Não era minha intenção passar a noite lá, mas o sono chegou sem eu sentir e quando me dei conta, acordei com muita preguiça. Escutei o celular de Siqueira ao longe e tentei ignorar o quanto pude. Mas ao fim tivemos de nos levantar. Senti Gabriel calado, meio distante. Estava visivelmente constrangido. Sorriu pra mim quando deu bom dia, mas não foi mais amistoso que isso. Me vesti e me despedi. Tinha de voltar para meu dormitório antes que sentissem minha ausência.
Mas já era tarde, pois foi só eu sair pela porta, que vejo o inspetor terminar de subir até aquele andar. Tentei ainda voltar correndo, sem sucesso.
- Mendes, é você?
Malditos óculos fundos de garrafa. O cara enxergava como uma águia. Me virei e encarei meu destino.
- O que faz aqui a essa hora?
Eu não soube o que responder
- Vejo que passou a noite fora de seu dormitório - concluiu sozinho.
Nesse momento, Siqueira saiu do seu quarto e tentou intervir.
- Capitão, nos desculpe. O Mendes acabou ficando aqui até tarde porquê... Estava me ajudando com meu trabalho...
- Eh... Isso - dei corda, embora duvidasse que estivesse sendo convincente.
- Essa é a desculpa mais deslavada que já ouvi. Vocês do terceiro ano tem autoridade para andar pelo colégio fora do toque, e até mesmo trazer algum calouro sob seus auspícios. Mas isso não os autoriza a que eles passem a noite fora do alojamento. Mendes, detenção - foi categórico.
- Mas senhor, fui eu quem o obriguei - Gabriel tentou mais uma vez.
- Não foi o senhor Siqueira quem descumpriu essas regras. Foi o soldado Mendes. Então, Mendes, já sabe onde é a sala. - E não esperou nossos embates e se virou.
Quando sumiu de nossas vistas, comentei:
- Acho que ele tem ciúmes de você - sussurrei, mas Gabriel não riu.
- Me desculpa, Fábio. Desculpa mesmo. Eu...
- Relaxa. É ainda meu segundo. Ainda falta pra eu correr perigo. E já estamos caminhando para as provas do terceiro bimestre. Acho que consigo segurar minha onda até o fim desse ano.
Ele sorriu.
- Mas devo lembrar que já é a segunda detenção que pego por sua culpa. - Lembrei - Acho bom ser recompensado por isso.
Ele sorriu. Um sorriso sincero e amistoso. Daqueles raros de se ver em seu rosto. Ele então falou:
- Tem minha palavra
Nesse instante, os alunos começaram a sair de seus dormitórios. Nos cumprimentaram, mas nos olharam com desconfiança. Tentamos agir com naturalidade, mas sabíamos que mesmo naquele lugar, um calouro dormir junto de um veterano não era enxergado com bons olhos. Soares chegou e sussurrou.
- Que isso, Gabriel. Nem eu faço o Pedro dormir aqui. Onde você estava com a cabeça?
Pinheiro também se achegou.
- Pegou mal, pessoal.
- Eu sei... Eu sei - Gabriel se desculpou. - Eu... Eu não sei onde estava com a cabeça
Fiquei calado, pois ainda me sentia um peixe fora d'água naquele meio. Mesmo sendo tão íntimo daqueles três.
- Olha, sabe que o pessoal já está doido pra zoar com a cara do Mendes desde a 'noite dos cordeiros e dos lobos'. E eles só estão esperando você, como superior direto dele, sugerir algo - Pinheiro lembrou, então eu tive de perguntar.
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Colégio Pracinhas
RomanceEstruturas são como grilhões, que nos moldam e limitam, mas também podem abrir possibilidades para novas experiências quando as condições ideais são aproveitadas. Fabio ingressou no colégio militar Pracinhas e não imaginava o mundo de aventuras e po...