O lento desfile

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— Bem — disse Hyun, olhando intensamente para Chaeyoung. — O que você é? Vampira ou doadora?

Ainda sem fala, Chaeyoung o olhou. Era como encarar uma parede de músculos. O pescoço era grosso como o tronco de uma árvore bem crescida. Os braços eram muito mais grossos do que as pernas dela.

— Fantástico — disse ele com ar superior —, exatamente o que precisávamos, outra idiota.

Chaeyoung ficou furiosa, mas continuou sem dizer nada. A última coisa que queria era deixá-lo com raiva.

— Hyun! Ei, Hyun! — disse uma voz atrás de Chaeyoung.

Hyun olhou por cima da cabeça de Chaeyoung. Ao fazer isso, abriu a boca e começou preguiçosamente a palitar alguma coisa entre os dentes.

Olhando para cima, Chaeyoung viu que ele possuía dois caninos enormes, aparentemente feitos de ouro. Poderiam cravar-se numa pessoa como faca entrando em manteiga, pensou. Isso fez seu sangue gelar.

— Estive procurando você em toda parte, tenente — disse Lisa, passando rapidamente por Chaeyoung, como se não a tivesse visto. — Preciso falar com você com urgência, ordens do capitão.

— Claro — respondeu Hyun, aparentemente sem pressa. Em seguida virou a cabeça na direção de Chaeyoung. — Viu a recém-chegada à tripulação?

Lisa se virou.

— Ah, sim. Chaeyoung — disse em tom displicente. — Desculpe, não vi você.

— Você a conhece?

— Sim, sim — respondeu Lisa, que parecia ter algo muito mais importante a discutir. — Fui eu que a pesquei na água.

Hyun pareceu ter perdido o interesse.

— Ah, Lisa, é bom ver você — começou

Chaeyoung, bastante aliviada ao encontrar o amigo.

— Para você ela é a aspirante Manoban — disse Hyun.

Lisa não tentou defendê-la. Em vez disso, examinou Chaeyoung com os mesmos olhos frios de Hyun, então lhe deu as costas.

Chaeyoung sentiu como se tivesse levado um soco. Por que Lisa estava agindo assim? Havia pensado que ela era sua amiga. Ela tinha sido tão gentil antes!

— Preciso mesmo falar com você, Hyun — continuou Lisa. — A sós.

Ela estendeu a mão para os antebraços ondulados de Hyun e puxou-o para longe das duas.

Chaeyoung sentiu-se absolutamente arrasada por ter sido ignorada daquele jeito, mas quando os dois haviam se afastado um pouco Lisa se virou de novo para ela, os olhos azuis cheios de preocupação.

Em seguida apontou com o dedo. Chaeyoung percebeu que Lisa a estava mandando ir para a cabine. Bem, talvez ela fosse para a cabine, talvez não. Talvez fosse hora de Chaeyoung pagar para ver.

A srta. Kim cutucou-a.

— Ela só estava bancando a durona para impressionar o tenente Hyun. Típico dela!

Chaeyoung deu um sorriso débil, um pouco aliviada com o pensamento.

— Acho que você está meio caidinha pela aspirante Manoban — disse a srta. Kim.
— E quem pode culpá-la? Ela, sem dúvida, é linda. Aquele cabelo. Aqueles olhos.

Chaeyoung sentiu-se ruborizar enquanto a srta. Kim continuava:

— Claro, ela não serve para mim. Estou me guardando para o sr. Jetsam, meu único amor verdadeiro.

Ela suspirou ao pensar.

— Bem, preciso terminar de acender os lampiões. Não posso ficar aqui parada com gente como você a noite inteira. — Ela sorriu. — Mas vejo você mais tarde, Chaeyoung. E vou lhe emprestar um belo vestido, também. Você vai querer estar linda para o Festim.

Com uma piscada, ela continuou em seu caminho, segurando o círio.

O Festim? Chaeyoung lembrou-se de que haviam falado em um festim quando chegou ao navio. Mas o que, exatamente, era o Festim? Seria esta noite? Por isso a cozinheira e o menino estavam tão frenéticos? Woodz lhe dissera que aquela quantidade de comida não era para os vampiros. Claro que não. Era para os doadores.

De modo que talvez o Festim fosse simplesmente uma grande festa para os doadores. E, como a cozinheira, a srta. Kim havia simplesmente presumido que ela era uma doadora.

Quanto mais pensava nisso, mais percebia que devia ser uma doadora. Certamente, não era vampira e, segundo Hyun, só era possível ser uma coisa ou outra. Ainda não havia entendido a essência do que os doadores faziam. A resposta mais óbvia era que davam o sangue aos vampiros.

E no entanto o capitão tinha dito que não queria seu sangue. Sua mente girava sem parar. Precisava falar com Lisa. Tinha descoberto muita coisa desde que o havia interrogado pela última vez sobre o navio.

Mas agora tinha algumas perguntas específicas que precisavam de resposta.
Ela havia sinalizado para ela voltar à cabine, e isso parecia boa idéia. Lá as duas poderiam conversar em particular, sem distrações.

Foi pelo convés, tendo o cuidado de permanecer nas sombras e não atrair mais atenção. Um grupo de vampiros estava se reunindo no convés, mas pareciam entretidos demais em suas próprias conversas para notá-la.

Eram fascinantes de observar — uma verdadeira mixórdia de pessoas, nem um pouco como as imagens de vampiros com as quais Chaeyoung havia se acostumado.

Existiam alguns, como Kim Jisoo, que claramente haviam mantido a moda da época em que tinham “atravessado”. Outros, como Hyun, usavam uma mistura de vestuário, o que tornava mais difícil situá-los no tempo ou no espaço.

Muitos, como Lisa, pareciam ter adotado as roupas usuais de pirata ou marinheiro. E outros, ainda, não se pareciam com nada que Chaeyoung já vira — inimaginavelmente glamourosos e fantasmagóricos.

Enquanto Chaeyoung observava o estranho grupo se arrastar sem pressa, pensou em como a idade aparente deles dava pouca indicação do como eram realmente velhos.

Como será que mediam a idade?, imaginou. Seria a partir do nascimento verdadeiro? Ou de quando haviam “atravessado”? Se fossem tão intrigantes quanto a srta. Kim, Chaeyoung estava ansiosa por ouvi-los.

Talvez esse pudesse ser seu papel a bordo, pensou — lembrando-se dos lápis e dos cadernos na cabine. Poderia ser a historiadora do navio. Isso iria mantê-la ocupada — mais do que ocupada — até encontrar Jimin outra vez.

Precisava manter-se concentrada nisso e não deixar que a estranheza do navio a distraísse o tempo todo. Precisava falar com o capitão de novo e convencê-lo a ajudá-la — a parar cada embarcação de passagem, se fosse necessário.

Mesmo estando perto da cabine agora, parou nas sombras, ainda não se sentindo pronta para deixar a sua primeira impressão dos tripulantes do navio.

De sua segurança nas sombras, Chaeyoung observava e ouvia enquanto eles passavam.
Boa parte das palavras parecia ser apenas amenidades — o tipo de bate-papo social que era comum no porto, mas aqui parecia um pouco mais formal.

— Boa-noite, senhora. Espero que tenha desfrutado um sono pacífico.

— De fato. E o senhor? Bom. Claro, sempre me sinto um pouco mais cansada nessa época da semana.

— Sim, sei como é. Eu mesmo mal consegui me levantar da cama esta noite, mas depois me lembrei de que era a noite do Festim.

— Isso, isso. Quando soar o Toque do Amanhecer, todos estaremos renascidos.

— Sim, de fato. Que tragam os doadores, é o que eu digo, e que isso não demore!

Esta última menção aos doadores bastou para impelir Chaeyoung, finalmente, em direção à cabine. Quando abriu a porta, Lisa já a esperava, com um livro na mão.
Será que Lisa a esperava fazia muito tempo? Quando fechou a porta, ele ergueu os olhos e fechou o livro.

— Fale do Festim — disse ela.

Sem surpresa, a aspirante assentiu e indicou que ela deveria puxar uma cadeira.

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