Use camisinha

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Meu pai amaldiçoava o mundo todo em seu escritório. Os passos pesados ecoavam pelo teto fino. Barulho de vidro estilhaçando. Algo pagou por sua fúria. Minha mãe gritou que ele se acalmasse e enveredou a argumentar.

A CNN passava as imagens da coletiva de imprensa pela enésima vez. Hiruzen Sarutobi morreu. Assassinado. Apenas o governador do estado. Bem, ex-governador agora. Atrás da vice, Tsunade Senju, recém empossada, estava meu pai. Bem ao fundo, junto de outros assessores e secretários, estava meu tio. 

Ajeitei os fones nos ouvidos, puxei as cobertas até a cabeça, fechei os olhos.

Não cheguei a ouvir a primeira música toda, antes de ter a coberta e os fones arrancados sem cerimônia. Matsuri jogou sua bolsa no chão para tomar o celular de minhas mãos com mais conforto.

Slipknot? Nessa altura? Quer ficar surdo ou o quê?

― Se alguém vai gritar no meu ouvido que seja com ritmo.

― Adorei essa frase! Posso tweetar?   

Matsuri tinha uma aura contagiante. Era raro vê-la de mau humor. Seu sorriso iluminava qualquer um. Qualquer um, menos eu. Ela me lembrava demais alguém. Justamente quem eu deveria esquecer.

Matsuri abriu o blackout e chutou os sapatos para fora dos pés. Me sentei a contragosto, esfregando os olhos incomodados pela luz. Ela abriu as janelas, ignorando o ar condicionado. Soltou o cabelo e começou a procurar uma toalha nas minhas coisas. Ela sabia que se abusasse assim no quarto da Temari, não sairia viva.

― Como estamos hoje? ― ela disse.

Revirei os olhos. Se ganhasse dinheiro a cada vez que ouvia essa pergunta, no final dessas quarenta semanas, tiraria a Kylie Jenner da capa da Forbes.

― Tudo bem, segundo os médicos.

― Não é só o que quero saber. 

Ela parou no meio do cômodo, segurando minha toalha, meu conjunto de moletom, soltou o cabelo e me encarou daquele jeito franzido. Aquele que diz: não se faça de sonso.

― Não importa. ― Dei de ombros.

Ela atirou tudo em cima de mim e veio se sentar na ponta da cama. Matsuri ficou muito criativa depois de descobrir que não podíamos mais brigar como antes.

― Importa, claro que importa. Gaara, não pode ficar desse jeito para sempre. Olha só para isso ― ela passou as mãos por minhas olheiras. ― Aquela é a bandeja do almoço? Quando foi a última vez que comeu?

― Hoje é o dia da Temari na cozinha. Ainda não estou desesperado. 

Ela riu.

― E os empregados?

― Meu pai demitiu todos. Se ficar por aqui muito tempo, vai entrar no revezamento.

Matsuri mudou de repente o que ia dizer, boquiaberta, sua expressão era pura expectativa.

― Sentiu alguma coisa?

Fiz que sim com a cabeça. Um movimento automático. Não tinha muita certeza, mas foi exatamente como minha mãe disse que seria. Por um segundo, me esqueci como puxar o ar.

― É a primeira vez que sente? ― ela insistiu.
Novamente, apenas assenti.

Sem prévio aviso, ela mergulhou as mãos por baixo da minha camisa, onde meu abdômen ligeiramente distendido gerava um pequeno ser humano. Ela procurou em vão, compartilhar o momento. Nem mesmo meus irmãos tinham intimidade para chegar tão perto. Tolerar que ela o fizesse, não significava impedir meu corpo de tencionar e desejar que aquilo não demorasse.

como sobreviver ao fim de ano [GAALEE]Onde histórias criam vida. Descubra agora