Capítulo 1

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A minha imagem no espelho não era das melhores, as bochechas pareciam cada vez maiores, e mal conseguia ver os meus olhos de tanto inchaço, respirei fundo e afundei o meu dedo na bochecha, a pele estava elástica e muito lisa, estava realmente horrível. As minhas mãos e as minhas pernas não estavam diferentes, o meu sonho era em qualquer momento desinflar como um balão ao espetar uma agulha. Na minha cabeça isso parecia engraçado, mas era impossível e provavelmente não funcionaria assim.

Com dificuldade, voltei a minha cama e olhei a minha agenda, infelizmente justo hoje eu teria que ir ao médico pra mais uma bateria de exames, era totalmente desconfortável ter que sair de casa, o único ser vivo que eu queria por perto era o José, o meu gato amarelo que não saía dos meus pés. Ele não me olhava com pena ou com a sensação de que eu estava morrendo. Ao menos ele era a única companhia agradável que existia no mundo. Aos poucos ele veio se aproximando até que deitou bem pertinho do meu ombro e fechei os olhos ouvindo o ronronar dele.

Às vezes eu tinha sonhos como se eu fosse normal e não tivesse uma doença sem diagnóstico para encarar, tudo que eu queria era poder sentir novamente o cansaço de um dia longo de trabalho ou a tensão de gastar todo o salário em menos de quatro horas após o recebimento. Tudo aquilo fazia parte de uma garota que eu nem conhecia mais.

Em tempos de saúde eu tinha dois empregos, prestava serviço em duas empresas diferentes e sempre estava com o meu dia cheio. No final de semana, saia com os meus amigos e rodava por toda a cidade, desde a praia até os pequenos barzinhos. Foi durante um show que eu senti os primeiros sinais de que nada ali estava normal. Até que um dia senti um formigamento absurdo nas extremidades, apaguei e acordei no hospital, desde então nada foi mais normal na minha vida.

- FILHA! ACORDA! - Com os gritos da minha mae, fui tirada do meu sonho de vida normal - Você tem médico a partir da dez! Depois iremos naquela médica nova, preciso que você se levante para se alimentar!

Eu achava engraçado como ela sempre pensava que eu estava com fome quando na verdade tudo que eu fazia era receber pratos nutritivos e deixar pela metade. Um dos aspectos dos meus sintomas era a falta de apetite, então qualquer coisa que ela fizesse, seja bolo ou sopa de lentilha seria totalmente rejeitado por meu organismo.

Para piorar, eu teria que enfrentar uma médica que assinaria a minha nova dieta: parenteral. Eu torcia para ela não assinar, apesar de estar sem fome, eu curtia morder, mastigar, sentir a textura dos alimentos.

- FILHA O LEITE VAI ESFRIAAAR!

Era tarde, não dava mais para enrolar, iria realmente levantar da cama. Com dificuldades fui andando para a sala, sentia que o meu corpo estava extremamente pesado, fui respirando devagar até chegar no sofá.

- Filha, você está com muita dor?

- Um pouco mãe, não seria bom remarcar a consulta?

- Foi difícil conseguir essa vaga, ele é o melhor na área de diagnóstico de doenças raras. - Ela pegou na minha mão e olhava com ternura para elas. - Eu sei o quão é desconfortável estar nessa situação e ter que se deslocar, mas é pro seu próprio bem. Na volta passamos na massoterapeuta pra aliviar um desses sintomas, certo?

- Confesso que estou precisando de uma drenagem! Ainda bem que a médica liberou, não aguento mais esses inchaços.

- Vai dar tudo certo filha, você vai ver!

O meu pai estava lá fora organizando coisas na garagem e nos esperando, ele me ajudou a entrar no carro e assim que eu fiquei confortável ele foi para o banco dele e assim esperamos a minha mãe. Tirei da bolsa outro comprimido para dor, se fosse só o inchaço em si, estava tudo bem mas a questão da dor era o que piorava tudo.

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