Dois

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Nunca havia entrado em uma ambulância antes, e voltar à consciência entre fungadas em frente a dois profissionais sóbrios é tão constrangedor quanto eu imaginava. Uma paramédica com uma ruga de preocupação permanente cravada no meio da testa me observa com uma expressão severa. Dois monitores soam bipes. Quando olho os arredores, minha cabeça vira um foguete em contagem regressiva para a explosão. Meu braço dói - não, não apenas dói, mas berra de dor. Uma olhada para baixo faz-me constatar que já está imobilizado com uma tipoia.

Com o ruído distante de um trem que se aproxima, lembro de ter sido empurrado para os trilhos.

Alguém me empurrou nos trilhos do metrô!

Meu coração começa a executar uma versão caótica de kung fu no meu peito e o ritmo do meu pânico ecoa pelos diversos aparelhos que me rodeiam. Sento-me, lutando contra a onda monumental de enjoo, e falo:

- Vocês o pegaram?

- Opa, opa. - Com preocupação no olhar, a paramédica (cujo nome no crachá era Han Hyejin) obriga-me a deitar com delicadeza. - Você está bem. - Ela meneia a cabeça para mim de forma confiante. - Você está bem.

E então ela coloca um cartão na minha palma.

LINHA NACIONAL DE PREVENÇÃO AO SUICÍDIO

1-800-273-8255

Viro o cartão, imaginando se no verso vou encontrar:

PARA ONDE LIGAR CASO UM MALUCO BÊBADO EMPURRE VOCÊ SOBRE OS TRILHOS.

Infelizmente, não há mais nada escrito.

Olho de volta para ela, sentindo meu rosto queimar de indignação.

- Eu não pulei.

Han Hyejin balança a cabeça.

- Tudo bem, Kim Namjoon-ssi. - Ela lê errado minha expressão incrédula e acrescenta: - Pegamos seu nome na sua bolsa, que encontramos ao lado da plataforma.

- Ele não levou minha bolsa?

Ela aperta os lábios e franze a testa, enquanto eu olho ao redor buscando apoio. De fato, há dois paramédicos aqui - o outro é tipo o paramédico do mês, despojado, modelo de calendário, e ele está do lado de fora da ambulância, diligentemente preenchendo algum formulário. No crachá dele está escrito Choi Wooshik. Mais adiante, um carro de polícia está parado no meio-fio, e dois policiais batem um papo amistoso em frente à porta aberta do motorista. Não consigo me desvencilhar da impressão de que esta não é a forma mais sensível de intervir em uma tentativa de suicídio potencial. Eu acabo de roncar feito um porco, minha calça está rasgada, meu sobretudo está em algum lugar ao sul do Equador, e minha blusa está desabotoada para dar lugar aos monitores cardíacos. Um suicida sentiria uma pontada de humilhação se estivesse meu lugar.

Arrumando minha blusa com toda a elegância possível, repito: - Eu não pulei.

Choi levanta o rosto da sua ficha e inclina-se sobre a porta da ambulância.

- Encontramos você ali, Namjoon-ssi.

Fecho meus olhos rodopiantes e rosno diante daquele tom condescendente.

Isso ainda não explica o que aconteceu.

- Dois paramédicos simplesmente estavam andando por ali quando eu caí nos trilhos?

Ele me deu um minúsculo lampejo de sorriso.

- Ligação anônima. Disse que havia alguém caído nos trilhos. Não mencionou que outra pessoa teria empurrado. Noventa por cento de chance de ser tentativa de suicídio.

Roomies [namkook]Onde histórias criam vida. Descubra agora