira se o fizesse.

Hinata suspirou e, parada na porta, escondeu o rosto molhado entre as mãos. Não queria voltar para casa e ficar sozinha com seu turbilhão de pensamentos. Sabia que não havia muito o que fazer, não tinha outros amigos para recorrer, mas se enterrar nos pensamentos seria doloroso demais.

— Ei, garota — De repente, ouviu um chamado, mas apenas levantou o rosto, procurando saber se era com ela e quem chamava. — É, você mesma.

Encostada na parede ao lado da entrada do fliperama, havia uma mulher loira com um cigarro em mãos. Suas sobrancelhas erguidas demonstravam a curiosidade que sentia em relação à menina que chorava. Aquela mulher já havia visto muita coisa em sua vida, mas lágrimas sempre a deixavam curiosa. Era o transbordar dos sentimentos, a porta de saída do caos que as pessoas traziam no peito.

— Venha aqui — chamou, sem reservas. Apesar de atordoada, encarando fixamente os olhos castanhos da mulher, Hinata se aproximou. De alguma forma ela conseguiu notar a bondade daqueles olhos. Quando estava perto o suficiente, a garota percebeu que ela usava um uniforme com a logo do fliperama: um polvo gigante jogando Pacman.

— Você é a Lendária Aproveitadora? — perguntou a menina, ingenuamente.

— Então você conhece esse apelido horrendo? Me chame de Tsunade, por gentileza. Já basta os moleques me chamarem por esse apelido — resmungou Tsunade, apagando a guimba de cigarro na parede do fliperama e jogando-a em uma lixeira próxima.

— Eu sinto muito por ter dito isso, senhora… Tsunade! — desculpou-se, sentindo o rosto queimar. Ela devia ter notado que aquele apelido não era dos melhores.

— Fica tranquila, garota. Eu não estou irritada — disse, apesar de seu tom de voz anteriormente ter sido de repreensão. Ela analisou Hinata com os olhos, antes de franzir o cenho. — Agora, me conte, o que aconteceu com você? Não é comum ver pessoas chorarem ao saírem de um fliperama.

— Eu estou bem… — começou.

— Sem desculpas. Aproveite que eu nem te conheço e coloque tudo pra fora, fale uns palavrões, xingue umas pessoas. Faz bem — Tsunade riu de sua própria fala e Hinata precisou dar um sorrisinho, surpresa com a espontaneidade da dona do fliperama. — Anda. Vá em frente.

— Eu só… — hesitou, olhando para dentro do fliperama e de volta para Tsunade, que aguardava com as sobrancelhas erguidas. Então, segurou o pingente do colar. — Eu só queria ter amigos por quem eu sou e não por quem eu acho que deveria ser. Não quero obrigá-los a estarem comigo também.

— Então está preocupada com o que os outros estão pensando de você. É isso? — interpretou ela. Hinata pensou por um momento e depois assentiu. Poderia ser por aquele motivo, mas, mais do que tudo, sentia-se solitária mesmo estando rodeada de pessoas. — Vem, vou te dar um refrigerante, suco, ou seja lá o que você quiser.

— Senhora… Tsunade, realmente não precisa.

— Tem algo melhor para fazer? — Ela ergueu as sobrancelhas e Hinata negou com a cabeça. — Foi o que pensei. Siga-me.

Apesar de receosa por conversar com alguém que nunca tinha visto antes, a menina, antes sem rumo, estava aliviada por aquilo. Enquanto seguia a "Lendária Aproveitadora" pelo fliperama que a pertencia, várias pessoas cumprimentaram a mulher, que dava alguns sermões ou falava de forma absolutamente espontânea. Como os integrantes da Gangue, Tsunade era uma daquelas pessoas que brilhavam, flamejantes.

Por entre as máquinas de jogos, luzes e pessoas, Hinata não avistou nenhum dos seus supostos amigos. Silenciosamente seguiu a mulher até a parte de trás da loja, onde havia um aposento em que a garota jamais havia estado antes: uma poltrona marrom de couro estava encostada em um dos cantos da pequena sala, ao lado de uma mesinha redonda. Em uma das paredes, próxima à poltrona, um quadro repleto de recordes de jornais presos com alfinetes revelava a história decenária do fliperama. Além disso, uma cadeira vermelha de camurça ficava do outro lado da mesinha e um porquinho cor-de-rosa dormia sobre ela.

A Cidade no QuintalOnde histórias criam vida. Descubra agora