Sangue Leal

Capítulo 11

Eu segurava Alice no país das Maravilhas e admirava a sua capa. Folheei-o enquanto procurava por alguma página amassada ou dobrada. O livro era velho mas estava bem conservado, assim como os demais que estavam na estante.

Passei para o próximo, o livro sem título o qual eu havia lido no último sábado. Mamãe já tinha saído para a sua viagem e eu estava tentando ocupar a mente limpando e organizando a estante por ordem alfabética. Estava cumprindo a promessa que havia feito sobre ela de limpá-la, o que havia negligenciado durante tanto tempo. Tateei o livro sem título de meu pai, analisando bem o seu estado. Assim como o anterior, estava bastante conservado para o tempo que havia ficado ali. Folheei-o em busca de alguma página dobrada, o que não encontrei. Mas havia algo que eu não tinha esperado encontrar: em sua última página estava um Post it grudado com algo escrito em garranchos:

"Meu retorno é iminente.
Me espere com paciência e com alta expectativa.
Enquanto isso, dê atenção as palavras que dei importância e você encontrará a resposta que tanto almeja.

Steve Oldman"

O post it estava quase ilegível. O efeito do tempo havia o mudado. Mas era o suficiente para entender as palavras de meu pai desenhadas no papel verde-limão. Para quem será que ele havia escrito isso? Eu não conhecia o meu pai, nem mesmo por foto, e também não me lembrava dele. Não sabia seus gostos, sua voz, sua forma de agir ou de pensar. Mamãe evitava falar sobre ele ao máximo, já que ele havia lhe deixado traumas. Ainda assim, eu tinha curiosidade de conhecê-lo. Às vezes, sentia necessidade de saber mais sobre ele, mas a culpa desse desejo sempre me atingia. Como eu poderia ter curiosidade de conhecer o homem o qual me abandonara? 

Pus o livro de volta na estante, deitei-me no sofá e me estiquei. Minha mente vagou pelo que aconteceria mais tarde. Mark e eu iríamos à casa de Michael e roubaríamos Aleteia. Eu sabia o quão errado era o que faríamos, mas eu não estava me importando muito com as consequências de meus atos desde o momento em que a minha foto foi estampada em um cartaz com uma recompensa de cem mil dólares debaixo dela.

Eu não sabia o quão perigoso era o que eu estava prestes a fazer, apesar de ter noção de que roubar por si só já era arriscado. Todavia, o objeto que iríamos roubar era mágico e, sendo eu leiga de todo assunto relacionado a magia, visto que há algumas semanas eu nem mesmo acreditava na existência da mesma, o que eu esperava era que qualquer passo em falso poderia custar a nossa vida.

Eu também não compreendia o porquê de Mark estar fazendo isso por mim. Mark havia me protegido desde que tinha descoberto que eu era alvo de Vicenti, isso porque era seu dever como parte da organização. Mas agora era diferente, fazendo isso ele iria descumprir uma de suas regras, iria trair a organização. Ele tinha muito a perder ao me ajudar a roubar Aleteia.

Respirei fundo e me virei, ficando de frente ao encosto do sofá. Em um momento minhas pálpebras pesaram e o sono me dominou.

"Eu corria desesperadamente pelas ruas da cidade enquanto o vento batia em meu rosto jogando meus cabelos para trás. As minhas pernas estavam cansadas e eu não sabia por quanto tempo mais eu conseguiria mantê-las de pé.

A noite estava silenciosa, mas ao longe era possível ouvir sons de carros e buzinas. Eu buscava Mark pelos cantos, mas não o encontrava. Minha mente implorava incessantemente para que Mark surgisse de algum lugar e me socorresse. Olhei para trás e a fera estava lá, parada me encarando. Ela abriu sua boca mostrando para mim suas presas enormes. O medo veio em cascata juntamente com o vômito que se espalhou pelo asfalto.

Os olhos astutos da fera me transmitiam suas mortais intenções. Em sua boca, eu podia notar haver um leve sorriso diabólico, como se eu fosse um brinquedo e ela estivesse se divertindo. A fera arrastou uma de suas patas dianteiras no chão e o som de suas garras em atrito com o asfalto aumentou a adrenalina que era injetada em minha corrente sanguínea. Eu gritei. Gritei com toda força que tinha por Mark. Ele não veio.