mais segredos

444 24 41
                                    

Dead, Janeiro de 1989

Eu estou realmente exausto por causa do último ensaio. Ser vocalista já requer esforço, e isso no Black metal requer muito mais; e tendo duas vadias desocupadas berrando idiotices ao seu lado, fica mais difícil ainda. Eu, incontáveis vezes, desejei que aquelas duas, namoradas de Jan e Jørn, explodissem, elas são insuportaveis.
Eu não queria dar ouvidos a estes pensamentos, eu sei que não deveria levar a sério, mas... as piadas que elas ficavam fazendo comigo... me deixaram bem para baixo. Quando não estavam tirando sarro da minha aparência, por aparentemente eu 'ser tão alto ao ponto de ser "merkelig" (talvez elas tenham pensado que eu não entenderia que isso significava "esquisito" por falar mais sueco do que norueguês, mas eu não sou burro), ou por eu ser "magro demais", estavam tentando imitar de um jeito ridículo o que eu cantava, e rindo em seguida... é, eu estou chateado com isso, mesmo, mais uma vez, sabendo que não devia levar isso a sério.

Depois deles terem ido embora, eu e Øystein comemos uma besteira qualquer e ele foi para o quarto dele. Euronymous, suponho que tenha acabado cochilando lá, já que não voltou mais; e eu fiquei aqui, sozinho na sala, com todos esses pensamentos rondando por minha cabeça... novamente me peguei percebendo que a pergunta "por que eu ainda continuo existindo?" estava gritando em minha mente outra vez. Era perturbador, porque eu não sabia responder; eu não sei dizer o porquê de ainda não ter me matado.
"É, você sabe o porquê sim, Ohlin, é porque você é um fraco" minha mente respondeu para si própria... de fato, se eu tivesse um pouco mais de coragem e cortasse meus pulsos mais fundo eu poderia acabar com tudo isso logo.
E agora era o que eu mais queria. Me pergunto se Euronymous estava mentindo quando disse que eu era bonito ou que gostava de mim porque eu era legal, quando na realidade eu não passo de um ser imprestável.

Coloquei minha mão entre os fios de meu cabelo e apertei meus dedos contra minha cabeça, eu me sinto mais perturbado do que nunca. Eu realmente preciso me aliviar disso.
Sendo assim, sem hesitar mais, me levantei e andei até a cozinha. Eu havia prometido para Øystein que não voltaria a me machucar, mas eu precisava sentir aquilo mais uma vez.
Euronymous tinha quebrado uma de suas garrafas de Coca cola mais cedo e tínhamos ficado com preguiça de limpar, ou seja, os cacos ainda estavam no chão. Peguei o maior que encontrei, olhei ao meu redor, e saí de casa pela porta dos fundos.

Caminhei pelo grande quintal de Øystein e me sentei debaixo de uma árvore. Tirei a camisa de mangas compridas que estava vestindo, sentindo instantaneamente o vento gélido bater contra meu peito; não pensei duas vezes em logo passar o pedaço de vidro em meu braço. Cravei com força a ponta afiada do pedaço de garrafa quebrada e o arrastei para baixo, vislumbrei o que já era tão familiar para mim, a visão de minha própria pele rasgando.

Acho que... o vermelho é reconfortante. É isso, a dor não é nada comparada ao alívio que sinto em descarregar toda a minha frustração em meu próprio corpo; o sangue é reconfortante justamente por isso, pelo alívio.
Fiz mais alguns cortes em meu braço, e quando me acalmei o suficiente, parei. Por fim, deixei que meu corpo descansasse encostado naquela árvore, enquanto sentia o sangue quente escorrer, em contraste com o frio do ambiente ao meu entorno.

Como eu gostaria de estar eternamente assim... imóvel, de olhos fechados. Quase inconsciente, mesmo que o ideal fosse a inconsciência.

Não tive uma noção muito boa do tempo que passou, mas vou chutar que foram vinte minutos, meus cortes já haviam parado de sangrar e eu decidi me levantar.
A terra camuflava as manchas de sangue, então... não tinha que me preocupar com sujeira. Escondi o caco debaixo de um arbusto, mas preferi não vestir minha camiseta ainda, para que ela não ficasse suja de sangue e Euronymous notasse que eu voltei a me cortar.
Voltei para dentro de casa e corri até o banheiro para tomar um banho e limpar o resto de sangue seco que tinha ali.

dearestOnde histórias criam vida. Descubra agora