54_ Minha querida.

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Eliza Claire

Duas malas de viagem grandes e pretas ocupavam toda sua cama, uma delas quase cheia de roupa.

O pânico levou o meu olhar para o rosto do Theo antes que eu pudesse me segurar.

Estava cedo demais para que ele fizesse as malas para a faculdade. O ano escolar mal tinha terminado. Eu sabia que o Theo gostava de estar preparado para todas as situações, assim como eu, mas aquilo — fazer as malas com meses de antecedência — era demais, até mesmo para ele.

Porém, o Theo não parecia ter percebido que eu examinava as suas malas.

Os seus olhos percorriam o meu corpo com preocupação, cada centímetro que eles continuavam parecia conter uma oração silenciosa para que eu estivesse bem.

Então, os seus olhos se ergueram até os meus, e ele deu um passo na minha direção. Próximo demais.

— O que ele fez com você? O que ele falou? Ele tentou alguma coisa? Ele te tocou? — Cada palavra que saia da boca dele era carregada de emoções. Medo, angústia, pavor, raiva, ira, irritação e preocupação, era tudo tão óbvio no seu rosto, no seu olhar e na sua voz.

Ele estava entrando em pânico lentamente, observando o meu rosto, mas dessa vez com mais cautela, como se tentasse ver através dos meus olhos tudo que aconteceu quando ele não estava por perto.

— Por favor, por favor, querid...

Ele fechou os olhos por um momento, se repreendendo por quase ter me chamado pelo nome que me acompanhou durante os 6 meses ao lado dele.

Mas logo os seus olhos voltaram a exibir o tom castanho profundo e chamativo demais para que eu desviasse o olhar.

— Eu preciso que você me diga que ele não tocou você, que ele não ousou tentar fazer alguma coisa com você do mesmo jeito que ele faz comigo. — Sua voz carregada de dor me atingiu, fazendo o meu corpo estremecer ao mesmo tempo que os seus dedos tocaram o meu cotovelo delicadamente, deslizando pelo o meu braço e então alcançando o meu rosto.

Os seus dedos frios tocaram a minha bochecha direita com cautela, apesar do desespero.

O toque criou instabilidade no meu corpo todo, vibrando e me fazendo erguer a minha mão até a sua, antes da minha voz soar:

— Ele não fez nada — sussurrei. — Eu estou bem. — Segurei os seus dedos contra o meu rosto. — Você tá bem?

O seu toque na minha bochecha desapareceu, deixando um vazio enquanto o frio do quarto parecia me abraçar.

O Theo parecia ter recebido um choque da realidade e assentiu diante da minha pergunta apesar do rosto confuso.

Com o silêncio que irrompeu, permiti que o meu olhar voasse de volta para as malas na cama. Todas as roupas que já estavam dentro da primeira mala eram familiares, mas o amontoado de roupas que estava do lado de fora, era desconhecido.

Era atordoante ver aquelas roupas. Tão confuso ao ponto de eu ter que me obrigar a encarar outro lugar: a sua mesinha.

A mesinha branca tinha um pequeno vaso também branco de uma planta quase do mesmo tamanho. Era uma pena que aquela planta estivesse escondida por trás de uma pilha de livros familiares. Corte de espinhos e rosas; Corte de névoa e fúria; Corte de asas e ruína;  Corte de gelo e estrelas.

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