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A semana se passa com menos intensidade, o que Richarlison aceita de bom grado. Ele e Son quase não conversam durante os dias que se seguem, embora o coreano sempre tenha um sorriso no canto dos lábios quando cumprimenta o brasileiro, como dois garotos que compartilham um segredo.

Durante os treinos, o desempenho de Richarlison está um pouco melhor, mas não consegue ultrapassar seus limites por causa do ombro. Na enfermaria da Universidade, o médico falou não ser nada grave, mas que ele deveria descansar por uns dois dias antes de voltar aos treinos, para não acabar machucando tudo de vez. Richarlison não ficou um dia sequer sem treinar, então precisou fingir que seu ombro não explodia de dor sempre que alguém chegava perto demais para tirar a bola dele. Na situação atual, ele quase sempre está no chão.

No último dia de treino antes do fim de semana, enquanto está jogado no chão, sentindo seu ombro latejar, Son se aproxima dele, girando uma bola de futebol em seus dedos, como um jogador de basquete.

— Quantos dias o médico te deu? — Ele pergunta, sem olhar para Richarlison no chão.

O brasileiro tenta se levantar, mas só consegue na terceira vez. Em pé, seu ombro parece doer ainda mais, no entanto Richarlison só se alonga como se fosse nada. Atrás deles, o treinador encerra o dia.

— Nenhum — Richarlison responde, dando de ombros. A mentira é quase tão ruim quanto sua expressão ao sentir uma pontada no braço.

Son percebe, abrindo um sorriso, ainda olhando para a bola. Ele se aproxima um pouco mais, agora ficando ao lado do brasileiro, os dois encarando o nada em sua frente. Richarlison consegue ouvir um dos jogadores chamar por Son e, de repente, sente todos os olhares do campo em seu ombro. Agora, ele é como um alvo pintado de vermelho neon. No time de Tottenham, a atenção de Son Heung-min é tão digna de guerra quanto o trono de ferro de Game of Thrones. A única coisa que Richarlison consegue pensar é em como tudo isso é uma grande idiotice.

— Você deveria deixar de ser teimoso. — Son diz, baixinho, em uma provocação.

— Son... O que você quer, está mole ainda.

Richarlison se diverte com a expressão confusa do coreano e se abaixa para amarrar sua chuteira, apenas porque não quer tropeçar saindo do campo e acabar com a saída triunfal que ele imaginou em sua mente. Ele escuta, atrás dele, Son chutar a bola, acertando a trave. O brasileiro se levanta novamente com um sorrisinho no rosto.

— Cuida do seu ombro, Andrade. Você é um jogador de Tottenham... Mesmo no banco. Faça por onde estar aqui.

O sorriso de Richarlison se fecha, mas ele não tem certeza se é por causa da voz séria de Son, ou da sua cara fechada, ou da forma que ele sai andando, cansado de brincar com Richarlison. Por mais que ele nunca vá admitir isso em voz alta, ele se sente envergonhado por levar bronca de alguém que sempre está sorrindo e sendo otimista com todos os jogadores, mesmo com o brasileiro. Sua teimosia é a única coisa que faz com que ele não se sinta completamente mal. Ele não está interessado em ser a distração de Son.

— Você precisa ir na enfermaria. — Claire diz, em um inglês perfeito.

Claire Jones é a única pessoa nascida na Inglaterra que Richarlison não acha fingida. Ela é sua melhor amiga desde que os dois se conheceram, alguns meses atrás, antes do início das aulas. Os dois se dão bem pelo simples fato de não se importarem com as ofensas que dizem para eles mesmos, o que Richarlison respeita fielmente. Para ele, apenas os brasileiros sabem tratar seus amigos desse jeito, como demonstração de carinho. Aparentemente, chamar seu amigo de motherfucker na Europa pode soar ofensivo. Para Claire, não.

The Tottenham Court (2son)Onde histórias criam vida. Descubra agora