XIV - Guerreiros sem alma

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Apesar da insistência de Gawain para que ela ficasse, Urd insistiu em ir embora, então o príncipe arranjou-lhe uma carruagem e decidiu acompanhá-la até em casa. O interior da carruagem era quente e atapetado, com enfeites dourados nos cantos e janelas grandes com cortinas para cobri-las. Urd via a paisagem passar lá fora agora que fazia o trajeto durante o dia, observando os pinheiros e as flores silvestres pintarem a vista.

— Já tem alguma pista de quem mandou matar sua irmã? — Murmurou, virando-se para ver Gawain, que pareceu sair de um transe.

— Não — ele encarava-a do outro lado da carruagem como a um estranho, mas não parecia nervoso, só distante.

— Já tem algum palpite?

— Também não, não tive muito tempo para pensar sobre isso, meu pai está enlouquecido com as consequências desta história.

— Por conta do Duque?

— Sim, o Rei de Mastfall deseja vantagem de guerra contra Frésia como compensação pela morte do primo.

— E por que estão entrando em guerra?

Gawain deu de ombros, olhando-a intensamente, como se a estivesse vendo pela primeira vez naquele dia.

— E por que as pessoas entram em guerra? Dinheiro, posses, terras que desejam sob seu controle. Agem como se tivessem o mundo inteiro em mãos, só irão matar mais pessoas, mas não se importam com as perdas, as perdas raramente têm nome e rosto.

— Então devia tentar evitar isso, sei que Frésia seria aniquilado.

— Eles passaram por uma praga nos últimos anos, sem plantações, tudo que conseguiram foi começar a se reerguer há poucos meses. Não sei exatamente o que meu pai encontrou naquele lugar devastado, mas ele não está medindo esforços, e a noite do baile foi uma mostra de que não apenas ele.

— Mas não é você o consultor das táticas de guerra? Podia tentar fazer alguma coisa.

— E acha que não tentei? É bem menos fácil persuadir meu pai a alguma coisa.

— Mas ele parece lhe considerar muito, pois se senta à mesa com ele e tem um cargo tão importante.

Gawain suspirou, não parecia muito satisfeito com o "elogio".

— O que tenho com meu pai é quase uma dívida, não pense haver recompensa nisso.

— Você reclama demais com estômago cheio, tem uma boa vida e um ótimo emprego, não devia só agradecer por isso?

— Certo — o príncipe fez uma careta, parecia inclinado a simplesmente descer da carruagem e deixá-la sozinha, mas continuou onde estava e em silêncio pelos próximos minutos.

O schloss surgiu no alto do cume, Dalibor brincava do lado de fora sozinho, fuçando a terra sem ninguém por perto. Ele se levantou assim que viu a carruagem se aproximar, parecia ter crescido naqueles dias em que esteve fora. O menino correu para dentro, certamente para avisar a mãe que haviam pessoas chegando, provavelmente sentia falta de Urd e achava que poderiam ser notícias sobre ela.

A carruagem parou e o príncipe saltou quase no mesmo momento, parando ao lado da porta para oferecer a mão à Urd, mas ela estancou no lugar.

— O que foi? — Gawain arqueou as sobrancelhas, olhando-a por inteiro como se assim pudesse descobrir o que a afligia.

— Eu aceito, aceito ser sua noiva — as palavras gotejaram da língua, abrindo vincos em seu coração como ácido, pareciam feitas de vidro e os cacos espalhavam-se ao redor apontados para cima.

— Agora? — Gawain arregalou os olhos.

— Sim, agora — Urd segurou a mão dele, saltando para fora da carruagem. — Espero que tenha pensado em bons termos para o nosso acordo.

De Trevas e Sangue  [CONCLUÍDO]Onde histórias criam vida. Descubra agora