𝕮𝖆𝖕𝖎́𝖙𝖚𝖑𝖔 22° - "𝕺 𝕽𝖊𝖙𝖔𝖗𝖓𝖔"

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𝕷𝖎𝖆𝖓𝖆.

Uber: a corrida deu R$50,05

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Uber: a corrida deu R$50,05. Cinquenta reais,jovem.

Olhei pela janela. Lá estava ela,a quadra que tanto parei de Uber, táxi e ônibus,já que não podiam parar na entrada do morro e nem muito menos subir.
Dobrando essa quadra e lá estaria,minha casa,o Alemão.

Uber: Moça? - o cara chama minha atenção olhando pelo espelho retrovisor. Eu então saí do meu transe.

Liana: Ah,sim, claro. Me desculpe.

Desço do carro e pago a corrida.

Eu saí de lá ao entardecer. E o Lucas tinha cochilado ao meu lado ,porém eu não consegui adormecer ao seu. Deixei uma carta para o mesmo,que acho que esperava que depois que eu soubesse não quisesse mais voltar para o Alemão,porém,muito pelo contrário,agora principalmente eu precisava voltar ! 

E aqui estava eu ,na entrada da favela,onde eu vivi tantas coisas desde a infância,onde eu cresci. A luz do sol poente tingia o céu de laranja enquanto eu me aproximava da favela do Alemão. Meu coração batia forte no peito, um tambor de guerra ecoando o ritmo da minha ciência.

Eu estava de volta, não mais a menina inocente que havia deixado para trás, mas agora uma mulher ,e mais forte que isso ,uma mãe, forjada pela dor e pelo desejo de vingança.

Eu olho para a favela, um labirinto de casas empilhadas, ruas estreitas e becos sem saída. Era um lugar de contrastes, onde a beleza e a brutalidade coexistiam, onde o amor e a traição eram vizinhos. E no topo do morro, reinava ele, o homem que eu amava e odiava na mesma medida,o pai da minha menina.

Nesse instante,olhando tudo isso, reassistindo o filme da minha vida em minha cabeça,tudo que passei e vivi aqui, sinto o peso da vida que cresce dentro de mim. Uma vida inocente, ainda não manchada pela crueldade do mundo. Eu acaricio a minha barriga, prometendo em pensamentos proteger minha filha de todo o mal, mesmo que esse mal fosse o próprio pai dela.

Eu me lembro dos meus pais, de seus sorrisos calorosos e abraços reconfortantes. Eles foram tirados de mim muito cedo, vítimas de uma violência sem sentido. E agora, eu sabia a verdade. Terror, o homem que eu amava, era o responsável. A dor dessa revelação era quase insuportável, mas também me alimentava.

Eu estou convicta do que tenho que fazer,por isto que estou tão determinada na ideia de que voltei para me vingar. Mas a vingança é uma faca de dois gumes.
Por um lado, eu sabia que precisava fazer isso para encontrar a paz que tanto desejava. Por outro lado, eu estava lutando contra o amor que ainda sentia por ele.

Eu me pergunto se teria coragem de seguir adiante com meu plano. Eu me pergunto se seria capaz de olhar nos olhos dele e fazer o que precisava ser feito. Eu me pergunto se seria capaz de viver com as consequências das minhas ações.

Mas, no fundo, eu sabia que não tinha escolha. Eu sabia que, para viver em paz, precisava enfrentar o passado. Eu sabia que, para proteger minha filha ainda não nascida, precisava fazer o que era necessário.

Eu respiro fundo, sentindo o cheiro familiar da favela. Era um cheiro de luta, de resistência, de vida. Eu estava em casa, e estava pronta para enfrentar o que viesse pela frente.

Caminho pelas ruas da favela, sentindo os olhares curiosos e surpresos de quem me reconhecia. Parecia que eu era uma lenda para eles. Afinal,a menina que havia desaparecido, agora retorna como uma mulher. E ela está pronta para reivindicar o que era seu.

Porém ,não havia só isso nos olhos dessas pessoas. Sei como que é aqui ,boatos correm. Eu posso estar sendo mal vista por eles. Talvez como alguém que traiu o Terror. E a prisão dele pode ter acarretado ainda mais para que essas pessoas duvidem de mim ,podem estar achando que eu tive coligação com a captura dele.

O Lucas me contou sobre ele ter sido preso e não,meu coração não se alegrou por isso. Eu chego aqui e olho para essas pessoas e consigo ver o que a ausência dele trás. Eu poderia dizer que era algo bom,mas não! Não é,não está igual. Como ele mesmo dizia : "Essas pessoas podem não me amar,mas me respeitam!"

Em meio às vielas estreitas e casas empilhadas da favela, uma mudança significativa estava ocorrendo. O líder, uma figura que, embora não fosse amada, era respeitada por todos, havia sido capturada.

Eu não estava aqui ,mas vejo nos olhos curiosos dessas pessoas como deve ter sido,quando a  notícia se seguiu como fogo em palha seca deixando um rastro de inquietação e confusão.
O Terror, com sua presença imponente e voz forte, embora com todo o ódio de alguns ,ele era uma figura que comandava respeito. Ele não era um homem de sorrisos fáceis ou palavras doces, mas tinha uma maneira de fazer as coisas que mantinham a ordem na comunidade. Ele era o equilíbrio precário entre a vida na favela e o mundo exterior.

Agora, com sua ausência, a favela parecia ter perdido seu eixo. As pessoas parecem que estão desorientadas, como se estivessem navegando sem uma bússola. A ausência dele era sentida em cada esquina, em cada olhar preocupado e em cada conversa sussurrada.

Eu sei que a batalha que estou prestes a travar seria a mais difícil da minha vida. Eu estou disposta a matar o homem que amava, a talvez enfrentar a ira de um morro inteiro, a sacrificar tudo pela justiça.  Mas eu não tenho medo. Eu tinha uma missão, e nada me impediria de cumpri-la.

Depois de subir o morro,eu estou agora no portão da casa da Letícia,minha tão querida amiga,já sinto vontade de chorar antes mesmo de olhar para ela ,ou Dona Olga e tia Suzana.

Antes de decidir entrar eu vejo o sol se pondo, mergulhando a favela na escuridão. Mas para mim, nunca houve tanta clareza. Eu estava de volta, e estava pronta para a vingança. E nada, nem mesmo em meu caminho pode me parar agora.



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⏰ Última atualização: Jul 04, 2023 ⏰

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