Capítulo 27

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Raul

Minha filha dormiu exausta depois de termos comido e brincado muito. Eu ficava com o coração partido e sem saber o que fazer sempre que o assunto "mãe" acontecia.
Eu não queria que minha filha sofresse ao  saber que foi rejeitada pela própria mãe, isso poderia traumatizá-la. Clara era tudo para mim, era como o ar que eu respirava. Desde que descobri que Laisa estava grávida ela passou a ser o sentido da minha vida.

Dizem que o homem só se transforma em pai quando vê o bebê pela primeira vez. Comigo foi completamente diferente. Eu amei minha filha antes mesmo de saber que seria uma menina, me tornei um pai quando Laisa me contou sobre a gravidez.

Eu sou capaz de matar e morrer por Clara e saber que a mãe, que a carregou no ventre não sente nada por ela me desequilibra totalmente. Desde que foi para a escola no ano passado ela me questionou algumas vezes sobre a mãe e eu, como eu verdadeiro covarde, desconversei. Mudei o assunto, e tentei de todas as maneiras possíveis ser o suficiente para minha filha, fazendo com que a presença da mãe fosse dispensável.

Minha menina era uma criança muito inteligente, esperta e com a convivência com os colegas notou que seus amigos tinham uma mãe, e não só um pai como ela. Algumas vezes as próprias crianças a perguntaram sobre a mãe e como ela não sabia o que responder, já que eu nunca toquei no assunto com ela chegava em casa curiosa.

Na época do dia das mães foi ainda mais complicado. Não a mandei para a escola, quis evitar que ela não tivesse a quem dar o trabalho que faria na sala de aula e para quem se apresentar no evento de comemoração. Clara tinha apenas quatro anos e como nunca falei na figura materna ela nem sabia da existência dessa pessoa. Mas com as perguntas e a relação com os coleguinhas ela descobriu que era diferente e que ao contrário de todos os amigos da sua sala, ela não tinha uma mulher que fosse sua mãe.

Eu ouvi a conversa dela com Fernanda durante o banho. Me partiu o coração vê-la chegando tão triste e eu já fazia ideia do que poderia ser. Mais uma vez a distrai, mudei o foco e consegui fazer com que ela esquecesse, por enquanto, do assunto.
Eu sei que chegará o momento que ficará impossível desconversar. Ela tem o direito de saber sobre a mãe.

Fernanda ficaria comigo essa noite, toda a situação com minha filha me deixou esgotado. Eu só queria deitar e tê-la em meus braços. Nunca imaginei que poderia me apaixonar tão intensamente. No início, por conta da idade de Nanda, pensei que seria algo casual, mas com a convivência eu descobri uma mulher incrível, inteligente, engraçada e muito amorosa. Principalmente com minha filha.

Eu não achava que ficaria solteiro pra sempre, mas como pai, eu queria uma pessoa que além de nós, fosse comprometida com a minha filha. Nunca, nesses cinco anos, me envolvi com alguém tão profundamente quanto Fernanda.
Ela preencheu todos os espaços vazios da minha vida. Eu imaginava que teria que me contentar com uma boa esposa e mãe, e que dificilmente encontraria uma mulher que me deixava fora do ar, que me causasse um tesão maluco e ainda fosse maravilhosa com a minha filha.

Eu fiquei com medo, Fernanda é jovem, pensei que seriamos muita responsabilidade, e um peso grande demais para uma garota de dezenove anos, no entanto ela foi muito mais decidida do que eu. Olhar para ela me deixava sem fôlego, estávamos juntos há semanas e parecia sempre a primeira vez. Eu a amava e queria construir uma família com ela e minha filha e para que isso desse certo precisava começar a colocar todas as cartas na mesa.

Acompanhei, encostado na cabeceira da cama, quando ela saiu do banho enrolada em uma toalha, no cabelo tinha outra. Ela sorriu percebendo minha atenção. Mexeu em uma pequena bolsa e tirou um embalagem de hidratante.
Aproximou-se da cama e sentou de costas pra mim. Observei soltar o nó da toalha que caiu sobre os lençóis, em seguida me estendeu o frasco e sem dizer nada comecei a espalhar o creme pelas suas costas.

Aproveitei e comecei a fazer uma leve massagem nos ombros, ela gemeu de satisfação e continuei querendo agradá-la.
Eu me sentia ansioso, não estava contente com a atitude que tive com Clara e comecei a falar, torcendo para que Nanda conseguisse me ajudar.

— Quando meu pai morreu eu fiquei totalmente perdido. No trabalho eu sempre fui responsável, mas na vida pessoal passei a frequentar muitas festas e me envolver com muitas mulheres. — Percebi que sua postura mudou e continuei a massagem. —— Eu conheci Laisa em uma dessas festas. Nosso envolvimento era completamente casual, apenas sexo sem qualquer tipo de compromisso. Eu estava muito dedicado aos negócios, já era conhecido no meio e tinha a atenção da mídia. Era o mais jovem herdeiro bilionário do país. — Sorri amargo, revivendo aquela época. — Ela estava no início da carreira de modelo, adorava se exibir. Por conta da influência do seu envolvimento comigo que acabou sendo descoberto, ela conseguiu mais trabalhos, mais espaço e deslanchou. Alguns meses depois ela me procurou completamente fora de si, descontrolada, dizendo que estava grávida e não queria o bebê. — Fernanda se virou, ficando de frente e segurou minha mão. Fiz um carinho enquanto continuei.

—  A minha vida virou um caos, eu passava 24 horas do meu dia a monitorando. Ela usava drogas, bebia e fumava. Era irresponsável e totalmente displicente com a gravidez. Foram nove meses de uma gestação complicada. Ela me ameaçava o tempo todo com um aborto. Não queria engordar e destruir o seu corpo perfeito. Eu nem sei como consegui que ela levasse a gravidez adiante. Ela teve que cancelar alguns contratos eu paguei por todo prejuízo financeiro que ela teve, arquei com todos seus gastos e exigências absurdas. Ela compreendeu que eu faria qualquer coisa pela minha filha e usou isso a seu favor.
Quando Clara nasceu foi o dia mais feliz da minha vida e o mais difícil também.
Eu pensei que quando ela visse a bebê, cairia em si e o amor maternal finalmente aconteceria. Mas ela nem quis olhar para minha filha, Clara nasceu de parto normal, porquê ela não queria nenhuma marca, participei do parto e quando a enfermeira se aproximou para mostrá-la ela se recusou a conhecer a própria filha.
Ela não quis amamentá-la, não quis sequer olhar para o bebê.
Mesmo não querendo a filha, ela exigiu uma pequena fortuna para assinar os papéis que tiraria qualquer direito dela como mãe.
Depois dos papéis assinados ela me disse que não queria, nunca, saber daquela criança. Que ela não quis ser mãe e por isso era como se aquela gravidez nunca tivesse acontecido. Foi a última vez que a vi.

Durante todo o meu relato mantive meus olhos nas mãos de Fernanda e quando encarei seu rosto, vi as lágrimas que desciam molhando sua bochecha.

— Como eu posso dizer a minha filha que a mãe dela a rejeitou? Eu não sei o que fazer sempre que ela toca nesse assunto. Eu não posso magoá-la. Eu... — Minha voz saiu embargada e Fernanda me abraçou. Era tudo que eu precisava.

— Nós acharemos uma forma de contar a ela. Vai ficar tudo bem, ela não precisa de uma mãe quando tem um pai incrível como você.

Ficamos mais um tempo abraçados, me sentindo completamente conectado a ela. Como se estivesse recarregando minhas energias com aquele contato aconchegante e gostoso.
Nanda se afastou e segurou meu rosto com as mãos, esfregou os lábios nos meus sem desviar nossos olhos e o que disse a seguir me encheu de algo tão bom que me senti capaz de mover o mundo por elas.

— Eu te amo!

Laços de Amor (CONCLUÍDA)Onde histórias criam vida. Descubra agora