Seja minha Saudade

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Era quarta e a chuva ficou mais pesada do lado de fora da livraria.

Aziraphale suspira tentando se concentrar no seu trabalho.

Ele já sabia o que ia acontecer.

- Oh que drama. - O anjo sussurra. Era preciso sempre a mesma ladainha toda quarta?

A porta abre quando os trompetes cantam.

O sol abre nas costas gloriosas do arcanjo mostrando que ele era a solução de tudo.

- Aziraphale. - Ele fala animado indo até o anjo. Ele estava como sempre na escrivaninha.
O arcanjo se aproxima para ver o que ele estava fazendo.

- Sinto não ter vindo na semana passada, mas tenho que admitir que está ficando muito mal criado nesses últimos meses.

- Hn. - Aziraphale suspira e em seguida responde. - Entendo.

- Entende mesmo? Não parece muito arrependido. - O anjo só continuava escrevendo.

- Eu estou. - Era uma resposta vaga e obviamente mentirosa, depois de alguns anos Aziraphale aprendeu a mentir com frequência.

- Fico feliz que tenha se arrependido então. - O arcanjo diz satisfeito o encarando com os olhos violetas. Ele para percebendo algo. - Espere um pouco. - Ele agarra o braço direito do Aziraphale fazendo sua mão levantar. - Essa não é a caneta que te dei.





- Oh. Sim. - O anjo fica um pouco desconcertado. - Eu não percebi. - Ele estava usando uma caneta normal básica em vez da dourada brilhante na mesa.

- Use a que eu te dei, Aziraphale.
- É tão importante assim? É só uma caneta.


O arcanjo olha indignado para o anjo.
- Quer saber Aziraphale? Nesses últimos meses você não está se comportando como... um bom anjo.
Ele toca no ombro esquerdo do anjo fazendo ele latejar. Ele larga a caneta e faz ela cair no chão.

- Não fica feliz e grato da dor passar quando estou te purificando com minha presença?
Lateja.

A dor não passava mais com a presença de Gabriel.

Mas era algo que o anjo não disse.

- Seja grato por eu ainda ter paciência com você. - Ele larga o saco de papel que trouxe na mesa - Trouxe até isso esperando seu mal-humor parar. Agora eu que estou de mau-humor. Feliz?

O arcanjo sai da livraria furioso.

Ele tinha comprado comida na loja dos humanos porque o Aziraphale parecia gostar dessas porcarias.


"É só uma caneta"

Ele lembra da última vez que pegou a pena do Crowley e o anjo sorria nervoso tentando pegar de volta.

- É ... É apenas uma caneta. - O anjo colocava as mãos perto da barriga mexendo nervosamente como se tivesse medo daquela pena quebrar ou algo assim. O Gabriel nos seus olhos era como uma criança mexendo com um cristal precioso. - Apenas o deixe onde estava... ou, me dê? Não quer segurar algo de um demônio certo? Deixe que eu me livre disso. Sim?

- Se é só uma caneta. - O arcanjo estalou o dedo e deu sua caneta favorita para o anjo. Uma que ele raramente usava, justamente por não preencher muita papelada, esse trabalho era do Miguel. - É uma caneta celestial. Use ela.

- Oh. - O anjo pega a caneta e fica nervoso ainda olhando a pena na mão do arcanjo.

- Essa daqui, deixe que me livro ... você não disse que ia esquecer daquele demônio? Melhor me livrar dela para você..



O seu tom de "é só uma caneta" de antes para agora irritou mais o Gabriel.



O anjo suspira e volta a trabalhar.

Mas fica curioso e abre o saco de papel.

No saco tinha um pacote com sementes de girassol. Na embalagem estava escrito "Comida de passarinho".


- Deus.







Algumas horas se passaram e o anjo ficou um tempo batendo o papel em branco com a caneta.

Ele olha ansioso para a porta que dava para os fundos da livraria.

O tempo parecia passar mais devagar e ele estava inquieto.

Ele olha de novo para a porta como se algo fosse mudar.

Então ele se levanta ajeitando o seu colete. Como se tivesse com pressa ele vai novamente para o fundo da livraria pela sexta vez hoje.

O cofre ainda estava fechado e tudo estava no lugar.



Aziraphale ficava se amaldiçoando por ter pego os livros.

Ele abre o cofre e vê que dentro tinha dois livros um do lado do outro, um dourado e outro preto.

Ele pega os dois e analisa melhor agora com mais calma.

Nada de sagrado ou maligno saia deles. Pareciam ser livros comuns.


Ele senta em uma cadeira velha que tinha no quarto.


Olhando melhor eles pareciam livros opostos.

O livro dourado tinha o título branco. e o Livro preto tinha o título em amarelo.

Ele vira a capa vendo a contra capa é só dava para ver novamente o mesmo relevo da capa.

Ele larga o livro dele em uma mesa pequena que tinha ao lado e acariciva a silhueta de Crowley em seu livro.

Seus óculos não permitia ver se estava com os olhos fechados que nem a do Aziraphale.


Por que ele estava tão enfeitiçado? Era só um desenho.


Ele analisava e analisava e não encontrava nenhum vestígio de magia e nenhum sentimento bom ou ruim saído do livro.



Mas certamente era um livro mágico, as páginas pareciam poucas pela grossura, mas quando ele folheou as folhas sem ver o conteúdo, notou que não tinha fim.

As folhas infinitas passavam pelos seus dedos e não paravam.

Ele fecha o livro.

Faz sentido. Aziraphale e Crowley já existiam a milênios.


Ele abre novamente e vê que no topo de cada folha tinha as datas do ocorrido e cada dia parecia ter uma média de 10 folhas. Era realmente a vida dos dois em cada detalhe junto com seus pensamentos.

Pensamentos que nunca foram ditos.



Pensamentos do Crowley.

Ele olha para o livro admirado.

É o pensamento de Crowley neste livro.

Cada um dos seus pensamentos.


Ele ia mentir se falasse que não sentia curiosidade

Ele estava se devorando de curiosidade.

Queria muito ler.


- Talvez só uma espiadinha?

Ele abre uma folha aleatória ficando muito ansioso.

Assim que abre ele encontra "Aziraphale" como o primeiro nome que vê por alto.

Ele fecha rapidamente o livro sentindo sua nuca queimar.


- Certo. Aqui não é seguro. Definitivamente, não é seguro.

Ele se levanta pegando os dois livros.









Saindo do taxi ele anda em direção a um condomínio de luxo.


Saindo do elevador ele olha a porta cinza que lembrava uma pedra.

Ele estava mesmo naquele apartamento de novo.

Ele entra sem pedir permissão.


O apartamento do Crowley continuava igual. Nada mudou. Com exceção de móveis novos de madeira.

Aziraphale ficou indo para o apartamento do Crowley quase que todo dia depois do ocorrido, na esperança dele voltar.

Com tédio se não ter nada ao redor ele mesmo decidiu decorar.

Colocou móveis que eram bem mais a cara dele do que a do demônio.

Ele se senta no sofá suspirando.

Ele também lembra que dentro daquele apartamento não sentia dor, mas com o tempo, depois que a presença do Crowley desapareceu isso também mudou.

Ele toca no ombro olhando para a bolsa que carregava.

Também era um refúgio para fugir do Gabriel que não conhecia o lugar e ao que parece ninguém além dele conhecia. Nem mesmo os demônios.

Aqui é um lugar seguro.


Ele tira os livros da bolsa e faz os dois flutuarem na sua frente.


- Intrigante...

Ele pega o livro do Crowley como se estivesse mais atraído a ele do que o seu próprio.



Ele faz um gesto com a mão e faz o seu livro pulsar em uma mesa um pouco longe dele.



- Bom... Seria interessante saber o que ele fez... nesses últimos 200 anos?


"É só uma pequena olhada"

Aziraphale se consolava.

Ele abre o livro próximo ao final e procura os últimos 200 anos.



3 anos depois do seu ultimo encontro.

"Seus olhos latejavam de dor quando a fumaça de areia subia. Seus olhos sempre eram sensíveis, principalmente pelas manhãs a guerra estava começando a cansar. O ruivo bocejava enquanto limpava os seus óculos. "Eu não devia ter comido aquele pão com licor" ele pensava dizendo ficar sonolento.
- Talvez possa fazer uma toca e me enfiar lá dentro.... - Ele olha na direção leste. Nas margens do rio tinha uma paisagem aberta e dava para ver um castelo de pedras estilo medieval de longe.

O anjo estava lá.

Ele perguntou se o anjo estava o odiando agora. Talvez seja por isso que nesses dias se sinta "doente". Sua alma latejava o deixando alerta. Era como se estivesse com raiva ou magoado.
Apenas a saudade de novo - ele pensou decidindo não ficar ansioso.
"Eu vou" Ele lembra do Aziraphale o confirmando que o odiaria-"

Aziraphale para de ler.





Ele passa mais alguns anos.


76 anos se passaram.



"A carruagem fazia o líquido em sua taça tremer, ele se equilibrava para não deixar nem uma gota cair.
- Foi assim que eu matei ele. - O humano bêbado continuava tagarelando com seu amigo na carruagem. - Eu falei "Meu pai, acaso não fizestes o mesmo?" E ele ficou mudo. - Todos na carruagem riam e o demônio olhava de canto voltando a beber.
O humano parecia orgulhoso de sair do armário sabendo que o seu pai o invejava por não ter feito o mesmo.
O demônio Crowley estava a trabalho em uma missão trivial de uma simples confissão para o pai. Ele não se importou, mesmo o trabalho sendo inútil. Para ele quando menos trabalhos tendo sangue e tendo mais bebidas melhor"

O anjo relaxou no sofá e sorriu. Ele decidiu continuar aquela leitura.


"Depois de muitas bebedeiras e falação, o demônio saiu meio que cambaleando para o lugar que estava abrigado nas últimas semanas.
- Senhor! Lord Senhor! - Um garotinho de ria ficava animado em vez o demonio. - Lord Senhor. Por acaso irás ficar encarando a caixa amarela hoje também?
- Não tem mais nada para fazer? e Já falei que não faz sentido me chamar de "Lord Senhor" é como chamar uma pessoa pelo nome duas vezes... - O demônio bufa continua andando. O demônio não dava medo em crianças, na verdade sua aura ficava em guarda baixa quando elas chegavam perto, mesmo sem ele perceber.
- Lord Senhor, não fique desanimado, Lord Senhor! Eu sou muito agradecido pela comida que me dá! - O demônio empurra a testa do pequeno ladrão de rua fazendo ele rir,
- Para de me amolar. - O demônio tira alguns pacotes de balas que gostava de chupar no bolso e dá para o garoto - Espero que seus dentes caiam. - O ladrão de rua pega e dá meia volta correndo animado.

Crowley olha para trás vendo duas crianças atrás dele pulando de alegria e correndo junto.

O demônio da um sorriso discreto vendo a cena"




- Oh Crowley, querido...




"O demônio olha para o outro lado da rua vendo uma caixa amarela escrita "Correio".

Ele dá meia volta virando a rua subindo para o fundo de um bordel onde estava instalado.
Ao voltar para o seu quarto apertado ele tira as roupas elegantes ficando apenas com uma calça meio justa preta e uma camiseta larga igualmente preta aberta nos peitos. Meio zonzo ele se senta na poltrona do lado da janela.

O demônio sentia um latejar seu corpo todo. Não sentia sono mesmo que estivesse muito cansado.

Ele olhou para a mesinha redonda ao seu lado que tinha uma linda garrafa de conhaque e um envelope de carta velho.

Bêbado ele pega o envelope e dá uma olhada.

Era uma carta que nunca seria entregue.
Ele lembra de ter ficado semanas pensando no que escrever.

Mas o que escrever?
Pedir desculpa por demorar, implorar para o anjo não o odiar, nada tinha sentido.
Era tudo o que o anjo, Aziraphale, já sabia.

Então na carta gasta pelos anos só tinha uma pequena frase
"Sinto sua falta"

Ele coloca o envelope sem abrir na mesa e pega o conhaque no lugar. Já devia ter jogado aquilo fora há muitos anos, mas não gostaria de jogar algo endereçado ao anjo fora.

Crowley sentia sua falta em todos os sentidos.


Ele se sentiu mais relaxado quando pensava em Aziraphale e isso fazia os latejos pararem.
Sentiu falta de sua voz. Seus sermões suaves.
Sentiu falta do seu olhar.
Seu olhar de desejo era uns dos seus favoritos.

O demônio suspira passando a mão no peitoral revelando um pouco mais do seu peito abaixo do seu decote no tecido fino. Ele tomou um gole grande do conhaque virando a garrafa na boca, algumas gotas caiam em sua garganta enquanto sua mão livre descia vagamente por sua barriga até encontrar o seu volume"

Aziraphale fecha o livro de novo se sentindo sem ar.

Ele fez mesmo o que penso que fez? - Aziraphale fala em um sussurro.

Era mentira falar que o anjo nunca pensou em fazer isso, mas ver que o demônio já o fez o deixava estranho.



- S-Se isso estava no livro, significava que tudo o que fizemos estava também?

Era meio óbvio, mas o anjo aéreo ficou olhando o livro fechado com um olhar pasmo.




Depois de um tempo pensando, ele decide procurar uma data específica.


55 D.C

Roma

"Aziraphale parecia lindo com sua túnica branca deitada na cama. Atrás dele, o demônio continuou o acariciando enquanto o abraçava por trás. Ele beijava o seu pescoço o fazendo gemer.

Crowley gostava muito das reações do anjo, tudo nele era lindo e adorável.

- Podemos nos beijar agora? Sim? Por favor, Crawley - Aziraphale pedia virando o pescoço. O demônio aproveita e morde o seu pescoço como punição por errar seu nome de novo - Ahn oh ah Crowley. Crowley, por favor.

- Nos beijar? Nossa despedida será apenas no final do torneio... - Crowley queria muito beijar o anjo, mas ambos tinham uma regra que tentavam não ultrapassar.

Cada vez que Crowley encontra o Aziraphale fica mais difícil manter sua mão longe dele.

Esse impulso demoníaco fez eles saírem da arquibancada e se esconderem no quarto do demônio. Era só para ser uma noite de queijos e uvas com muitas bebidas, mas se tornou algo a mais.
Não que o demônio se importe, ele sempre teve segundas intenções.

O anjo parecia não aguentar mais quando se virou e abraçou o demônio começando pela primeira vez a beijar o pescoço do demônio.

Crowley ficou surpreso quando o anjo levantou a sua túnica preta e entrelaçou suas pernas em um abraço e mais surpreso ainda enquanto sua fofa mão tocava o seu quadril"



Todos esses anos o anjo queria saber o que o demônio pensou daquele ato impulsivo... qual foram seus pensamentos.

Então sem perceber o volume o machucando nas calças ele continuou a ler.






" Crowley fechou os olhos sentindo que enlouqueceria.

- O que está fazendo? - O demônio segurava o macio cabelo do anjo enquanto suspirava em pequenos gemidos. - Você é um anjo... não devia fazer essas coisas.

O demônio estava extremamente feliz por ser correspondido fisicamente por seu inocente anjo.

Não se aguentando mais ele puxa o cabelo do anjo com força e o beija

O anjo que não o decepcionava o corresponde esfregando sua língua na dele

Crowley começou a tirar a túnica do anjo tirando o medalhão no seu ombro fazendo o pano fino cair. Os seus peitos lisos fofos eram adoráveis.

Foi a primeira vez que o viu.

- Foi mal, anjo - O demônio pede sinceramente. - Eu não pretendo fazer nada... apenas quero te tocar mais de perto.
- Me toque, me toque, Crowley. - O anjo suspira quando o rosto do Crowley descia até o seu peito.
Eles culparam a bebida por suas irresponsabilidades"




Ele lembra daquele dia, foi a primeira vez que saíram do beijo de despedida para apertos e carícias sem fim durante horas. Eles nunca fizeram o ato, mas sentir o corpo um do outro era muito, muito bom.

O anjo fecha o livro colocando a mão no rosto sentindo vergonha dele mesmo.

Algo tão íntimo, e ele viu de uma forma descarada.


Ele coloca o livro do sofá e toca o seu volume apertado.

Ele queria muito ver o anjo caído de novo.


Por um momento, quando lia sobre sua vida, sua dor passou. A dor foi substituída pelo prazer e saudades.

- Eu quero te ver, querido.


Good Omens - Obcecado por vocêOnde histórias criam vida. Descubra agora