09 - incertezas

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    Existiam poucas coisas no mundo em que Elizabeth não fosse boa

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    Existiam poucas coisas no mundo em que Elizabeth não fosse boa. Eu me lembro de, em um dos inúmeros intervalos ensolarados de Los Angeles, sentar-me com Isaac sob a sombra de uma árvore e trabalhar numa lista — de teor invejoso, vale ressaltar —: Às 100 habilidades de Elizabeth Moore. Nunca deu para terminarmos, paramos no número 32 quando ela morreu.

Piano, guitarra, bateria, violino, violão. Arte no geral (pintar um quadro, desenhar, combinar cores, criar cenários, compor um poema, escrever uma história), ginástica (baleado, vôlei, basquete, handebol), qualquer matéria da escola; ela era perfeita. Ridiculamente perfeita.

Eu esperava conseguir fazê-la enxergar isto, moldar sua visão e engendrar uma hipótese no seu futuro além da morte que ela sempre dizia estar ansiosa com a chegada. Uma ideia muito egocêntrica e egoísta da minha parte. Porque eu pressupunha ser o suficiente para preencher o que faltava, assim como queria que ela preenchesse as minhas lacunas e arrumasse o meu fracasso em potencial. Eu não era boa em absolutamente nada.

Mas Eliz me ensinou a pintar, a tocar violino, a como colar em provas; eu só fui perceber que Elizabeth estava me ensinando a viver sem ela no dia em que me pendurei no parapeito do terraço da nossa escola — quando eu fui lá para espairecer, mas ninguém acredita em mim.

Eu só queria entender, naquele dia. Talvez, olhando para a queda livre e com a opção da morte bem — literalmente — na minha frente, eu finalmente compreenderia o seu anseio pela morte.

Liz tinha tudo: pais carinhosos, dinheiro em abundância, ela podia fazer viagens quando queria, comprar o que queria, estudar o que queria… ser o que queria; ela teve um apoio grandioso de sua família quando decidiu trocar de gênero. Eu fiquei muito feliz por ela também, eu via a sua aversão por si mesma quando ela evitava os espelhos antes de ser quem ela nasceu para ser. Ela pôde superar isso. Só que ainda não foi o suficiente para continuar vivendo.

Eu esperava que ela finalmente conseguisse enxergar a perfeição que eu via, uma vez que ela nunca teve coragem o suficiente para ver seu próprio reflexo no espelho — seus olhos; a porta da sua alma. Mas isso não aconteceu.

E aí, naquela manhã calorenta da Califórnia em que eu me tornei a recém suicida de Los Angeles, eu entendi o porquê. Tem uma frase que ela dizia sempre antes de fazer qualquer coisa: “Eu não tenho nada a perder”. Ela realmente não tinha; ela sabia fazer tudo, já tinha visto e feito de tudo, viveu num corpo que não era seu e conseguiu viver em um que era dela, ela já tinha quebrado todos os ossos do corpo e colocou-os de volta no lugar. Absolutamente tudo. Ela era sinônimo de perfeição, superação e conquistas. Só que ela não queria ser, e eu demorei para perceber que ela nunca estivera feliz com seus marcos. Ela queria achar uma coisa que não era boa.

E achou.

Ela não era boa em viver.

Mas eu era muito boa nisso.

HATER OF MELANCHOLY| Edward CullenOnde histórias criam vida. Descubra agora