Capítulo 22

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Pv. Anastácia

Sinto o carro se movendo e meu corpo sendo puxado e alguns carinhos em meu cabelo, Christian me abraça com carinho e me passa segurança, me afasto, tão logo percebo a proximidade dele.

— Ana...

— Por favor, só me deixa pensar.

— Tenho medo dos seus pensamentos, de para onde eles possam te levar.

Levanto meu rosto e o encaro, os olhos dele me mostram que está preocupado comigo.

— Estou bem. — Tomba a cabeça levemente para o lado, e sei que não acredita em uma única palavra do que eu disse.

— Não está não, e está tudo bem sobre isso Ana, dói sabermos que fomos enganados. — Por um momento seu rosto me mostra tristeza, mas ele logo dá um jeito de esconder.

— Sim, dói, mas o que me machuca é ter sido julgada sem ter o direito de contar a minha versão, o que eu sofri o que eu passei, fui enganada por uma falsa bondade, fui útil enquanto era a moça obediente, quando tento me salvar de um casamento abusivo de uma vida da qual fui destruída a ponto de tentar tirar minha própria vida, não sou mais a moça que merece respeito.

— Sinto muito. — Ele diz sério.

— Acabei de descobrir o que quero ser.

— O quê?

— Quero ser a pessoa que vai defender mulheres que sofrem como eu sofri, que buscam sair dessa vida. É isso que quero.

— Advogada?

— Promotora, quero ser quem dará voz a essas pessoas.

— Promotora Anastácia, acho que combina com você.

— Parece que sim.

— Se sairá muito bem. — Diz com um certo orgulho em sua voz.

Quando volto a encará-lo, ele está sorrindo e agora dentro deste carro me permito analisar seu rosto, Christian é um homem muito bonito, cabelos castanhos, olhos azuis acinzentados a barba por fazer dá um certo charme e o deixa mais sério e também um pouco mais velho, não sei se é essa a intenção mas fica muito bem para ele.

— Minha colega de trabalho, então.

— Assim espero, para isso preciso colocar minha vida no lugar e começar a viver por mim e pelo que acredito, sem viver algo que me foi imposto.

— Uma nova chance de viver.

— Uma voz para o meu silêncio e de outras pessoas.

Segura minha mão e leva aos lábios depositando um beijo.

— Estarei aqui para aplaudir o seu sucesso.

— Obrigada!

Seguimos o caminho em silêncio, minha mente me faz voltar no passado, e agora entendo o porquê era tão bem aceita, sempre baixei a cabeça para as vontades de todos, fiz tudo que me mandavam, e agora quando eu precisava de apoio e de uma palavra de conforto, eu sou a culpada e julgada? O Sr. Louis disse que não era para voltar, fui expulsa e Alex é bom moço que foi injustiçado?

Agora me dou conta de que minha mãe sempre me mostrou isso, não era Deus, não era a religião, eram eles que me manipulavam, José sempre pôde tudo, sempre foi o paparicado, eu era aquela que ela queria se livrar a todo instante.

Quando tentei tirar minha vida, Deus não deixou, para que desse voz a tantas outra mulheres, crianças e pessoas que não tem ninguém por eles, pessoas fragilizadas, que às vezes passam por situações que não conseguem sair, eu vivia neste ciclo vicioso, tudo era errado, tudo era pecado, Christian foi a primeira pessoa que me fez perceber que o Deus que minha mãe tanto fala, ela não o tem e não segue seus mandamentos.

Sempre me pegava pensando em porque eu merecia passar por tanto sofrimento, não era por mim, eu não sou uma pessoa ruim, Deus estava me mostrando o quanto o ser humano pode ser ruim, o quanto ele pode manipular e destruir a vida dos outros, mas Deus me mostrou o que é ser uma pessoa querida, em pouco tempo de convívio com a família Grey, descobrir um carinho e atenção que nunca foi destinado a mim antes, eu via minhas amigas da escola, o carinho dos pais com elas, me contavam sobre coisas das quais nunca vivenciei, eu lia nos livros, e nunca de fato entendi, como alguém poderia escrever algo que nunca existiu, mas existe, apenas não havia sido apresentada para esse modo de viver.

— Anastácia, por mais engraçado que seja ficar observando as várias caretas que você faz ao constatar algo em sua cabeça, precisamos sair desse carro.

— Minha vida sempre foi uma farsa. — Solto de uma vez.

— Eu não diria uma farsa, porque tudo o que você viveu foi real, apesar de triste e doloroso, aprendi Ana, que devemos tirar de toda situação uma lição, para que sejamos pessoas melhores.

— Farei isso.

— Eu sei que vai, agora podemos ir?

— Sim.

Olho a minha volta, estamos no estacionamento de um prédio, não faço ideia de quem mora aqui, mas logo sou puxada para a realidade e o nervosismo começa a tomar conta de mim.

— Nós moramos neste prédio. — Christian diz, aumentando ainda mais minha confusão. —Eu moro na cobertura e você no sétimo andar.

— Ah.

— O apartamento em que você vai morar, foi meu quando estava na faculdade, meus avós me cederam pois era próximo à faculdade, assim como foi com meu pai, e bom. — Dá de ombros. — Acredito que ficará perto para você também. — Concordo com a cabeça.

Vejo Taylor se aproximando.

— Tudo certo por aqui Senhor.

— Obrigado Taylor!

Sigo atrás dele até o elevador, e só então paro para pensar.

— Você já sabia o meu novo endereço? — Ele concorda e eu cruzo os braços. — E porque disse que não sabia no banco?

— Porque até que eu tenha certeza que Alex esteja pelo menos no inferno, não vou te deixar sozinha.

— Não vou ficar com você.

— Comigo não, só no meu apartamento.

— Não vou para o seu apartamento.

— Então não vai. — Diz e aperta o número do sete no painel do elevador.

Assim que o elevador para no sétimo andar, Christian me encara esperando que eu saia.

— Se precisar de mim, o código para a cobertura é 1009.

— Tudo bem, obrigada!

Saio do elevador, caminhando até a porta que ele me indicou, ao destrancá-la dou de cara com um lindo apartamento vazio, olho por todos os lados, caminho pelo apartamento, três quartos enormes, uma cozinha que parece ter saído de alguma revista de decoração, sento no chão e fico admirando tudo isso, ao mesmo tempo que preciso pensar em onde vou dormir, e como vou mobiliar tudo isso, abro os armários e como Christian havia pensado, não tem nada.

— E agora, Ana? — Digo a mim mesma e começo a rir dessa loucura.

Vai ser legal trabalhar e poder conquistar minhas coisas, comprar tudo do meu jeito, na casa dos meus pais até minhas roupas eram escolhidas pela minha mãe e quando me casei, a casa já estava mobiliada até mesmo as coisas de enxoval, agora vou poder escolher tudo.

Mas no momento tenho que pensar em algo, não tenho onde dormir, nem o que comer e não tenho dinheiro. Deveria ter aceitado passar uns dias no apartamento de Kate como ela disse, vou ligar para ela.

Como vai fazer isso gênio, você não tem celular.

— É Ana, o jeito é pedir ajuda ao vizinho.

SilêncioOnde histórias criam vida. Descubra agora