A imagem manchada diante de seus olhos, parecia não ter sentido algum. Do branco brotava o vermelho, que ia para o marrom e depois para a escuridão. A face até a pouco viçosa, torna-se mais e mais pálida, os lábios secos, e olhos para sempre fechados. Segurou aquilo que uma vez foi uma pessoa, por algum tempo, antes que fosse compreensível o que acabara de fazer.
Inerte em seu colo, sua amiga.
"É minha culpa... eu a matei..." Dor semelhante àquela provocada pela adaga espalhou-se em seu peito, mas era dor sem causa aparente. Um grito distante rasgou o espaço, e ela percebeu que o grito saia de si mesma, do mais profundo de suas entranhas. Era ela que gritava.
Abraçou forte o corpo, querendo por um instante que aquela mesma adaga entrasse em si, apagando tudo, todas as possibilidades de continuar em frente admitindo o que tinha feito. Mas isso apenas a fez molhar-se no sangue. O líquido embrenhou-se nela, em seu rosto, em seu corpo, fundindo-se com a dor da culpa em sua alma.
— Se eu não tivesse matado ela... se eu tivesse ficado mais com ela...
Sentiu uma mão segurando seu ombro. Por afundar-se em dor, não percebeu que alguém se aproximava. Seu pensamento paralisou enquanto uma lágrima escorreu pela bochecha misturando-se com o sangue espalhado em seu rosto.
— Aurora? — Uma voz conhecida chamava.
Olhou para trás e encontrou quem menos esperava.
— Lise? — Piscou os olhos que não acreditavam na imagem que via ali. — Lise, é você?
Agachada, e um tanto receosa, estava ela, aquela mulher de cabelos ruivos que minutos antes havia caído em um precipício. Segurava as duas mãos no colo, apertando os dedos nervosamente Estes se desenrolaram e foram até a face da jovem em um leve carinho. Estavam vermelhos por terem sido apertados de forma rigorosa, e indicavam que a mulher estava ali a algum tempo, observando Aurora.
Os lábios dela tremeram antes que pudessem se abrir para o que queriam dizer.
— ... filha?
A palavra ecoou na escuridão parecendo soar mais imponente e certa do que qualquer outra palavra. Aurora permaneceu imóvel sentindo que se caso se movesse, acabaria com aquela cena, fazendo Lise voltar a esquecer-se de tudo.
Porém, novamente ela disse.
— Aurora, minha filha...
A jovem largou o corpo da ninfa com cuidado e levantou-se.
— Não, não, NÃO!. Não olhe para mim agora! — Gritou afastando-se.
Colocou os braços em sua face, cruzados como criança que se esconde, mas foi inútil, pois queria ser pega, e assim, logo Lise a abraçou.
— Minha filha... como pude me esquecer de você... — O tom de voz era o mesmo que a mulher tinha antigamente, quando a garota ainda era criança.
— Não olhe para mim agora.... não agora.
Sua mão voltou a buscar o rosto da jovem que encarava o chão enquanto se desfazia em lágrimas.
— Minha menina, porque diz isso?
O soluço forte atrapalhava a fala, que saiu com uma voz infantil, quase irreconhecível.
— Eu sou horrível mãe... eu matei ela. — Apontou o corpo sem vida estirado no chão.
Novamente voltou a chorar, e escorregou até o chão, desmoronando tal qual uma grande construção que sofreu um ataque. Braços a acolheram e a colocaram perto daquele peito que sempre a acolhia em suas memórias.
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A princesa e o dragão - A última guerra - Terceiro Livro
Historical FictionApós ter encontrado e resgatado sua mãe, Aurora, agora buscando o remédio capaz de ajudar Perseu, descobre desafios criados pelo novo governo draconiano. Agora ela vai descobrir que para unir sua família, ela precisará não só encontrar paz, como tam...