A retaliação veio a jato. Numa manhã, eu passava pelos corredores do colégio com Pedro e Elias. Conversávamos animados até que Elias me alertou que meu cadarço estava desamarrado. Não deu sequer o tempo de eu ir até um banco amarrar, que fui abordado por Siqueira:
- Cadarço desamarrado, Mendes? Mas de novo. Todo dia preciso encarnar com você por conta da vestimenta.
Eu não tive nem tempo de responder.
- Já chega. Talvez uma detenção depois da aula lhe faça aprender de uma vez por todas
E saiu.
- Ele não está falando sério, certo? - Elias perguntou, após ele sair.
- Não sei - respondi, ainda pensativo sobre a gravidade daquilo.
Mas a ameaça não foi em vão. Ao fim da aula, chegou o comunicado oficial da diretoria e eu deveria me dirigir a sala de detenção para cumprir o castigo. Revoltado, segui até a sala e me apresentei para o inspetor, um oficial graduado. Expliquei para ele a situação, acreditando que seria perdoado. Ele apenas olhou o papel, ajeitou os óculos e me encarou com a expressão séria.
- Você conhece as normas do colégio, senhor Fábio? Em especial as que falam de vestimentas?
- Sim, conheço. Mas foi apenas um cadarço desamarrado e eu já ia amarrar quando ele chegou
- Pelo que consta no aviso de detenção, ele tem lhe chamado atenção repetidas vezes com relação a sua indumentária
- Ah, fala sério. Ele implica com tudo comigo. Todos os alunos, ninguém anda da forma como ele acha certa. Mas ele só implica comigo
- O senhor não é todo mundo, não é mesmo, senhor Fábio? - Ele me olhou friamente e eu engoli seco. Pois senti a malícia.
Fiquei calado e peguei de volta o papel.
- Acho bom o senhor não se atrever a importunar a direção com essas questões bobas. Há menos que queria ser mandado para casa com um aviso mais sério. Para pensar em suas posturas
Eu nada respondi, apenas segui para uma mesa e me sentei. Fiz todas as tarefas sem reclamar. Li todo o código de regras da escola. Fui um aluno modelo durante as horas em que estive lá. Pelo menos, duas coisas foram proveitosas nessa leitura. Uma me serviu de alerta e outra de esperança.
Pelo que parecia, eu podia receber apenas três suspensões como aquela antes de ser mandado para casa por uma semana. Após a suspensão em casa, se eu voltasse a causar problemas, era expulsão.
Outro ponto que li, e era óbvio, é que a escola proibia drogas ilícitas. E a pena era expulsão imediata.
Ao dar minha hora de sair, um aluno do terceiro ano veio a porta e me avisou que eu tinha uma ligação de minha mãe. Fiquei preocupado. Teriam sido meus pais comunicados? Logo na primeira suspensão?
Fui calado e atendi.
- Oi, meu amor. - A voz doce de minha mãe indicava que ela nada sabia - como estão indo as coisas ai? Morrendo de saudades. Horrível esse lugar confiscar os telefones de vocês
Na verdade, o colégio não os confiscava. Mas a regra dizia que não podíamos usar os aparelhos nas dependências. Então o meu e o dos demais alunos ficavam nas malas no dormitório.
- Verdade. Eu estou indo bem, só... Uns probleminhas em minhas guerras pessoais - informei, sem entrar em detalhes.
- Preciso comprar a gasolina e os fósforos? - Brincou e rimos
- Ainda não. Mas reserve o limite do cartão de crédito, pois esse lugar é grande
Rimos mais. Aquilo me aliviou bastante. Acabei contando sobre a detenção. Afinal, eles saberiam de qualquer jeito. Melhor que fosse por mim.
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Colégio Pracinhas
RomanceEstruturas são como grilhões, que nos moldam e limitam, mas também podem abrir possibilidades para novas experiências quando as condições ideais são aproveitadas. Fabio ingressou no colégio militar Pracinhas e não imaginava o mundo de aventuras e po...