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A situação não poderia ficar ainda mais tensa do que estava, porém, Raphael sentia os olhares de canto de olho de Adonis a cada segundo a mesa de jantar. Era raro os momentos em que todos se sentavam e comiam juntos, mas desde que Gwyn engravidou aquilo estava sendo bastante corriqueiro.

O macho de olhos azuis esverdeados olhou para a mãe que devorava um prato de comida, o pai sentado próximo a olhava de sobrancelhas erguidas, uma cara de divertimento silencioso enquanto as sombras dele ficavam em volta dela. Sempre fora daquele jeito, elas sempre amaram ficar enroscadas na mãe de Raphael, e quando ele e Adonis eram crianças era a mesma coisa.

Ele então olhou para Adonis, cujo as sombras eram mais retraídas, se libertavam apenas quando estavam sozinhas com ele, no momento ele não via nem um deslumbre delas sobre os ombros ou as asas do irmão que continuava o olhando de esguelha e quando Raphael menos percebeu ele e Adonis estavam se encarando como numa discussão silenciosa.

— Está bem — disse Gwyn soltando os talheres e os três machos a mesa a olharam, até mesmo as sombras pareceram ficar alertadas. — O que está acontecendo? — a ruiva juntou as mãos sobre a mesa.

Um nó se formou no estômago de Raphael e ele tentou parecer o mais calmo possível quando olhou para Adonis vendo as sombras deme finalmente aparecerem. Agora o maior medo de Raphael com toda certeza era que elas e as sombras do pai se comunicassem, que contassem a elas o estavam planejando e que elas contassem a Azriel.

— Como assim? — disse Adonis as fazendo recuar, um pouco de tédio na voz.

— O jeito que estão, não é normal — continuou Gwyn.

— Está tudo bem — disse Raphael sorrindo sem graça. — Não tem nada de errado.

— É, nada errado — replicou Adonis levando um brócolis a boca com o garfo.

— Não — disse Azriel ainda segurando os talheres, mas olhando para os filhos com aquele olhar que Raphael conhecia muito bem, era o olhar que Azriel usava para interroga-los. — Sua mãe tem razão, vocês estão estranhos desde quando se sentaram a essa mesa.

Adonis curvou os cantos da boca para baixo e negou com a cabeça.

— Estão vendo coisas — ele disse voltando a comer e então Raphael sentiu o olhar dos pais sobre si e um calafrio subiu em sua espinha.

— Raphael — disse Gwyn cruzando os braços sobre a mesa. Deuses, ele estava tão fodido.

— Já dissemos que não é nada — ele disse de maneira calma e equilibrada. — Nós só discutimos.

Azriel arqueou uma das sobrancelhas, olhou de um gêmeo para o outro.

— Espero que sabiam que sabemos muito bem quando vocês mentem — disse ele e Raphael sentiu o corpo tremer. — Mas, se não querem contar o por que, não vamos insistir...

— Vamos sim — disse Gwyn por cima olhando para o pai de Raphael que a olhou.

— Eles são adultos, Gwyneth, se estão com problemas um com o outro que resolvam como machos crescidos — disse Azriel por fim, era claro que era a última palavra dele e Gwyn olhou para os gêmeos, semicerrando os olhos azuis esverdeados daquela maneira que Raphael sabia que queria dizer vocês estão muito encrencados. 

Quando viu estava sorrindo pequeno para a mãe que voltou a comer, olhou para o ventre inchado dela, para seu irmão ou irmã que crescia ali e Raphael jamais conheceria depois de entrar no Caldeirão e oferecer sua vida pela de outra pessoa.

Olhou para o pai, para Adonis e um estranho sentimento de saudade se instalou no peito, como um luto repentino daquilo que ele ainda iria perder.

***

Corte de Sol e Tempestade. CONCLUÍDO. Onde histórias criam vida. Descubra agora