Capítulo 1: O andarilho

65 12 2
                                    

O calor do meio dia, inundava as ruelas, fazendo o suor escorrer na nuca dos transeuntes. Todos, cabisbaixos encaravam seus pés ou o solo, sem ousar para os lados, mesmo na possibilidade de esbarrar em alguém. Suas vozes eram contidas em murmúrios, tons baixos que eram decorrentes do medo que tinham.

Uma mulher carregando seus filhos, um de colo e outro de 5 anos, esbarrou em um homem, que fez a criança menor chorar. Temendo sua vida, ela correu com as duas crianças, entrando em um abandonado beco. O cheiro de lixo e os letreiros destruídos, logo disseram que aquele lugar não era adequado para crianças. As mulheres de riso fácil e poucas roupas, também deixaram isso a entender.

Ela se agachou e consolou os filhos, que por medo não conseguiam parar de chorar. Fez todo o possível, mas infelizmente foi achada.

Os passos lentos logo chegaram às suas costas. Aquele andar acompanhado do som das botinas de couro que gemiam fez seu corpo em um ato reflexo, colocar os filhos protegidos. E quando se virou, suas suspeitas estavam certas: era um oficial.

Usava aquele uniforme azul engomado, com tiras vermelhas e douradas. Tinha na cabeça um ridículo chapéu com uma enorme plumagem vermelha. Seu rosto era comum, porém o olhar era marcado pelas pupilas cor rubra, que indicavam sua origem: era um descendente de dragão.

— Então mulher, porque correu assim que viu os oficiais? — Perguntou o homem com tom irritado.

— Ah, eu, eu...

Nervosa, apenas conseguia gaguejar. E nisso, um terceiro, que trajava um longo hábito azul escuro, com um símbolo em dourado no meio, se aproximou.

— Certamente é uma bruxa! Mulher alguma que serve nosso Deus Oroboros devia se comportar assim! — Falou aquele que usava o hábito.

— Ora, ora, se não é nosso queridíssimo clérigo! Não pensei que veria o senhor por aqui.

O cheiro de incenso invadiu o espaço, e fez todos daquele beco se esconderem. Os mendigos sujos entraram em suas caixas, as mulheres de vida fácil entraram em suas instalações, e os homens bêbados as seguiram. Tudo ficou deserto.

— Meu Senhor, não é isso... eu só não quis atrapalhar seu caminho. — Finalmente respondeu a mulher, se prostrando no chão e fazendo os filhos repetirem o gesto.

O clérigo e o oficial, analisaram a mulher de cima a baixo, e depois soltaram um riso baixo. Suas expressões causaram um arrepio nela, que procurando sair da situação, se levantou, fez outra reverẽncia, e passou ao lado deles. Contudo, o beco era estreito demais, e ao fazer isso, o oficial a segurou pelo pulso.

— Tsc, tsc, tsc, não é bem assim que as coisas acontecem aqui senhora.

— Por favor, me deixe ir! Tenho pago todos os impostos! Sou justa.

— Mas não é disso que se trata.

Então o oficial empurrou as crianças para longe, que logo caíram no chão e começaram a gritar por terem ralado os joelhos e mãos.

— Meus filhos! Socorro! Alguém me ajude!

Ela começou a gritar por ajuda, porém, aquilo era inútil, pois ninguém ali tinha coragem de se impor contra um oficial. Naquela vila, longe dos grandes feudos e monarquias centrais, os oficiais, que eram trabalhadores mandados pelo Imperador Eru, tinham se tornado algozes. O temor corria solto junto com exorbitantes taxas sobre os humanos.

Utilizando a raiva do passado de guerras com os humanos, os oficiais abusavam de seu poder, e muitas vezes, saíam impunes devido ao apoio dos clérigos. Assim ficava fácil, pois se uma mulher sumia, os clérigos afirmavam que ela era bruxa, se um homem era executado, era porque estava fazendo trabalhos para outros deuses. E assim, o terror se espalhou naquela vila.

A princesa e o dragão - A última guerra - Terceiro LivroOnde histórias criam vida. Descubra agora