Subo a pequena escada da entrada de minha casa e sento-me no primeiro degrau, arrasto meu traseiro para trás ficando assim com bastante espaço para me esparramar. Olho o horizonte, respirando fundo e fico observando os vários caminhos que levam até a mansão e ao escritório de gestão da fazenda.
Os pássaros passam voando rapidamente pelo céu, com certeza já estão se retirando para dormir. Observo e ouço a cantoria e consigo identificar algumas espécies. Tia Carmem sabia identificar todos os sons de diferentes aves e isso me deixava fascinada.
Com o passar dos meses em sua reabilitação, onde a afastaram de vez do serviço, ela disse que precisava de uma ocupação, então decidiu se sentar do lado de fora de nossa casa, e sua principal tarefa era ouvir o canto das aves, anotar de forma simples -e sem esforços- quais espécies tinham ali na fazenda e depois me mostrava. Foram muitos meses de treinamento para que ela conseguisse esse feito.
Lembro-me que ao chegar do serviço, a via sentada do lado de dentro da casa com sua pequena folha de anotações em mãos ou em cima da mesa enquanto dona Maria fazia o jantar.
– Benção tia, como a senhora está? – Beijo seus fios claros e cheirosos. – Ela deu muito trabalho Maria? – A mais velha franze os lábios e revira os olhos. Sorrio.
– O de sempre Aurora, dona Carmem é um anjo. – Ela pisca e me faz rir ainda mais, pois sei que é bem o contrário pois não tem quem faça minha tia ficar quieta quando se deve ficar em repouso.
– Vocês são um saco isso sim! Não posso nem respirar direito que tem gente me enchendo a paciência. – Maria e eu gargalhamos ao ouvir esse desaforo. – Riem mesmo suas abusadas, sua paias. Vocês vão ver só quando eu pegar meus panos de bunda e ir para a beira do corguinho e não voltar mais suas desavisadas! – Sento-me à mesa e puxo o papel.
– Até parece que a senhora faria isso, esse barracão é sua vida, duvido muito que trocaria ele para ficar ao relento. – Ela pega o caderno e folheia. – Eu amo a senhora e a senhora me ama também, então desmanche essa cara brava. – Beijo sua bochecha e ela suspira e sorri. – Quantos hoje tia? – Ela me entrega a folha com doze nomes de pássaros.
– A mesma quantidade de ontem, não houve mudança e não sei se um dia mudará. Essa área é predominantemente dessas espécies, a única coisa que eu queria era ver mais de perto. Eles pousam longe aí fica difícil vê-los, isso quando só ouço o cantar. – Sorrio ao ver os nomes, olho para ela e sinto um orgulho enorme por ser sua filha do coração.
– A senhora é incrível! Eu nunca ia distinguir as espécies pelo som que emitem. Malemá consigo identificar a voz das pessoas. – Ela meneia a cabeça e solta um riso anasalado.
– É tudo questão de prática. Um dia você vai conseguir, tenho fé em você minha sobrinha. – Pisca e toca meu rosto em um sorriso faceiro. Retribuo o afeto e acabamos jantando, trocando ideias e jogando conversa fora durante algumas horas.
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A luz de Aurora
RomanceSer luz não é apenas brilhar, mas sim iluminar caminhos. O Pensador.