A esperança

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- Agora você entende a razão de eu não querer levar ninguém a sério? - dirigiu-se a Sophie que ainda permanecia imóvel naquela cama - Eu vejo amores eternos acabarem todos os dias, isso é frustrante e doloroso. Sei que nao quer falar disso - hesitou e eu tive vontade de lembrá-lá que Sophie não estava falando com ela, mas permaneci fingindo que lia um livro, na confortável poltrona que se encontrava naquela UTI - eu realmente achei que o Willian fosse a tal excessão, mas não foi amiga e agora você está aqui por culpa daquele cretino - cerrou os punhos e encheu os olhos de lágrimas - por favor, por favor, por favor Sophie, não me deixa amiga, não deixa as pessoas que se importam com você, volta logo, estou com muita saudade. - enxugou uma lágrima e me encarou dando um falso sorriso.

Fiquei um tempo no mesmo lugar, imóvel, mas desta vez encarando o rosto inexpressivo da menina que um dia tanto sorriu e tanto me fez sorrir, mesmo sem saber.

Observá-la agora, era bem diferente de fazer o mesmo no café, ainda podia ver seu rosto, que mesmo pálido ainda era incrivelmente lindo, mas não podia ouvir sua risada quando derramava café na roupa, não podia vê-la chegando alegre com lágrimas nos olhos ao poder contribuir com uma das poucas refeições de um pobre mendigo, sim, Sophie era durona, eu não era seu amigo, sequer era um conhecido, mas pelo tempo que a observei, percebi que ela realmente era a pessoa com o maior coração que eu já conhecera, Sophie não tinha apenas uma beleza angelical, mas sua alma também era de anjo.

O tempo passava depressa naqueles rápidos minutos naquela UTI, ouvia apenas o barulho dos aparelhos que ainda a mantinham viva, olhei inúmeras vezes para seu rosto com atenção, desejando que ela acordasse depressa e desse um grande sorriso.

No fim do dia, quando acabaram os horários de visitas, fui para casa relaxar, tomar um banho e ver um filme, ou série, ou então futebol. O telefone tocou, deixei cair na secretária.

- Steven, que saudade! dias tanto falar com você amor, me liga quando puder, beijao da Nina.

Nina era minha namorada, pelo menos havia sido um dia, mas sua futilidade acabou com o encanto, saiamos para festas, ela sempre tinha um ataque por ciúme ou por causa de um fio de cabelo fora do lugar, odiava o meu trabalho numa revista tão pequena "Você é rico Steven, não precisa trabalhar naquele muquifo, seus pais podem te dar tudo que precisa, basta continuar os negócios da família." . Cheguei a pensar, inúmeras vezes que ela trabalhava para meu pai, pois ele tinha grande esperança que eu um dia tocasse os negócios da família, já que era o único herdeiro.

Minha vida não era nada ruim, uma namorada linda, ruiva, olhos claros, tinha uma família rica, que me amava, trabalhava em algo que realmente gostava, uma vida perfeita para qualquer homem, não para eu, Steven Gilbert. Naquele café, vi em Sophie uma razão para viver, um motivo para também sorrir como ela, mesmo quando virasse café em uma camisa branca, não me saia da cabeça a imagem dela sendo retirada das ferragens e agora imóvel naquela cama de hospital.

Com esperança seguiram-se os dias, minha rotina incluía a visitar todos os dias, as vezes eu lia para ela, contava como tinha sido meu dia, Lara não entrava mais junto comigo, mas sempre nos encontrávamos por lá, a esperança ainda estava viva apesar de tudo que os médicos diziam, me agarrei forte àquele 1% de chance dela acordar, minha rotina incluía pensar nela todo dia, organizar meus horários para vê-la, pedir muitas folgas. Minha rotina agora era viver para ela, sorrir por ela e para ela, segurar sua mão e dizer "vai ficar tudo bem.". Com o tempo, pude perceber que estava criando um laço muito forte com ela.

~

Era outro dia comum como os outros, chovia muito, parei numa floricultura e comprei lírios para Sophie, estava com um sentimento bom, apesar de não saber se as flores seriam adequadas, não sabia o que ela gostava. Já no hospital, as enfermeiras me cumprimentavam pelo primeiro nome, havia intimidade depois de tanto tempo sendo frequentador assíduo do hospital. Quando entrei no quarto, Sophie até estava com cor no rosto, parecia viva, as enfermeiras comentaram que as novas vitaminas teriam esse efeito, mas els estava viva sim, pelo menos para mim.

- Bom dia minha linda. - beijei sua testa e larguei as flores no vaso com água que havia na mesa ao lado. - Te trouxe flores hoje, são lírios, você gosta? - aguardei uma resposta, a esperança permitia isso. - Sabe Sophie, - segurei sua mão - eu gosto muito de você, parece estranho dizer isso, mas desde que comecei a te observar, algo em você me chamou atenção, não foi apenas físico, foi como se houvesse algum tipo de magnetismo, nunca senti a necessidade de ver alguém todos os dias, muito menos visitei assiduamente uma quase desconhecida em coma, você é diferente, me faz sentir diferente, o que tem em você menina? Eu passaria o dia todo te olhando, sem me cansar, se as enfermeiras deixassem. Amanhã é meu aniversário e eu escolhi passar com a pessoa mais especial pra mim no momento, não vou te contar agora, é segredo. - sorri e fiquei a olhando por um tempo, levantei da poltrona e toquei seu rosto, seus traços eram finos e delicados, pele tão macia, me perguntei novamente se não se tratava de um anjo e de repente me peguei pensando em tudo que podíamos viver juntos ainda, pensei até em filhos, sonhei alto! Talvez o máximo que eu pudesse ter logo que acordasse, fosse a amizade, quanto muito. Sophie era especial demais para dar atenção a um cara tosco como eu, tê-la era um sonho distante e impossível, ela poderia ficar com o homem de sua escolha e eu também sempre tive a consciência de que não era merecedor de alguém como ela.

- Tudo bem Sophie - beijei sua mão - vou fazer de tudo para te merecer. - nesse momento algo estranho aconteceu, um dos dedos de Sophie se moveu e isso acendeu uma esperança a mais no meu coração.

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