Dois Sob o Mesmo Teto

CINCO

À noite, penso no que eu fiz a respeito de ter descumprido a regra enquanto fazia o jantar. Soobin não está errado. Falava tanto dele que seria mais fácil ele descumprir as regras do que eu, mas o jogo virou. No fim das contas, Soobin é mais obediente do que eu pensava quando o assunto são regras. Apesar desse gênio forte, no fundo percebo que ele é um bom garoto, mas só no fundo mesmo.

     Levanto a manga da camisa onde ele me apertou mais cedo. A área foi na parte de cima do braço perto do cotovelo. Eu estava certo sobre ficar um hematoma e agora posso ver claramente. Dou uma leve cutucada com o polegar e percebo que dói ao toque. Prefiro não contar a ele, caso pergunte, e nem para ninguém sobre o que aconteceu. Mesmo sendo por coisa boba ninguém precisa ficar sabendo.

     À mesa, comendo sozinho, Soobin chega por trás e deixa um papel sobre a mesa ao lado do meu prato. Era um contrato de alguma empresa que já estava assinado com o nome dele. Ele não diz nada, mas é meio como se quisesse me dizer que conseguiu um emprego.

     — Começo hoje à tarde e volto à noite antes do jantar — ele diz.

     Soobin pega novamente o contrato, enfiando na mochila. Antes de sair, ele pega um pão de queijo que eu fiz usando uma receita brasileira que vi na internet e vai para a escola. Termino de comer e tiro a mesa antes de ir também.

     Na sala de aula, resolvo falar com o Beomgyu. Ele se senta na carteira à minha frente na fila da janela. Taehyun se encontra na fila ao nosso lado.

     — Preciso te contar um segredo — começo. — Mas não deve contar a ninguém, e vê se não surta.

     — Minha boca é um túmulo — ele diz, fazendo um gesto de zíper na boca.

     — Também quero saber — protesta Taehyun antes que eu pudesse contar.

     Beomgyu e eu nos entreolhamos.

    — Bom… digamos que você não seja bom em guardar segredos — ele diz.

     Antes que eu pudesse contar tudo, a professora entra na sala.

     — Bom dia, turma — ela diz. — Antes de começarmos a aula, eu gostaria de fazer uma dinâmica com vocês. Apenas fiquem de pé ao lado da cadeira.

     Todos da sala parecem incertos e inseguros de fazer o que ela pediu e até mesmo eu. Não gosto dessa ideia de dinâmica ser alguma coisa difícil de se fazer ou algo que devemos nos expor muito porque não sei lidar com público.

     — Vamos, gente! — ela incentiva. — Vocês tem que querer fazer as coisas.

     Devagar, todos se levantam e se posicionam ao lado da cadeira.

     — Essa dinâmica se chama Escuta Criativa — ela explica. — Vou pedir para que vocês escolham uma dupla e vão ficar um de frente para o outro. Um de vocês irá falar e o outro vai apenas ouvir. Podem falar de qualquer coisa. É hora de desabafar, expressar tudo para fora. Depois vocês podem trocar o ouvinte.

     — Quer fazer dupla comigo? — pergunto ao Beomgyu.

     Ele assente, ficando de frente para mim. Taehyun faz dupla com outra pessoa e não fica chateado com isso. É bom que não ouça o que tenho a dizer já que é o grande culpado nesse rolo todo.

     O resto da sala começa com a dinâmica e parece estar dando muito certo. A sala é tomada por burburinhos que reverberam pelo espaço.

     — Pode me dizer o que ia me falar. — Beomgyu diz. — Vou apenas ouvir tudo.

     Sei que o que eu estou prestes a fazer não é o certo, mas é necessário.

     Olho ao redor para ter certeza de que ninguém iria ouvir e então inclino a cabeça na direção dele.