49

2.1K 214 24
                                    

LEBLANC...

Ela está olhando para mim, com os grandes e expectantes olhos azuis, me fazendo sentir a pior pessoa do mundo. A esperança brilha em cada piscar, e eu, como o babaca que sou, estou prestes a mentir para Angelic.

- E então? – ela pergunta enquanto me mantém paralisado com seus olhos desgraçadamente lindos.

Ser um bom mentiroso não quer dizer que eu goste de mentir, e mais, não quer dizer que eu goste de mentir para ela. No entanto, não me restam opções. Aceno positivamente com a cabeça, porque creio que gestos falsos sejam menos cruéis do que palavras falsas.

- Apenas seja sincero – ela pede.

Não. De jeito nenhum.

Estou encostado contra o batente da cozinha, por sua vez, Angelic está atrás da bancada, diante do fogão. Em minha mão direita, há algo que ela acabou de cozinhar. Angelic informou que se tratavam de biscoitos com pingos de chocolate. Ela disse que eram biscoitos de Natal. Mas, honestamente, eu ainda não encontrei o sabor do chocolate, apenas de massa queimada e tristeza. Isso está muito ruim. Na verdade, ruim é eufemismo. Está uma desgraça.

- Está muito ruim? – ela franze as sobrancelhas.

Neste momento, Angelic é a criatura mais bonita do mundo. Seu cabelo está preso no topo da cabeça, e ela veste nada além de uma das minhas camisetas de botões. E tanto quanto bonita, ela é um desastre na cozinha.

Em outra época, eu não teria problema algum em mentir para ela. Hoje em dia, estou fora de forma.

- Falta apenas... – procuro a palavra que menos magoaria seus sentimentos – Açúcar.

Muito me impressiona que uma estudante de engenharia seja capaz de produzir algo tão feio aos olhos. Eu pensei que a estética fosse importante para quem gosta de decorar.

- Então você não odiou? – seus olhos se abrem, juntamente com um sorriso.

Odiar não chega perto do sentimento. Comer essa imitação de lixo tóxico foi o maior ato de cavalheirismo da história. Digo, estou contente por ela se ocupar na cozinha, mas eu estaria ainda mais feliz se não tivesse digerido este biscoito.

- Eu não odiei – afirmo.

- Você mal comeu – ela cruza os braços abaixo dos seios.

Eu não costumava gostar de garotas mimadas, e agora me recordo exatamente do porquê. Angelic não se contenta com o que tem, apenas com o que quer. E, agora, ela quer ser uma boa cozinheira. E levando em consideração que sou incapaz de voltar a comer qualquer coisa que suas mãos façam, creio que ela terá uma grande decepção.

No entanto, seus olhos expectantes ainda estão em mim. Levo o biscoito horrível até a boca. De um lado, sinto meu estômago protestar, ameaçando devolver tudo que eu comi no café da manhã. De outro lado, vejo Angelic sorrir a bater palmas.

Merda.

Minha saúde intestinal ou sua felicidade? Que porra de decisão difícil.

Mordo outro pedaço, prendendo a respiração para driblar o sabor da morte. Pelo amor de Deus, parece que o próprio diabo cozinhou isso com os pés. Engulo antes mesmo de mastigar decentemente. Ainda bem que não tenho vizinhos, caso contrário, o processo por tentativa de intoxicação seria uma certeza.

- Eu tenho certeza de que falta apenas açúcar. De resto, está ótimo.

- Inacreditável! – ela bate mais palmas – Eu sou uma cozinheira.

Angelic joga as luvas de cozinha sobre a bancada e corre até mim. Ela se joga no meu colo, e eu, felizmente, preciso jogar o biscoito no chão para pegá-la. Talvez a radiação deixe toda minha cozinha inabitável. Angelic abraça meu torso com as pernas.

ÚLTIMA DANÇAOnde histórias criam vida. Descubra agora