CAPÍTULO 14

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Depois de tudo que aconteceu eu saí de casa e caminhei até o topo de um pequeno morro que fica dentro da nossa propriedade, aqui não há ninguém e eu posso ficar sozinho com os meus pensamentos. Estou há algumas horas sentado no chão observando o tempo passar... já anoiteceu e eu não me movi para voltar para casa.

Entre tudo que pensei que poderia ser dito, eu nunca iria imaginar que sermos de dinastias rivais não era nada comparado ao fato de ter o mesmo sangue que Eda. De qualquer maneira Eda e eu não podíamos ficar juntos, quando penso em toda a provocação, os beijos, em como nós quase cedemos... meu estômago embrulha novamente.

— Você não pode ficar aqui o dia inteiro, — ouço a voz de Seyfi atrás de mim — Eda não pode ficar sozinha na casa, ela não quer falar comigo. 

— Por gentileza, Seyfi, vá se foder! 

Odeio como ele chega com sua postura cordial como se horas atrás não tivesse contado algo que ia foder a minha vida. Mas ele não vai embora, apenas senta do meu lado e observa a paisagem.

— Aqui também é o lugar favorito da sua mãe — ele diz baixinho — Ela e Ayfer costumavam vir aqui juntas enquanto Kemal e Alptekin bebiam. 

Eu não quero saber. 

— Foi aqui que ela me fez prometer que mesmo diante de todas as circunstâncias eu não deveria abandonar Ayfer e Eda — ele continua a dizer, mesmo que eu não ofereça nada como resposta — Sua mãe não a odiou quando soube, por ela vocês cresceriam juntos e uniriam as dinastias como irmãos, porque ela também via Ayfer como uma irmã.

Minha mãe tinha um bom coração, mas o meu parece ter sido destroçado com essa história.

— Então mesmo com a briga eu tinha liberdade para falar com ambos os lados, estive com as duas famílias porque as duas eram minhas amigas — ele revela, isso explica a foto que ele guarda — Mas depois que Eda nasceu eu falhei em cuidar de Ayfer, Eda tinha pouco mais de cinco anos quando a depressão levou a mãe dela... isso acabou destruindo Aydan também. 

— Não foi uma falha sua — eu finalmente respondo, não acho justo que ele se culpe por algo que está fora do controle dele. 

— Obrigado, eu tento me lembrar disso todos os dias, mas às vezes é difícil — ele suspira, mas continua: — Depois da morte de Ayfer, Kemal se fechou totalmente, sua única preocupação era em transformar Eda em uma máquina, tudo que importava era sua posse como líder dos Yıldız, mesmo que ela fosse apenas uma criança.

Tão parecida comigo...

— Não foi muito diferente do que o meu pai fez comigo — eu digo a ele, sentindo o gosto amargo da verdade. 

— Não, não foi — ele concorda — Kemal e Alptekin lidaram com a situação como dois idiotas, havia muita briga entre os homens das dinastias, muita gente morreu porque parece que o clima de rivalidade tomou conta da cidade. Até que em um desses conflitos Aydan estava sozinha e foi atingida, o que a levou ao estado vegetativo que está hoje. Você e Eda eram crianças demais para entender... foi quando surgiu o tratado. 

Sempre pensei que nossas famílias eram inimigas de outras vidas, mas conhecer a verdade é ainda pior. 

Dói mais. 

— Seu pai quase enlouqueceu quando Aydan foi desenganada pelos médicos, ele tinha todo dinheiro do mundo mas não podia salvar a mulher que ele amava — a voz de Seyfi fica rouca, como se estivesse evitando chorar — Pra piorar, ele culpou Kemal e os Yıldız por isso, mas a bala no corpo dela era Bolat, de nossa própria fabricação. 

Por isso o rigor em sempre saber em que mãos estão as nossas armas...

— Ele estava decidido a matar Kemal, mesmo que os Yıldız o matassem, ele já não se importava. Mas quando chegou, Kemal não ofereceu resistência... Seu pai o bateu várias vezes, mas nem um golpe ele recebeu de volta, nenhum Yıldız o pegou. O senhor Yıldız já estava quebrado demais por tudo que havia passado, mas a acusação de que ele teria sido o mandante do atentado a Aydan foi uma ruptura ainda maior entre os dois. Eles eram amigos há muitos anos, frequentaram a faculdade juntos... a noite que Alptekin e Ayfer ficaram juntos, Kemal ainda podia tolerar, ele podia apenas se afastar do amigo para não ter que conviver com o possível pai biológico da filha, mas ser acusado de mandar matar Aydan foi o golpe final. Foi quando surgiu o tratado, para afastar de vez quaisquer chances de que os dois se encontrassem de novo. 

O tratado que dividiu a cidade em duas partes, foi o mesmo que permitiu que ambas as famílias se isolassem em seus próprios tormentos...

— Eu não sei como você e Eda se encontraram, mas eu percebi a maneira que vocês estavam... se olhando... Isso não pode acontecer, Serkan. 

Ele não me chama de senhor dessa vez. 

— Não aconteceu e não vai acontecer. — Eu murmuro para ele, tentando convencer a mim mesmo. 

Ainda é difícil de acreditar em como de um dia para o outro as coisas começaram a dar errado. 

— Seyfi, preciso que você me responda uma coisa antes de ir — eu peço quando ele está se levantando do chão — Eda contou porque ela está aqui? 

— Não, eu me desesperei quando vi vocês juntos, — ele parece envergonhado — Não dei tempo para que ela explicasse, apenas contei logo tudo para que... isso... entre vocês não evoluísse. 

Bem, isso deixa a situação ainda mais complicada. Eu preciso voltar até ela, fazer o que prometi fazer. 

— Alguns homens, Yıldız, tentaram pegá-la. Estávamos na zona neutra, eles atiraram em nós — eu explico — Ela não está segura em nenhum lugar, por isso a trouxe. 

A expressão de Seyfi não muda, claro, ele entregou as armas para Eda, ele sabe que alguma coisa está acontecendo. 

— Você não parece surpreso — Acuso.

— Eu não estou, por isso entreguei as armas a ela — ele explica, como eu imaginava — Há fofocas por aí, de grupos se mobilizando para não deixar que ela assuma a liderança da dinastia. 

— Por ser mulher? — pergunto. 

— Não, por não ter sangue Yıldız. 

Merda. 
Como se qualquer outra pessoa fosse mais merecedora que ela... 

— Eles sabem?

— Desconfiam — Seyfi explica — Por maior que tenha sido o conflito entre as famílias, esse segredo sempre foi algo que só eu e os pais de vocês sabiam.

— Há alguém que possa ter interesse em assumir o lugar dela? 

Seyfi reluta em dizer, mas eu sei que há, ele não consegue fingir tão bem suas emoções, agora eu posso lê-lo melhor. 

— Efe Yıldız, irmão de Kemal Yıldız.

— Por que?

— Ele foi expulso da dinastia, por descumprir as regras da família, mas é o único da linhagem direta depois de Kemal. 

Agora tudo faz mais sentido... isso não é apenas uma perseguição qualquer, é sede por vingança, para recuperar o lugar que ele perdeu anos atrás. 

— Obrigado, Seyfi — eu agradeço por ele compartilhar comigo o que sabe, vai ser mais fácil tentar controlar a situação.

— O que você vai fazer? 

Eu sorrio.
Como se houvesse uma resposta diferente para essa pergunta...

— Eu vou matá-lo. 

Eda faz parte de mim agora, não importa de que maneira, e ninguém mexe com a minha família e sai impune. 

DYNASTYOnde histórias criam vida. Descubra agora