Maitê.
Palmas, TO.
27 de abril de 2021.
O calor de Palmas me abraçou no minuto em que deixei o avião, percorrendo a escada até encontrar o chão firme. Meu primeiro gesto, ao me sentir abraçada por aquele clima tipicamente abafado, foi respirar fundo, contente pelo calor do sol tocando meu rosto. Em seguida, me concentrei novamente no que ainda restava pela frente para que eu pudesse, por fim, encontrar Jéssica.
— Eu não acredito que você 'tá' aqui! — ela me recebeu através de um cumprimento esganiçado, reforçando sua empolgação. Enquanto ainda me mantinha refém de um abraço, Jéssica deu pulinhos animados, sem conseguir se conter.
— Eu disse que eu vinha.
— Teca, você disse a mesma coisa antes umas dez vezes. — ao se afastar, ela mantinha o semblante sereno, embora tenha me contestado: — E você nunca veio.
— Ah, a gente sempre se encontra na casa da vó. — procurei me justificar. Enquanto Jéssica silenciosamente tomou minha mala, eu segui carregando a mala de mão, em direção a saída do aeroporto, me atentando a conversa:
— E você prefere ir para lá do que vir para a minha casa?
— Não começa com o drama... — adverti.
— Não, foi uma pergunta, Teca. Eu 'tô' te intimando a vir mais 'pra' cá. 'Cê' 'tá' solteira agora, não 'tá'? É a oportunidade perfeita para você vir me ver com mais frequência.
A pergunta, embora tenha sido feita sem maldade, me causou um breve incômodo. Era aquela típica pergunta que, embora eu esperasse escutar, e tenha ensaiado centenas de respostas na minha cabeça, ainda me causava desconforto. Camuflando minha reação, me antecipei em dizer.
— Eu 'tô' sim.
— 'Tá' tudo bem se você não quiser falar sobre. — Jéssica assegurou, enquanto continuávamos a abrir espaço ao caminhar em direção a saída do aeroporto.
— Não, não foi nada... — interrompi a frase ao perceber que sim, havia sido. Mas, como não vinha ao caso, apenas continuei: — Não deu certo por causa da família dele, mas é uma longa história.
— Não gostaram de você? — ela supôs.
— Não. Muito menos do fato de eu ser brasileira. — mencionei, o que fez com que minha prima forçasse uma careta. — E ele meio que não se importava com isso, então, alguma hora, isso ia ficar insustentável.
— Ele não se impunha quando vocês estavam com a família dele?
Assenti negativamente no mesmo instante em que alcançamos o estacionamento do aeroporto. Jéssica seguiu caminhando ao meu lado e eu me senti confortável o suficiente para continuar a história:
— Talvez, se ele tivesse se imposto, as coisas teriam sido diferentes. Eu moro lá há dezesseis anos. É o tipo de coisa com que eu já me acostumei...
— Não deveria.
— Com certeza não. — prontamente concordei. — Mas, é o tipo de coisa que depois de um tempo não mexe mais tanto assim comigo. Enfim... — balancei a cabeça para dispersar meus pensamentos bagunçados. — ...ele deixou as coisas acontecerem, eu cansei de me sentir um saco de pancadas constantemente, então eu explodi com ele há umas três semanas atrás. Não foi bonito.
— Ele disse o que?
— Ele tentou se justificar, né? — ergui a mão de encontro ao meu rosto para tentar espantar os raios solares que recaiam sobre os meus olhos. — Com uma história de que ele não tinha culpa de nada, que ele me amava do jeito que eu era... Amava porra nenhuma e eu 'tô' velha para ficar nesse tipo de relação sem futuro. Eu perdi quase um ano da minha vida nessa.
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Intempérie | Ricelly Henrique
RomanceIntempérie é uma palavra de significados extremos. Pode-se referir a fenômenos climáticos intensos ou a catástrofes lastimáveis. Nessas circunstâncias, também pode ser usada para definir o relacionamento entre Maitê e Henrique; curto e intenso, na m...