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ANGELIC...

Marcos mantém a porta traseira do Rolls Royce aberta para que eu entre. Esta é a primeira vez em dois dias que eu apareço em público e, mesmo assim, tendo um lenço cobrindo o rosto. Saio da igreja e caminho em passos largos até o carro. Assim que entro, Peter, o motorista, acelera.

Embora eu esteja indo para casa, meus pensamentos continuam naquele confessionário. Eu deixei a culpa lá, mas trouxe outro sentimento comigo. Curiosidade. Aquele não era o Padre Bee, ou qualquer outro que more na diocese. Eu conheço todos eles.

Encosto a cabeça no vidro da janela e fecho os olhos. Eu preciso cumprir minha penitência, então tudo ficará bem. Estava me sentindo culpada porque, diante de tudo que aconteceu naquela noite, a única coisa permanente na minha cabeça era Bruce.

Puxo o rosário de dentro do vestido e o seguro. Talvez, se usá-lo com certa frequência, eu possa me libertar do pecado instalado em mim há dois dias.

Chegamos em casa em pouco tempo. A igreja é realmente perto. Peter estaciona abaixo da marquise, Marcos abre minha porta e eu desço, caminhando em direção à cozinha assim que entro. Olhando ao redor, tenho certeza de que meu pai e Margot não estão em casa. Há muito silêncio.

Elliot Donneli nunca volta atrás em suas palavras. Quando ele diz que fará algo, ele, de fato, faz. Eu o admiro por isso, talvez esta seja a razão por trás de todo seu sucesso. Mas, as vezes, sua dureza respinga em mim da pior forma possível. Sua presidência, por exemplo, é o motivo pelo qual eu não consigo ir ao shopping como uma pessoa normal.

Mas a pior parte disso é ter que fingir, dia após dia, que eu sou perfeita. Minha mente pesa quando eu erro. O medo de ser descoberta me consome. No entanto, após me confessar, este peso dilui, embora a confissão de hoje tenha sido um tanto quanto bizarra.

Claro, eu não fui totalmente sincera.

Antes de chegar a cozinha, sinto o maravilhoso cheiro da comida de Genevieve. Minha boca saliva. Entro na cozinha com o maior dos sorrisos no rosto.

- Bom dia.

- Bom dia – ela responde. Genevieve está atrás da bancada, retirando uma travessa do forno.

Eu me sento em uma das banquetas, de frente para ela. Na bancada, há um livro sobre economia de empresas. Meu pai estava o lendo, pois é o livro favorito do senador Mares, pai de Vicenzo Mares.

- Menina – Genevieve deixa a travessa sobre a bancada e me encara – Eu sinto muito.

Eu sei que ela está falando sobre o atentado. Não tivemos a chance de conversar antes. Apesar de adorar a companhia de Genevieve, meu pai não é do tipo que aprecia o contato entre sua família e empregados.

- Está tudo bem.

Meu pai sabia todos os riscos que corria, a segurança foi falha. Mas, no fim, ninguém ficou ferido e todos os responsáveis foram presos. Além disso, a polícia está trabalhando incansavelmente no caso.

- A notícia está em todas as redes sociais – ela comenta.

Eu sequer me lembro da última vez em que abri uma rede social. Desde que decidi sumir da vista do mundo, não tenho notícias dele.

- Eu imagino que sim.

- O senador se pronunciou.

Me contenho para não revirar os olhos. É claro que sim. Meu pai e o senador Mares vivem quase um casamento. Eles fazem de tudo para que um esteja satisfeito com o outro e, em algum momento, decidiram que seria incrível unir as famílias.

- O que ele disse? – pergunto.

- Bobagens – ela diz, e eu gargalho.

Pego o livro sobre a bancada e começo a folear. Genevieve continua os preparativos para o almoço enquanto isso.

ÚLTIMA DANÇAOnde histórias criam vida. Descubra agora