Capítulo 6

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Nota da Autora: Este capítulo acontece simultaneamente aos dois anteriores

Família Terrare

Tuninha olhou para o céu escuro de chuva e sentiu um aperto ruim no coração. O apartamento estava muito silencioso e tranquilo; Ingrid estava no quarto, provavelmente ouvindo música no celular e desenhando, e Paula não iria voltar para casa naquela noite. Iria a São Paulo para contratar um novo químico para a empresa e só voltaria na noite seguinte, indo para o aeroporto direto da Terrare.

A governanta tentou distrair-se ligando a pequena televisão que mantinha em sua cozinha, mas não conseguia. Seus pensamentos sempre voltavam para a dona da casa, e ela sentia um mal-estar, um arrepio ruim na espinha, um frio na alma. Respirando fundo, dirigiu-se ao próprio quarto e aproximou-se do pequeno altar que lá mantinha, tirando um terço da imagem de Nossa Senhora que estava entronada no móvel.

Sentou-se na cama de modo a ficar de frente para a foto de Paula e Ingrid que mantinha em sua mesinha de cabeceira. Os dedos habituados àquela prática acariciaram as contas lisas e frias do terço, e num ato contínuo a funcionária fez o sinal da cruz. Agarrou-se ao antigo crucifixo na ponta da peça e começou a rezar.

– Creio em Deus pai, todo poderoso, criador do céu e da terra...

Enquanto isso, Ingrid, alheia ao mundo fora de sua bolha, ouvia música alta no fone de ouvido e desenhava no caderno de cartografia novinho que havia comprado especialmente para aquilo. Um raio forte fez vacilar o fornecimento de luz, e ela piscou, olhando pela janela de seu quarto. Teve um pressentimento ruim diante das nuvens carregadas e da chuva forte que batia na sua janela, e, sem pensar muito, pegou o celular e abriu a conversa no WhatsApp com a mãe.

Sentiu um calorzinho bom dentro de si ao ver a foto que Paula havia selecionado como foto de perfil. Ingrid tinha tirado aquela foto e a escolhido como a mais bonita. A mãe sorria de um elogio que Ingrid tinha feito e jogava os cabelos para trás.

A adolescente fez um carinho leve na tela do celular e franziu a testa ao ver que a mãe tinha ficado online há muitas horas. Isso era impossível; Paula era viciada em trabalho e não largava o celular um minuto que fosse, nem mesmo em reuniões.

Com um gosto ruim na boca e sentindo uma pontada de medo, a garota rapidamente digitou uma mensagem e a enviou para a mãe.

Mãe, tá tudo bem?

Uma única setinha solitária apareceu do lado da mensagem, sinalizando seu envio. Ingrid sentiu a ansiedade aumentar quando a segunda seta não apareceu nem ficou azul, sinal do recebimento e leitura da mensagem.

Apertou o aparelho numa mão e arrancou com a outra os fones de ouvido. Estava prestes a ligar para a mãe quando a campainha tocou e, motivada por um impulso estranho, saiu do quarto e foi na direção da entrada do apartamento.

Tuninha apareceu em seguida e, olhando com curiosidade para a menina, abriu a porta. Ficando cara a cara com um policial todo fardado, empalideceu e se apoiou na maçaneta da porta. Ingrid percebeu e se aproximou depressa, apoiando a mão entre os ombros da senhora a quem amava como parte da família. Vendo o policial, sentiu o aperto no coração se intensificar.

– Pois não? – Perguntou, emulando a frieza da mãe tanto quanto possível.

– Aqui é a residência da senhora Paula Terrare?

Ingrid limitou-se a assentir em silêncio.

– Sou o sargento Moura. Posso entrar?

Tuninha, trêmula, fez um gesto com a mão para que o policial entrasse. Ingrid segurou-a pela mão e a levou até a sala. A senhora e a jovem sentaram-se lado a lado no sofá, enquanto o sargento, muito constrangido, sentou-se na poltrona diante delas.

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