Linda

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Linda!

Foi a primeira coisa que eu consegui dizer a mim mesma quando reencontrei a Camila.

Mas antes de contar a vocês a minha história, quero me apresentar de forma devida. Me chamo Laura, tenho pele bronzeada, cabelos naturalmente enrolados, olhos negros. Me considero magra, mas tenho um belo corpo (e não me acho convencida por dizer isso... Sou realista, apenas).

Nasci na Espanha, minha família é toda de lá e mora em Madri, mas eu com 16 anos decidi vir para Los Angeles seguir meu sonho e tentar uma carreira como atriz.

Em 2007, fiz um teste para um seriado e passei. A série se tratava de histórias de adolescentes no colegial, que faziam parte de um coral sempre chamado de ''o grupinho de perdedores''.

Minha personagem, uma líder de torcida que começa como vilã, apesar do seu humor ácido ela foi querida pelo público. Ela era meio revoltada com tudo e todos e ninguém sabia ao certo o porquê de tanta amargura, até que ela se aceitou como gay, e conseguiu namorar seu grande amor. Uma de suas melhores amigas. Fomos um dos casais mais shippados (shippados = com mais fãs, com mais pessoas torcendo por um final feliz). Mas no fim da minha participação na série, três anos depois do começo do programa, o casal não teve um final feliz, houve traição devido a distância já que a minha personagem passou de ano e foi morar em outra cidade para fazer faculdade, e a namorada dela repetiu de ano. Foi um final bem triste pra um casal tão querido.

Aproveitei esse tempo e resolvi voltar para Madri, fazer um curso superior na minha área, é claro! Fiz a faculdade chamada La Artes (La artes é praticamente a Harvard, só que na área do teatro). E fiquei morando em Madri por quase três anos. Voltando para Los Angeles, muita coisa tinha mudado, eu teria que reconquistar meu lugar ao sol no mercado. Mas, por um lado teve outras coisas que não mudaram: a minha família da série.

Todos continuavam bem unidos apesar da agenda louca de trabalho.
Kevin, um dos atores e um dos meus melhores amigos, resolveu fazer uma festa de boas-vindas na casa dele para mim.

Estava todo mundo do elenco. Quer dizer, faltava a Camila, mas ela estava gravando e iria chegar só mais tarde. A festa corria super animada, risadas, fotos, até que eu simplesmente fiquei sem ar. Camila tinha acabado de entrar por aquela porta cumprimentando todo mundo, e eu fiquei com uma cara de boba a-olhando.

Camila estava tão linda, e quando me viu veio correndo me abraçar.

Não sabia se ainda estava com aquela cara de boba, mas não conseguia dizer muita coisa olhando para ela. No decorrer da festa, fui me recuperando do impacto de vê-la, mas mesmo assim não parava de me questionar o porquê da minha reação. Eu não tinha bebido, eu estava sã.

Deitada no meu quarto, fiquei pensando na festa, em como foi bom rever meus amigos, e como foi diferente quando vi Camila (Vou contar "resumidamente" o que eu sei sobre ela).

Ela é brasileira, natural do estado de Minas Gerais. Em 2007 fez o teste e saiu da sua cidade para morar em Los Angeles. Tanto ela, quanto eu, éramos papeis secundários na série, mas com o tempo ganhamos o nosso destaque.

Camila sempre foi o tipo de pessoa muito transparente, e desde o começo se assumiu gay. Na verdade, ela divulgou isso pro mundo. Eu me lembro como se fosse hoje, a resposta que ela deu na coletiva quando a perguntaram sobre ela estar interpretando uma líder de torcida bissexual que provavelmente teria um namoro com outra mulher na série... Se ela via dificuldade nessa nova fase da personagem... A resposta que ela deu foi muito honesta.

"Quem a minha personagem beija ou se apaixona não é um empecilho para mim. Eu sou uma atriz e a mesma dificuldade que eu possa vir a ter em beijar uma mulher eu posso ter ao beijar um homem. Mas se você fez a pergunta, no sentido de preconceito... Eu não tenho! Eu sou uma mulher lésbica. Farei qualquer cena com o maior profissionalismo, sempre. E será bom para os jovens ver que eles não são os únicos, que eles não são a minoria e espero que com histórias como essas de amor tanto eu, quanto a Laura possamos informar, entreter e principalmente ajudar meninos e meninas a se aceitarem e se amarem como são, ter uma conversa saudável com sua família, já que a série atinge todo tipo de público."

Camila sempre foi muito discreta, na verdade até eu que sou amiga dela, nunca a vi ficando com ninguém. E quando a perguntava, ela dizia que eu não via, porque não tinha. Ela sempre tentou se manter fora das revistas de fofocas e na maior parte do tempo ela conseguia.

Até que veio à tona um drama pessoal que nem mesmo nós amigos próximos sabíamos. Um ''amigo'' brasileiro dela, contou a uma revista sobre uma menina chamada Karla. Karla foi o primeiro amor de Camila, só que Camila parecia não acreditar que uma pessoa pudesse vir a gostar dela. As duas ficaram e depois Karla sofreu um acidente e morreu.

Eu estava no camarim com Camila quando ela viu sobre a notícia, aqueles olhos claros ficaram vermelhos em questão de segundos. Ela ficou muito nervosa, porque essa história a machucava muito, e tornar isso público a nível mundial era como deixar a ferida dela aberta e exposta.
Nós, do elenco, demos a maior força para ela, enxugamos as suas lágrimas.
E ela mais uma vez surpreendeu o mundo com um texto lindo sobre o assunto:

"Sim, e tudo isso que vocês ficaram sabendo através desta pessoa que diz ser meu amigo (e não é), é verdade. Gostaria de pedir respeito a minha dor, mesmo tendo passado seis anos, ainda dói. Gostaria de pedir a imprensa que evitem me perguntar sobre, até porque, não irei me pronunciar sobre isso mais uma vez. Karla foi uma pessoa maravilhosa, que se tornou um anjinho e que me ensinou grandes coisas tanto em vida, quanto depois da morte. E sempre terá um lugar no meu coração. Peço respeito e privacidade para família dela, a qual eu tenho o profundo carinho e respeito. Conto com a compreensão de todos.''

Ela era assim. Sempre incrível, transparente e educada.

Mas... Era impossível de acreditar que alguém como ela, não tivesse uma namorada. Camila... Uma bela loira, olhos verdes claros, boca carnuda e, como toda boa brasileira, cheia de curvas.
As mulheres ficavam loucas por ela, e ela sempre na dela.

Ela é uma romântica incurável, nos debatíamos muito sobre isso, porque segundo ela, eu não era romântica com os meus namorados.

Ela vivia me dizendo que um dia eu iria me apaixonar, apaixonar de verdade, a ponto de querer casar e de viver feliz para sempre com alguém. Não é que eu fosse seca com os homens com quem me relacionei, eu só não me sentia afim de dizer coisas melosas como "Eu te amo", ou chamar alguém de "meu amor".

Na minha festa de boas-vindas, eu e Camila conversamos pouco, mas ficou combinado que eu iria almoçar com ela no domingo de manhã.

E até lá, além de arrumar minhas coisas no novo apartamento, eu sigo pensando nela.

No domingo de manhã, cheguei no apartamento dela, achei curioso, ela mora ainda no mesmo lugar de sempre.

– Bem-vinda! – Ela me recebeu toda entusiasmada.

ElaOnde histórias criam vida. Descubra agora