Capítulo 1-

846 52 39
                                    

Ser estrangeiro em qualquer país já exige muito esforço para obter uma boa recepção dos nativo; mas ser um estrangeiro latino em meio à europeus branquelos e esnobes, exige ainda mais preparo mental.

Por incrível que pareça, Éric Magalhães estava se adaptando bem em Magdeburgo pelo simples fato de que, se sua mãe estava feliz com a nova oportunidade de emprego e mudança de vida, ele também estava realizado por tabela.

Na escola, o garoto podia se definir como alguém com poucos colegas aqui e ali, o que já era suficiente tendo em vista que a maioria dos estudantes daquela minúscula cidade eram usuários de substâncias inimagináveis e possuíam uma vida miserável. Porém, ao que parece, seu nome rodava por todas as turmas, já que várias pessoas se interessavam em conversar com "o estrangeiro novato", fazendo ele se sentir como uma atração de circo sempre que os mesmos olhares curiosos eram lançados em sua direção acompanhados de perguntas inconvenientes e estúpidas. 

Fora da escola, a única coisa que o relaxava era escrever e conversar no MSN. Lá Éric podia matar a saudade dos amigos deixados no Brasil, e acabar por arrumar novas companhias on-line, já que seu alemão era muito melhor escrito do que quando falado. Uma de suas novas amizades no exterior era um usuário registrado como Macky, que em seu perfil publicava anotações avulsas, usando o aplicativo e a comunidade como um diário. O brasileiro, como o bom fofoqueiro que era, adorava ler e comentar nas publicações do anônimo. No chat, eles sempre se comunicavam, trazendo atualizações do dia-a-dia e mantendo uma amizade.

Quem também carregava o mesmo sentimento de ser uma aberração exposta em um zoológico, mas por motivos completamente divergentes, era Bill kaulitz. Ele e o irmão eram conhecidos e comentados pelas razões erradas, assim como Éric. Os gêmeos univitelinos, mesmo que carregassem traços padrões europeu, possuíam estilos que os diferenciavam dos demais adolescentes. Tom era do tipo skatista indiferente. Usava suas roupas largas combinando com os dreads recém colocados em seus cabelos e não ligava nem um pouco para os cochichos sobre si; era seguro do próprio estilo e somente isso o importava.

Já Bill era oposto em todos os sentidos: usava roupas pretas que carregavam nomes de bandas populares, cabelo sempre arrumado no tradicional corte emo dos anos 2000 e piercing na sobrancelha, mas o traço que mais o diferia do irmão era a insegurança.

Ambos sempre tiveram a liberdade de se vestir como queriam desde a infância, sem tabus para expressar os estilos ímpares que possuíam, mas isso tinha o seu preço fora da bolha acolhedora que viviam dentro de casa. "Bichinha"; "viado"; "esquisito"; "aberração" eram somente alguns dos apelidos que Bill recebia diariamente no ambiente escolar.

Por incontáveis vezes, seu irmão o defendia, mas nem sempre era possível se proteger de tudo. Além disso, alguns casos de bullying aconteciam fora do alcance do gêmeo mais velho, e Bill não os relatava pelo constrangimento de não ser tão corajoso e forte quanto Tom.

Éric ouvia falar sobre os gêmeos Kaulitz pelas más línguas, e vez ou outra trombava com eles pelos corredores ou nas reuniões escolares. Somente isso. A existência de ambos nunca o chamou atenção de uma maneira negativa, afinal, ele também era um patinho no meio dos cisnes.

O apartamento de Éric soava triste assim como todos os outros de sua rua que seguiam o mesmo padrão. O céu cinza que anunciava a chegada do inverno não contrastava com os prédios residenciais também acizentados e quase sempre desbotados do condomínio onde morava agora. O ar do ambiente era pesado, principalmente quando comparado a sua antiga casa no Brasil, que por mais simples que fosse, era rodeada de pessoas amáveis, e o mais importante de tudo: ainda possuía vida.

Devido ao emprego de período integral de sua mãe, o apartamento quase sempre estava vazio, e chegar da escola já não tinha mais cheiro de macarronada às sexta feiras. Agora, ele almoçava qualquer comida congelada sentado sozinho à mesa, sentindo falta das conversas que tinha com a própria mãe nesse horário antes considerado familiar e sagrado, de uma forma não religiosa.

Quase que sufocado pelo clima mórbido e entediante dalí, Éric decidiu que era uma ótima ideia circular pelo clube que ficava a poucas quadras de sua casa. O lugar não era imenso, possuía apenas duas piscinas comunitárias e uma pequena área de lazer, mas fazia jus à mensalidade patética que cobravam para que as pessoas se tornassem membros.

Chegando lá com sua bicicleta amarela, o brasileiro notou o ambiente preenchido em sua maioria por idosos aposentados que não tinham outro passatempo senão uma hidroginástica para estimular os músculos adormecidos. Éric sentia-se como eles as vezes quando parava para observar sua vida agora tão pouco movimentada. Pegando a mochila que havia posicionada na garupa da bicicleta, o garoto caminhou até o banheiro para que pudesse vestir a roupa de banho.

Ready for love- Bill Kaulitz Onde histórias criam vida. Descubra agora