Falling Like The Stars

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Shell Cottage, 1998

VII

Encarei-a por cima do livro que ela lia, buscando contato com os olhos âmbar que aprendi a gostar tanto, porque havia algo infinitamente bom em mirar dentro de suas bolas de sol, era quase como encarar sua alma, e senti-me estranhamente animado quando percebi o pequeno entortar de lábios que ela mantinha em seu rosto delicado. Quase um sorriso, aparentando estar satisfeita consigo mesma, ou com nós dois e nosso repentino e insano envolvimento. E isso deixava-a ainda mais atraente para que meus olhos cinzentos se mantivesse fixos em si, e em tudo que ela significava e prometia - mesmo sem saber.

Era assim desde o beijo na praia. Ficávamos juntos apreciando a companhia um do outro, mesmo quando não dizíamos nada e só o silêncio nos embalava. Eu gostava, era bom. Deixava os demônios que me atormentavam afastados, as vozes na minha cabeça mudas e cessava, só por um momento, o agouro de saber que o Lord das Trevas estava a minha procura, e que conseguiria por suas mãos imundas em mim.

Hermione Granger me trazia esperança.

Relaxei meu corpo na poltrona macia e levei a xícara com o chá - aquele que ela tinha feito para mim há alguns minutos -, aos lábios com uma tranquilidade que jamais esperei algum dia ter. Ao menos perto dela, ou em uma propriedade Weasley ladeada pelo mar e areia, enquanto vez ou outra deixava meus olhos cinzentos pousarem sobre a pequena garota que, em um passado que agora parecia distante, fora levada como uma inimiga. Catalogando ainda mais detalhes sobre seu ser. E, embora ela estivesse tão quebrada quanto eu (com olheiras, cabelo armado e roupas largas demais para seu corpo miúdo), ainda havia beleza nela. Uma beleza crua, pura e intocada, que me fazia querer protegê-la de toda a maldade que nos rondava e que estava prestes a nos devorar. Em algum ponto, eu sentia que a minha própria maldade poderia um dia afetá-la, no entanto, rogava aos deuses que conhecia que esse dia demorasse a chegar, ou quem sabe, não chegasse nunca. Para que eu pudesse experimentar todas as nuances de estar apaixonado por alguém que tinha o coração bom.

Não sabia ao certo como aquilo tinha começado, aquele sentimento que parecia se expandir dentro de mim cada dia mais. Mas tinha consciência de que havia se alastrado em mim mais rápido do que fogo em palha, pulsando fortemente em minhas veias e em meu coração. Levando-me a ansiar pela madrugada todas as horas do dia, apenas para que pudesse ficar a sós com ela. Para que não fosse necessário mascarar os olhares, os sorrisos e até mesmo os toques. Para os outros ainda éramos ex-inimigos declarados tentando conviver sob o mesmo teto e concordamos (mesmo sem dizer nenhuma palavra), que era melhor manter-nos assim.

Talvez fosse a iminência da morte sussurrando em meus ouvidos. Todos os dias, quando eu me obrigava a tentar dormir, o pensamento de que eu poderia jamais acordar rondava a minha mente, lembrando-me de que os passos dados poderiam ser em falso, e que não havia garantia de um futuro. Tudo estava por um fio. Voldemort poderia nos encontrar e acabar com tudo com um simples aceno de varinha. A guerra poderia ter um final menos otimista, o plano deles poderia ir por água abaixo... Aquela era a minha motivação para dar uma chance ao que Granger despertava em mim; o medo de não existir um momento melhor para nós dois.

Havia certo conforto em estar com ela na escuridão da madrugada. Nessas horas sombrias não existia Potter e seus olhares desconfiados para nós dois que tentávamos mascarar aquilo que pulsava em nosso sangue, Weasley e sua carranca de escárnio, nem mesmo Blás e seu sorriso debochado de quem estava esperando alguma coisa. Quando estávamos sozinhos, entre chás e conversas, éramos apenas adolescentes descobrindo as nuances tênues e profundas de uma paixão improvável e intensa.

Estávamos na sala que os adultos usavam para as reuniões, e onde Granger regularmente se trancava nas madrugadas para ler. Em meu âmago eu sabia que não deveria estar ali, mas eu não fui capaz de me esquivar desse caminho quando a castanha havia me guiado para lá algumas horas antes. Ela já sabia como me compelir, sabia como me levar.

Shell Cottage - DramioneOnde histórias criam vida. Descubra agora