[or fades in time]

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Quando bato levemente cada um dos pés no batente da porta de entrada da livraria, não tenho certeza se o peso que sinto cair seria da neve, ou o remorso pela frustração na minha vida.

Solto um suspiro mais do que cansado. Passar o dia sempre a beira de um penhasco, pronta para mergulhar em um vale especialmente perigoso de ansiedade e auto-flagelo, não era o quê eu esperava para hoje.

Mas dias ruins nunca avisam que serão ruins, assim como dias bons nunca nos preparam para serem bons. A injustiça é que você só saberá que um dia foi bom ou ruim quando ele estiver terminando.

Parece que até mesmo o pequeno sino que anuncia a minha entrada na loja faz com que minha cabeça exploda. Quantas aspirinas será saudável um ser humano tomar sem uma reação drástica?

Sarah já se encontra no balcão, com os cabelos loiros em um coque bagunçado bem no topo da cabeça. A expressão em seu rosto diz que a garota está a beira de cair de cansaço, mas se recusa a assumir isso. Um sentimento que conheço muito bem.

Por um momento me sinto até mal pelo favor que vou lhe pedir. A loira está treinando pesado há meses para um campeonato que nem sabe se participará mais, e as últimas semanas tem sido uma mistura de estresse e ansiedade total em então tentar achar um novo parceiro.

Além disso, ela também confessou que sente que irá precisar recuperar algumas matérias para o próximo semestre, sem contar a livraria.

Às vezes, penso que se eu pudesse descrever a síndrome de Bornout, nos últimos tempos ela seria Sarah.

Quando me aproximo do balcão, não jogo a bolsa transversal, me livrando dela, como normalmente faço. A mantenho presa ao meu lado, pois no momento estou por aqui de passagem.

Antes que eu possa abrir a boca para pronunciar ao menos uma saudação educada, a garota assim que me fita vomita de uma vez as próximas palavras.

Preciso de um favor! — os seus olhos, até então caídos, parecem se abrir mais, o azul ficando ressaltado pelas olheiras abaixo deles.

— Bom... — me encosto na madeira, cruzando os braços sobre a bancada, apoiando quase todo o peso do meu corpo. — Também preciso de um favor, mas se puder ajudar com o seu primeiro...

Ela nem ao menos sabe ao quê eu poderia pedir, e já acena com a cabeça.

— Claro, qualquer coisa. — ao dizer isso, noto que além do cansaço iminente, parece que algo mais profundo sugou a energia da garota hoje.

Ela parece ter dificuldade em falar as próximas palavras, como se necessariamente não quisesse lembrar de algo.

— Encontrei um novo parceiro para a patinação. — não sei porquê, mas isso me soa mais como uma explicação. Uma de alguém que se sinta culpada.

Tento não a analisar psicologicamente, porque além de ser de muito mal gosto, também não se dá para confiar no julgamento de uma estudante que só tem alguns semestres de curso no currículo.

— Um parceiro bom. — novamente, a explicação. Mas ela parece tentar convencer mais a si mesma. — Enfim... — a loira nega com a cabeça, procurando foco. Minha empatia por ela cresce relativamente nesse meio segundo. — Isso não é importante. Enfim, eu gostaria de saber se teria como você colocar alguns folhetos para mim nos quadro de avisos perto da sua área do campus? — ela então se abaixa, e some do meu campo de visão por um momento. Escuto o farfalhar de sua mochila. — Preciso que cuidem do meu apartamento para mim.

Antes que o seu rosto suba novamente, a minha respiração acaba presa na garganta.

— Meio que estarei indo para a...

PELO O QUÊ LUTAR | [Em Andamento] Onde histórias criam vida. Descubra agora