O fim foi viagem

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A tempestade pareceu vir de lugar nenhum. Caiu em cima de Chaeyoung e Jimin no momento em que estavam mais vulneráveis, depois de sair do porto, em mar aberto.

Não lhes deu chance.

O céu mudou de cor tão depressa que foi como se alguém tivesse arrancado um pedaço de papel de parede azul, revelando um enorme buraco negro. O calor do sol desapareceu num instante e a chuva caiu em pesados projéteis de água que queimavam e congelavam os dois ao mesmo tempo.

A água sacudia embaixo deles, como um cavalo chucro tentando derrubar o cavaleiro. O barco se agarrava às ondas, e Chaeyoung e Jimin se agarravam ao barco, com as amarras de segurança oferecendo pouca tranquilidade.

De que adiantava estar amarrado a um barco quando a qualquer momento o mar poderia parti-lo ao meio ou esmagá-lo em seu punho áspero e salgado?

— Não deveríamos ter feito isso — gritou Jimin. — Foi uma idéia idiota.

— Não — gritou Chae de volta, acima do rugido da água. — Que opção nós tínhamos?

— Vamos morrer!

— Ainda não morremos!

Aquilo que rolava nas bochechas de Jimin eram lágrimas ou a água salgada ardendo nos olhos? Chaeyoung descobriu que era impossível saber. Pensou no pai. O que ele teria feito?

— Vou contar a história dos Vampiros piratas — falou corajosamente. — História antiga e verídica.

Jimin agarrou aquela migalha de consolo e se juntou a ela. Os dois ainda estavam cantando quando o barco girou e a amurada se partiu ao meio. Os gêmeos foram separados e jogados para baixo, na água gélida e revolta.

Cheio de uma estranha calma, Jimin ficou olhando pedaços do barco afundarem passando por ele, descendo na água mais escura embaixo.

Um estranho catálogo de copos, talheres e livros passou em redemoinho. Estendeu a mão para eles e os viu ir dançando para longe. Sorriu. Abaixo da superfície havia uma calma, um porto seguro da tempestade que rugia em cima.

Era tentador ficar ali e afundar com os outros pedaços partidos de seu mundo. Poderia ser um bom modo de morrer. Não, precisava encontrar Chaeyoung! Livrou-se do transe e com cada fibra do corpo abriu caminho subindo pela água.

Era difícil e doloroso, e era necessário todo o esforço para não se soltar, não se abrir à água e afundar de volta na escuridão. Mas Jimin era forte e agora usara toda a força para lutar contra a chuva de destroços vindo para ele enquanto se aproximava dos restos do barco.

Rompeu a superfície, com as ondas o açoitando o tempo todo. Engolindo a água salgada e com ânsias de vômito, olhou desesperado ao redor em busca de algo que boiasse para se agarrar. E procurando a irmã.

A salvação de Jimin acabou sendo um pedaço de banco. Agarrou com força a borda serrilhada, subindo em cima da tábua como se fosse uma prancha de surfe.

Foi um esforço enorme e suas mãos estavam sangrando. A água salgada fazia aumentar a dor. Mas Jimin encheu os pulmões de ar e percebeu que havia conseguido. Estava vivo. Mas onde estava Chaeyoung?

A tempestade continuava furiosa, mas agora um pouco mais branda. Jimin examinou a água borbulhante, procurando o rosto da irmã em meio aos destroços. Ela não estava ali.

Aprendendo a controlar a prancha improvisada, seguiu pela água, em busca de qualquer sinal dela. Não encontrou.
O mar se acalmou um pouco, mas era cada vez mais difícil enxergar um metro adiante.

Jimin percebeu que uma névoa estava chegando. Ficou mais densa, envolvendo-o numa nuvem pessoal. Não! Agora jamais iria encontrá-la. Balançou as mãos ao redor, tentando empurrar a névoa para longe, mas isso só serviu para desequilibrá-lo.

Baixou as mãos para a tábua e, derrotado, deixou a cabeça pousar na superfície dela. De que adiantava? Se Chae tinha morrido, não havia mais nada para ele. Podia muito bem escorregar da tábua e mergulhar de novo. Pelo menos os dois estariam juntos.

Jimin perdeu a noção de quanto tempo havia ficado à deriva. Pareceu uma eternidade, mas podiam ter sido apenas alguns segundos, estendidos até ficarem impossíveis de reconhecer em meio ao desespero e à fadiga.

Agora a névoa estava diminuindo. Através dela pôde ver a sombra de um navio. Era fraca, mas não podia deixar de identificar a silhueta. Parecia um velho galeão. Só tinha visto essas coisas em livros e num protótipo no Museu Marítimo. Devia estar imaginando — alucinando, enquanto a morte se aproximava.

Mas não. Era um navio. Enquanto a névoa começava a se dissipar, pôde vê-lo com clareza — girando na água. Por que estaria mudando de direção no meio do oceano? A não ser que fosse parar por algum motivo. Teria vindo resgatá-lo?

— Aqui! Aqui!

O navio continuou a girar. Mas não estava vindo para ele. Não podia ver ninguém a bordo. Ninguém o tinha visto. A névoa havia chegado ao nível do convés. Quando o navio completou o giro, uma luz dourada e suave caiu sobre a figura de proa — uma jovem. Se ao menos fosse uma mulher de verdade em vez de uma escultura pintada!

Seus olhos penetrantes pareciam observá-lo, mas, claro, não passavam de tinta em madeira. Jimin não sabia o que fazer à medida que o navio começava a se afastar.

Enquanto ele ia para longe, o garoto percebeu velas muito diferentes de quaisquer outras que já vira. Pareciam asas, brilhando com finos veios de luz.

— Ei! — gritou de novo. — Socorro!

Mas sua voz estava débil e o navio já ia muito longe. Só conseguia vislumbrar as silhuetas das estranhas velas, esgarçadas. Pareciam balançar suavemente enquanto o navio prosseguia.

Era como se, em vez de navegar no oceano agitado, o navio estivesse apenas roçando a superfície, sem se deixar afetar pelas fortes correntes. Sua mente o devia estar o enganando. Não fazia sentido. Seu corpo estava insensível e pesado, e agora parecia que a mente também perdia a luta. Chaeyoung havia morrido.

O navio que poderia tê-lo resgatado estava indo embora. A única opção era desistir e se juntar à irmã em sua sepultura de água. O devaneio foi rompido por uma voz ao lado.

— Aqui, agarre meu braço. Agora você está em segurança.

Siblings Park - Demônios do OceanoOnde histórias criam vida. Descubra agora