Capítulo XXVIII

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≈Amanda•

Entro no carro e relembramos a nossa primeira noite, reparo que o dia seguinte fará exatos três meses desde aquele dia. Antônio dirige animado pela rodovia.

O céu fica escuro e a lua alta ilumina nosso caminho. Ele canta animado quando uma playlist chamada alto astral toca pagode dos anos 80, eu dou risada dele tentando dançar enquanto guia o veículo e xingo baixinho quando ele aperta meu joelho me provocando.

As horas passam sem que a gente perceba. De tempos em tempos coloco a mão no pescoço dele sentindo a temperatura e me animo ao notar que ele realmente estava bem. A pele corada, a voz forte e o corpo ágil eram a confirmação que eu precisava de que aquela atitude não era uma loucura.

Eu queria me sentir viva, assim como ele. Fazer o mesmo que fizemos na nossa noite mágica era como reescrever nossa história com ainda mais certezas e menos dúvidas.

Por algum motivo chegamos muito mais rápido do que da primeira vez. O sol só nasceria em algumas horas. Antônio entra no terreno sorrindo e me olhando de canto de olho. Ele desce do veículo e vejo ele retirar uma mala de viagem do porta malas com uma coberta e dois travesseiros.

Ajudo ele a abrir no gramado e deitamos juntos olhando a lua começar a se despedir da noite.

— Você sabe o motivo de eu ter te trazido aqui?

— Porque fazem três meses que viemos aqui pela primeira vez?

— Sim, mas não só por isso.

Antônio pega minha mão e faz círculos na palma.

— Eu queria conversar com você e achei melhor fazer isso onde tudo começou. Onde nos conhecemos e reconhecemos. - ele suspira.

Sinto meu peito apertar.

— Ontem quando eu estava no hospital eu pensei muito sobre a minha situação, sobre nós e sobre tudo o que já conversamos. - ele respira fundo e se senta me olhando, me sento também ficando de frente pra ele. Antônio segura minha mão e desvia o olhar - Então me deixa falar tudo e depois você pode falar e fazer o que quiser, ok? — concordo.

Nos olhamos longamente e mordo minha boca para não falar de uma vez o que eu preciso.

(N/A coloca Turning Page - Sleeping at last pra tocar baixinho)

— A minha doença pode ter cura ou não, eu não sei, ninguém sabe. Eu não sei se vou sobreviver mais um mês, dez ou trinta anos. Essa doença veio para me tirar da zona de controle e da zona de certezas. - ele ri fraco - Eu amava ter certeza sobre tudo. Minha alimentação era regrada. Meus dias completamente programados. Eu sabia o que faria todos os dias em uma semana ou um mês. Em um dia eu perdi toda a certeza da minha vida e em uma noite você me ensinou que não planejar pode ser a maior dádiva de uma vida inteira. - ele sorri largamente agora, me fazendo sorrir junto - Quando você topou minha ideia dentro daquele bar e se jogou comigo em uma viagem sem rumo, você fez muito mais do que entrar naquele carro e confiar em um estranho. Você me mostrou que o imprevisível poderia reservar a melhor surpresa da minha vida. Você me mostrou que ao perder o controle de tudo eu ganhei a chance de viver a plenitude da vida. Eu jamais dirigiria sem rumo e entraria em um terreno pra ver o nascer do sol sozinho, mas fiz isso com você e é a memória mais linda que carrego na minha mente. Essa é exatamente a memória que eu quero relembrar antes de fechar os meus olhos pela última vez.

Sinto as lágrimas pingarem na minha blusa mas não solto a mão dele.

— Eu quero te agradecer por ressignificar a minha vida com a sua presença, não existem palavras adequadas o suficiente para que eu diga o quanto você preenche os meus dias. - fungo baixinho limpando meu rosto - você é a melhor parte da bagunça que virou a minha vida. Eu viveria tudo isso dezenas de vidas se eu te encontrasse em todas elas.

Dou uma risada misturada com choro.

— Amanda, eu sei que você me disse que quer ser livre. Que quer viver a liberdade. Eu sei que disse que conseguiria ser seu amigo e o porto seguro para você voltar. E eu sei que estou sendo egoista, que eu deveria te pedir pra ir viver, e quero te deixar ciente de que você pode e deve fazer isso caso deseje, não quero que você me veja como um fardo. Mas eu não sei por quanto tempo eu posso ser o que prometi pra você. - balanço a cabeça e quando tento falar ele me impede - Não, espera. Me deixa terminar. Eu tenho fé de que vai dar tudo certo, mas... eu quero ter a certeza de que, se não der, eu fui o porto seguro que eu te prometi, em todos os quesitos da vida.

Antônio se levanta e busca algo no carro. Ele me entrega um papel e eu olho confusa tentando entender.

— Eu não sei se é o fim da minha jornada ou não. Mas, isso é uma união estável que te dá direito a tudo o que é meu. Eu não tenho filhos, eu não tenho para quem deixar o que eu conquistei se tudo der errado. - ele sorri fraco - mas eu quero deixar pra você. Você pode fazer o que bem entender, doar, vender, ir pra Itália viver experimentando todas as vinícolas. Eu só quero te proporcionar o mesmo prazer e felicidade que você me proporcionou. A mesma virada de chave e vida que você foi pra mim. Você foi e é a cura de tudo o que assola a minha alma, quero ser o mesmo para você, em vida ou não.

Sinto as lágrimas ainda mais fortes e balanço a cabeça discordando.

— Não posso aceitar. Não posso. Não assim. - me levanto e Antônio me acompanha confuso.

— Você pode viver como quiser, Amanda. Isso é só um papel.

— Não, Antônio. Não posso porque você tem para quem deixar tudo sim. - encaro ele e sinto as lágrimas pingarem, minha voz falha e levo a mão a barriga. Vejo os olhos dele seguirem o meu movimento. - eu estou grávida.

≈Antônio•

A sensação de ser ressuscitado com choque elétrico depois de uma parada cardíaca deve ser a mesma que eu senti ao ouvir essas três palavras. EU. ESTOU. GRÁVIDA. Minha mente girou e eu esqueci como se respirava por alguns segundos. Isso, definitivamente, havia virado um sonho distante desde que eu descobri o câncer.

— Fala alguma coisa! - Amanda pedia esfregando as mãos.

Sinto meus olhos lacrimejarem.  Minha boca fica seca e eu sinto meu coração bater tão forte que tenho certeza que meu peito está pulando.

— Você está grávida? - lágrimas involuntárias escorrem pelo meu rosto.

— Sim - Amanda chora.

Puxo ela para um abraço.

— Você está grávida. - repito em choque - você está grávida.

Afasto ela.

— É sério? - ela chorava mas o sorriso estava nos lábios dela de uma forma que beirava ao alívio, ela faz que sim com a cabeça e me ajoelho puxando ela para perto. Beijo a barriga dela e sinto meu corpo ter espasmos devido às lágrimas. — Oi, minha coelhinha.
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🐰🤍

Eu preciso mto saber o que vcs acharam, isso foi um turbilhão de sensações tão grande quando eu escrevia.

Me contemmmm!

Ps: preciso fazer um agradecimento especial a cada pessoa que tem compartilhado as próprias histórias comigo, isso tem me emocionado tanto, obrigada mesmo de coração 🤍

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