Capítulo 5

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     Sim, isso me pegou de surpresa.

     -Tá tão na cara assim?

     É,  percebi o quanto eu era inútil aí,  incapaz de esconder um mísero sentimento. Talvez seria injusto chama-lo de mísero?  ...

     -Sim, está. E não,  não sou só eu quem percebeu, mas eu te entendo,  Lucas é gato. Sorte sua que ele é hétero e eu o considero como irmão.

     Vicky e Lucas voltaram juntos e se sentaram na mesa.

     Fitei meu suco sem coragem de levantar o olhar.

     -Foo Fighters. Quero dançar.  Emma? - Vicky disse com um olhar tão intimidador que até fiquei com medo.

     -O quê?  Não,  nem pen- fui puxada pelo braço e antes de terminar a frase, já estava no meio da pista.

     -Vicky, eu não sei dançar!  - Gritei alto o suficiente para ela ouvir.

     -Você nunca tentou! Nós estamos aqui pra comemorar, não ficar observando igual você fazia a anos. Apenas sinta a música e se solte. - gritou de volta.

     E assim o fizera, sem me importar com as pessoas em volta.

     Quando me dei por conta, Vicky me olhava sorrindo.

     -Nem me lembro da última vez que te vi tão despreocupada. Realmente, Foo Fighters faz bem.

     Rimos e voltamos pra mesa.

     Passamos o tempo discutindo sobre religiões,  drogas, tipos de canetas (sim, tipos de canetas), jogos, etc.

     A essa altura, Vicky já estava bêbada o suficiente para começar a chorar e falar o quanto estava triste e ia sentir saudades de Carin. Tentei consola-la, mas foi inútil. 

     -Vou levar ela pra casa. Vocês vêm junto?- Tales se levantou apoiando o braço de Vicky atrás de seu pescoço. Ela sussurrou algo como "Não quero, quero o Brasil." E depois calou a boca.

     -Não,  preciso falar com a Emma.

     -Ok, até mais então.

     E ficamos a sós, ao som de Speak Up, The Morning Benders.

     -É... vou ao banheiro. - disse depois de constrangedores segundos em silêncio.

     -Ok, me encontra na praia quando voltar.

     Assenti e me levantei.  Fui até o banheiro e me olhei no espelho. Meu Deus, eu estava um trapo. Refiz do rabo de cavalo ajeitando as mechas azuis, não ajudou muito. Olhei no meu celular, 3 chamadas perdidas de Lucy.

     Saí do banheiro e fui até a praia, que ficava atrás do Ever Over, Lucas estava sentado na areia, olhando o mar. Me sentei ao seu lado.

     -Estava lembrando de quando passávamos a tarde inteira aqui, fazendo absolutamente nada. Apenas olhando as nuvens. -ele disse, sem desviar o olhar do mar que refletia a luz da Lua.

     -Lembra de quando tinha um cachorrinho se afogando e eu não sabia o que fazer até que você teve a idéia de jogar a bóia de um  garotinho pra salvar ele?

     -Sim, quando ele percebeu que eu havia pego sua bóia,  chorou como nunca. -rimos - E quando nós estávamos brincando de pega-pega e você caiu? É,  naquele dia você chorou mais que o garotinho.

     -Hey, aquilo machucou. - o empurrei de leve.

     Seu olhar se encontrou com o meu. Ficamos nos olhando por alguns segundos que pareceram minutos,  horas...

     A 9 anos atrás,  neste mesmo lugar. Eu e Lucas.
     -Quer casar comigo? - ele perguntou.
     -Por que você quer casar comigo?
     -Pra poder te beijar a hora que eu quiser. 

     Desviei o olhar para o horizonte, sentindo o sangue subir as minhas bochechas. Lucas deu um leve sorriso e voltou seu olhar para o mar. Algo me dizia que ele também havia lembrado.

     -O que você queria falar comigo?-perguntei.

     Depois de um tempo,  ele respondeu.

     -O que você acha de mim?

     -Como assim? Bom, eu acho... você legal.

     -Só?

     -Inteligente, engraçado... mas por quê?

     -Você é a pessoa mais próxima a mim, então acho que não tem problema te contar. É que... eu gosto de uma garota, da nossa escola.Faz tempo, o problema é que ela nunca me deu bola.

     Sim, foi um choque de realidade. É claro que ele não sentia nada por mim. Aos 8 anos era apenas um sentimento bobo, amor de amizade que não sabíamos diferenciar. Não entendi muito bem a parte do "ela nunca me deu bola", sendo que a maioria das garotas sentiam no mínimo,  atração por ele e sediam fácilmente aos seus caprichos. 

     Senti um nó na garganta e fiz o possível pra disfarçar a alteração na voz.

     -Oh... é,  que bom. Quem é ela? - é claro que eu não queria saber quem era ela. Por que eu perguntei, então?  Não faço a menor idéia... impulso, talvez.

     -É... - meu celular tocou, o interrompendo, agradeci mentalmente.

     -É minha tia. Tenho que ir. -disse me levantando.

     -Eu te levo.

     -Não. Quero dizer, não precisa. Tchau.

     Sai andando, sem dar tempo de ele responder. Sem me importar com as lágrimas molhando meu rosto que até então,  segurava. Sem me importar com a dor e o aperto no meu coração.  Sem se importar com as businas, cada vez que atravessava a rua sem olhar para os lados.
     Naquele momento, eu não era ninguém. Eu não queria ser ninguém.

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