2. Amira

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Rodar os corredores não estava sendo divertido.

Ela não esteve sozinha nem por um segundo, desde que tudo aconteceu. Sempre tinha um guarda ou mais a sua volta até ela chegar à Academia, depois a Diretora ou Cassiopeia. Sempre alguém para quem manter o personagem, sempre uma desculpa para não pensar em nada além do presente. Mas agora que o perigo iminente tinha passado, o passado a atingia com força total.

Seus pais tinham rodado por aquele mesmo labirinto de corredores. Provavelmente não tinha sido um labirinto para eles, que deveriam conhecer cada esquina, cada coluna. Ela nunca perguntou, e agora, nunca iria saber. Seus pais nunca gostaram de falar muito da vida deles na Academia, de qualquer jeito. Se ela estivesse com eles, ela provavelmente ainda não saberia.

Ela estava começando a entender o porquê eles não falavam sobre a vida antiga deles. O ambiente não parecia ser muito construtivo. Ao chegar na diretoria, ela foi dada uma lista de regras tão grande que, se anotada, deveria ser do tamanho do intestino desenrolado de um adolescente, e eles não pareciam muito abertos a exceções.

Pelo menos as pessoas pareciam não muito felizes com isso também. Quando ela tentou impressionar sua nova colega de quarto citando as regras que ela já tinha decorado, a garota revirou os olhos, o que ela sabia que era ruim porque alguém sempre fazia isso nos livros que ela lia quando alguém era irritante. Mas não importava que a primeira pessoa que ela conheceu da sua idade fora da Academia parecia não gostar dela. Não era como Amira quisesse ficar ali para fazer pulseirinhas da amizade. Ela estaria longe daquele lugar assim que a oportunidade de sair surgisse.

Parte dela temia que ela não teria nenhuma oportunidade. Seu plano inicial era apenas sair pela porta da frente quando ninguém estivesse olhando, mas, como a diretora tinha explicado em sua sala, sempre teria alguém olhando. Os alunos eram proibidos de sair da Academia até o fim de seu treinamento, para que não "criassem laços que causassem algum tipo de parcialidade em seus futuros trabalhos como nobres". Para Amira, não conhecer o próprio povo parecia a receita perfeita para um reinado ruim, mas ela tinha lido diversas histórias sobre princesas trancadas em torres que eram amadas por nações, então ela poderia estar errada.

O ponto era: ela estava presa naquele lugar. Não ela soubesse para onde ir, se ela conseguisse sair. Amira sabia que estava na hora de montar um plano melhor do que "deixar a vida a levar", mas nada vinha a sua mente. Ela poderia vagar pela cidade em busca da base da Lança de Apollo, pelo pouco que ela lembrava de quando ela era criança, para conseguir refúgio, mas e depois? A Academia podia ir procurar ela, e além de colocar o grupo em risco, ela só teria trocado sua casa e a Academia por uma nova prisão domiciliar, vivendo sem existir, sem deixar nenhuma marca no mundo. Sem ter algum impacto além de causar a morte de todos que se importavam com ela.

Amira não queria pensar naquilo no momento, estava cansada. Rodar os corredores não estava a levando para lugar nenhum, então ela se sentou no chão por um tempinho, se apoiando em uma das portas. Ela sentiu seus olhos arderem e sua visão embasar.

A porta atrás dela foi escancarada, fazendo ela quase cair deitada.

— Você não tem mais nada para fazer não? - uma voz masculina perguntou atrás dela.

Amira olhou para trás. A mistura de surpresa e indignação impediu que as lágrimas em seu olho caíssem.

— Perdão?

— Eu perguntei se você não tinha nada melhor para fazer do vir aqui encher meu saco.

O dono da voz era um garoto com cabelo preto, e olhos cinzas. Ele parecia mais velho, mas Amira sabia que aquilo era impossível porque ela estava no último ano e os anos eram separados por idade.

Sangue e SeivaOnde histórias criam vida. Descubra agora