— Hora de comer — anunciei, colocando minha bandeja de jantar no chão sujo da adega. O monstro caminhou até as barras e sentou, esperando, farejando o ar. Ele esticou uma garra para fora das barras, tentando pegar a bandeja.
— Ei, seja paciente. — Eu coloquei a pequena lâmpada a gás na bandeja de lado antes que ele pudesse derrubá-la. Nem mesmo a Conjuradora do Sol conseguia conjurar luz com as mãos ocupadas, e era impossível navegar a adega sem ela. — Deve ter algo bom, pelo menos. Cheira bem, e eu pedi carne vermelha... vamos torcer para que não seja ensopado novamente.
É claro que, porque meu marido preferia comida que não fosse da realeza, mesmo quando eu pedia carne, poderia acabar recebendo algo geleificado ou ensopado. Isso não seria um problema se eu estivesse pedindo para mim, mas o monstro torcia o nariz para gelatina de carne* e era impossível encaixar uma tigela de ensopado entre as barras. Houve uma noite em que tive que brincar de lançar pedaços de carne do estrogonofe na boca do monstro. O monstro, um carnívoro dos pés à cabeça, não estava remotamente interessado nos restos de macarrão e molho. Ele não parecia se importar em pegar os pedaços de carne, mas eu me sentia mal pela refeição frugal e lhe joguei uma das galinhas de caça como um adicional.
Eu levantei uma das tampas de prata.
— Costeletas de cordeiro! — Eu exclamei. Havia três delas aninhadas juntas no fino prato de porcelana. — Perfeito.
A criatura permaneceu agachada perto das barras. Se ele tivesse um rabo, ele estaria balançando. Eu delicadamente empurrei a primeira costeleta com o garfo através das barras, e ele a agarrou ávido em sua mandíbula, se afastando alguns metros para mastigar barulhentamente.
— Eu não vou pegar de você — murmurei, mas não houve resposta além do som de ossos se quebrando.
Eu empurrei as outras duas costeletas para ficar ao alcance dele, depois removi uma das tampas menores, revelando uma tigela de ensopado de repolho. Familiar, reconfortante. Meu estômago roncou. Usar meus poderes para me infiltrar na adega todos os dias havia reacendido meu apetite. Enquanto o monstro se deliciava com a carne, eu peguei a tigela em minhas mãos e sorvi. Não era como se alguém aqui embaixo se importasse com boas maneiras. Entre nós dois, conseguíamos lamber minhas bandejas de jantar até ficarem limpas quase todas as noites.
— Para onde tudo isso vai? — Ouvi um servo do palácio perguntar a outro enquanto eu me esgueirava invisível, tentando não deixar as travessas fazerem barulho. — Ela é tão esbelta.
Eu tive que morder meus lábios para não rir. "Esbelta" era uma palavra muito generosa para o que eu era. Genya tinha sido esbelta; eu era um graveto. Pelo menos agora eu era menos pele e osso do que costumava ser, e minha coloração estava melhorando a cada dia. Natalia havia comentado recentemente sobre o brilho do meu cabelo, que, em seu estado mais saudável, brilhava como as pérolas no meu kokochnik e, apesar de sua brancura, não me fazia parecer muito mais velha.
Nas últimas semanas, eu havia começado a pedir mais comida, especialmente mais carne, e eu sabia que alguns dos servos fofocavam que eu estava comendo por dois. Que talvez minha doença misteriosa realmente fosse um aborto, e agora o Darkling e eu finalmente estávamos tentando ter um herdeiro.
— Ridículo — murmurei para mim mesma. Se eles realmente estivessem prestando atenção, notariam que nenhum de nós dois havia estado fisicamente nos quartos um do outro à noite desde que eu despertei. Eu só o via nas ocasiões em que ele "solicitava minha presença" - me convocava - para o café da manhã. Embora eu suponha que a hora do dia não fosse exatamente um fator limitante quando se tratava de atividades matrimoniais. Eu peguei um pedaço de pão de centeio e o arrastei agressivamente pelo molho escuro no prato onde as costeletas de cordeiro tinham descansado, deixando-o encharcado antes de dar uma grande mordida.
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Out of Time
FanfictionAlina Starkov esperava acordar em um navio velejando através do Mar Real, que a levaria para longe de Ravka, para longe do Darkling e sua cruzada insana. Ao invés disso, ela acorda em Os Alta para encarar uma verdade devastadora: a guerra tinha sido...