Capítulo 2

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Pinoua cortou a carne em seu prato com a precisão de um assassino. 

Seus cabelos estavam arrumados impecavelmente, com os cachos cor de mel caindo em suas costas. Os olhos esverdeados estavam sombrios e seus dedos seguravam os talheres rigidamente. A tensão era perceptível em seu semblante. Seus lábios estavam crispados e as sobrancelhas, franzidas levemente.

- O que tanto te perturba, Pinoua? - perguntou o Carniceiro de Kroll. - Você fica muito mais bonita quando não está tão séria.

Pinoua odiava aquele homem, porém precisava dele, então tinha que tolerar tais coisas até mesmo durante seu jantar.

Tinha apenas alguns dias que ela aplicara o golpe e as coisas estavam tão quietas que a irritavam. Asterope estava desaparecido e todos os seus apoiadores sumiram como bolhas de sabão no ar. A Baronesa suspeitava que havia um traidor entre seus aliados, pois de que forma seus inimigos poderiam ter fugido tão rapidamente de suas mãos? Ela não dera indícios de que atacaria antes do dia previsto, mas quando enfim invadiu o castelo e as mansões, estavam todos vazios.

Como Asterope sabia que ela atacaria naquele dia? A única resposta era que havia um traidor. Mas quem?

Pinoua mastigou, mesmo não sentindo fome. Ela estava sentada na enorme mesa de jantar da família real. O castelo do rei na capital era enorme e rico, porém sem os criados que geralmente ficavam ali, parecia deserto.Pinoua conquistou o palácio, porém não havia ninguém ali para recebê-la. Agora, os únicos que lhe serviam eram seus criados pessoais, que ela trouxera de sua mansão. Aos poucos, foi mudando seu quartel general de lugar. Todas as ordens eram mandadas dali, agora.

O pai da rainha de Koria, Mário, havia retornado ao seu império, dizendo que traria tropas assim que possível. Segundo ele, em um mês já teria um pequeno exército acampado nos arredores da capital de Asteria. Mas a Baronesa sabia que esse tempo seria um dos mais difíceis. Seus homens estavam escassos e os mercenários não seguiriam todas as suas ordens. Se o povo da capital resolvesse se rebelar, não haveria ninguém para pará-los.

Pinoua bebeu da taça de vinho e se recostou na cadeira, pensando. A população ainda não havia se posicionado, mas sabia que se decidissem agir, seria contra ela. A família real Akno tinha uma fama muito boa, de soberanos bem-vistos e amados pelo povo. O grande problema era o favorecimento que Asterope dava para o mais pobres e isso enfureceu os aristocratas.

Pelo menos, isso havia trazido essas famílias para seu lado. Pinoua mordeu as bochechas. Mesmo que grande parte dos aristocratas apoiassem ela agora, o povo ainda era mais forte. O castelo era o único lugar à salvo, mas mesmo ali não seria assim sempre. A Baronesa teria que fazer algo para inibir uma revolta.

Pinoua sorriu, com o plano se formando em sua cabeça. Se virou para o homem que tanto detestava e disse:

- Kroll, o que acha de destruirmos uma revolução?

O Carniceiro sorriu.

O garoto limpava os copos de trás do balcão com um pano imundo

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O garoto limpava os copos de trás do balcão com um pano imundo.

O bar estava mais vazio do que o comum. As pessoas estavam evitando sair de casa e quem se arriscava chegava ali pensativos e temerosos. A Baronesa Pinoua havia declarado guerra contra a família Akno e tomara o poder. Ninguém sabia o que pensar, mas o medo começava a tomar conta lentamente.

As ruas ficaram subitamente muito vazias e não havia mais rondas de guardas imperiais, porém, de vez em quando podia-se ver grupos de mercenários invadindo casas e lojas, saqueando tudo sem pudor.

Isso vinha acuando a população, fazendo-a tremer na base, mas também causando um sentimento de revolta. Quem aquela mulher pensava que era? Tirava seus amados soberanos do poder e agora deixava que mercenários saqueassem seu povo? O garoto bufou.

- Por que está tão frustrado, menino? - perguntou um homem, apoiado no balcão.

- Nada de mais, senhor. - disse o jovem. - Apenas estou cansado.

- Cansado de limpar copos ou da situação política atual?

O homem ergueu o rosto e o garoto encarou-o, surpreso. Nunca fora tão lido facilmente. O homem tinha um copo de cerveja em suas mãos e seus olhos escuros pareciam desfocados. Ele estava bêbado. O garoto relaxou.

- Ambos. - respondeu. 

O homem assentiu.

- Imagino que prefira o príncipe herdeiro no poder, mesmo ele sendo um covarde.

O menino franziu a testa, com raiva. Quem aquele homem pensava que era? Falando mal do seu príncipe daquele jeito.

- Vossa Alteza não é um covarde, ele é bom para o povo. - disse o garoto.

- Alguém bom como você fala largaria seu povo e fugiria com o rabo entre as pernas? - perguntou o homem, sorrindo amargo.

- O que quer dizer? - perguntou o menino, temeroso. Ele já não limpava mais os copos.

- Não ficou sabendo? - o homem encarou o garoto. - Assim que a Baronesa invadiu o palácio, o príncipe fugiu com sua família e criados. Não lutou, não resistiu. Apenas desapareceu e até agora não demonstrou que pretende retomar o poder. Além de que, onde ele está? Asterope Akno desapareceu, mas morto ele não está, senão saberíamos.

- Mas...

- Asterope nos abandonou, garoto. - insistiu o homem. - Nos deixou nas mãos desses mercenários e completamente sozinhos. Então não se iluda achando que ele é o bom soberano que você conhece.

O garoto franziu a testa. Onde esse homem ouvira essas coisas? Aquilo era impossível, não? Asterope prometeu que protegeria eles, então ele não fugiria assim. Mas o menino já não sabia mais. O medo falava mais alto. 

- Quem lhe disse essas coisas, homem? - uma mulher disse, se aproximando. - Asterope é um bom homem, como pode acreditar em tais boatos?

- Não são boatos. Há relatos deles fugindo na calada da noite, indo embora para longe. - o homem insistiu.

- Deixe de bobeira. Eles foram coagidos. A Baronesa tomou o palácio, oras!

- Mas então onde está Asterope? Por que ele não está aqui nos defendendo? Por que temos que sofrer todos os dias nas mãos desses mercenários? - um outro homem se intrometeu, provavelmente tendo escutado a conversa anterior. - Acho que esse príncipe não é tão bom assim.

- Mas... - começou a mulher, observando em volta.

Eles haviam chamado a atenção do bar e agora, a conversa era escutada por todos. Os olhares nos rostos das pessoas mostravam que eles se inclinavam a acreditar naquele boato. Onde estava Asterope? Onde estava o príncipe? A mulher engoliu em seco.

- Ora, moça. - continuou o outro homem. - Você não pode acreditar tanto em pessoas como eles!

Enquanto eles discutiam, o homem que havia começado tudo sorria, escondendo sua felicidade atrás do copo de cerveja. Seu plano dera certo, tudo estava de acordo com o plano. Todos acreditaram em suas palavras e como era o normal de boatos, se espalhavam com velocidade, sem saber de onde começaram.

E ninguém ali sabia que aquele homem era um espião de Pinoua, enviado por ela para divulgar tais coisas. Mandado para destruir a imagem dos Akno. Afinal, naquele momento, aquilo era uma guerra de verdades e ninguém, além do povo, poderia decretar no que acreditavam.

Aisha - A Noiva do LordeOnde histórias criam vida. Descubra agora