CAPÍTULO XII: O QUARTO DE SALOO E THOMAS WHITE

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A mesma impressão de movimento encenada pelos quadros continuava a nos seguir pelos corredores, porém, mais forte agora e o medo e a expectativa não ajudando no plano de nos mantermos juntos. Quadros nos olhando... A certeza de que algo saia pela moldura quando dávamos as costas. Sons se papel rasgando, de tecido retorcendo. Não apenas uma mão, mas um braço inteiro a se destacar na tinta. Uma cabeça borrada. Um dorso retorcido. Apressamos o passo, involuntariamente empurrando os da frente querendo deformar nossa união. Quando chegamos na porta indicada por Dante, entramos aos empurrões batendo ela ao último de nós passar.

- Por Deus!! Vocês viram aquelas coisas?? – Ofegante e assustado, curvei-me sobre os próprios joelhos.

- Que coisas? – Senhorita Dellá olhava para nós com um sorriso interessado no rosto. Ela não parecia amedrontada, apenas incomodada com os seguidos empurrões pelo caminho. 

- Os quadros... Havia alguma coisa saindo deles e... ah esqueça, senhorita Dellá. – Desisto de tentar explicar o que alguns de nós estávamos vendo, o que pareceu a divertir, pois a vi rir baixo para si mesma voltando-se a sala onde estávamos.

Era um grande quarto retangular, do ultimo andar, com os cantos em diagonal direcionados para dentro e o teto suportado por vigas de madeira, repletos de páginas e páginas de desenhos e pinturas. A parede a nossa frente era a mais extensa e exibia uma única janela enorme que acompanhava boa parte dessa extensão toda. Semelhante ao vitral, porém sem cores, a janela era o grande foco de iluminação da sala. Não haviam outros pontos de luz no quarto, nem mesmo elétrica instalada como nos outros cômodos da casa. Aquele era um cômodo que não fazia parte do percurso turístico, pois não encontrei placas ou cordões de bloqueio. Haviam móveis, mas estes pareciam largados e esquecidos ali.

Uma beliche no canto a esquerda e na direita um piano de calda sob uma pequena elevação no chão. Vários quadros cobriam o papel de parede, elas cobriam principalmente ao lado da beliche e muitas mais estavam no chão apoiadas pela parede e sobre outras, tantas que muito mais pareciam um armazém do museu. As molduras iam de grandes a pequenas, escuro demais para distinguir mais do que borrões de tinta. Cogitei a ideia de que muitos desses quadros eram espalhados pela casa, mas agora foram agrupados aqui envolvendo a todos com o incomodo de bagunça e entulho.
Há frente da janela, no centro da sala, um cavalete com uma tela em branco. O cenário que víamos era quase igual a pintura encontrada nos relatórios.

Tyler tomou a frente para falar, mas seja lá o que diria, engoliu quando um vento frio passou por nós. A janela permanecia fechada e a luz da lua formava sombras no quarto. Pisquei uma vez e um vulto apareceu perto do cavalete, quando foquei a visão, vi um garoto sentado de costas para nós, pintando. Em seguida, ouvi notas agudas de um piano e só então percebo outro garoto tocando ao lado do que pintava.

Olhei para os outros e concordamos que todos estávamos vendo a cena desta vez. Um macete que estávamos desenvolvendo pelo costume.

- "Promete que vamos ficar para sempre juntos?"

O rapaz de cabelos castanhos sentado no piano parou de tocar e virou para o do cavalete. Saloo, distraído com seu pincel, se virou para Thomas e esboçou um belo sorriso contente.

- "Por que está pintando ele chorando?"- Thomas apontou para o quadro de Saloo, que parecia pouco nítido para nós. O rapaz Saloo, de cabelos bem escuros, porém de corte precisamente semelhante ao do outro rapaz, iniciou uma sequencia de gesto com as mãos que não entendi  o que significavam.

- Saloo acha que o homem na pintura perdeu alguém. – A voz de Éric sussurrou atrás de nós. Demorei um instante para entender que ele estava "traduzindo" o que o rapaz fazia. De fato, eu havia lido nos jornais sobre uma nova linguagem surgindo na França entre médicos que trabalhavam com deficientes.

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