Capítulo XIII: Ordens

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Lucian estava entediado.

Estava deitado em sua cama, suas mãos estavam cansadas por segurar o livro pesado de capa de couro, que cheirava a poeira e umidade, como a maioria dos livros na biblioteca do Castelo de Prata, mas não conseguia encontrar outra posição confortável na situação que se encontrava no momento — com bandagens desconfortáveis nas costas, as feridas dolorosas ainda ardiam como fogo e, para seu azar, coçavam incessante e irritantemente, mas ele não podia tocar aquela região em hipótese alguma, o que apenas o deixava ainda mais irritado.

Estar ferido estava, acima de qualquer coisa, se mostrando um grande inconveniente.

O soldado não se arrependia do que fez, de forma nenhuma, não se arrependia de ter se colocado na frente daquele garotinho, não se arrependia do sangue que derramou, conseguia lidar com a dor, era a coceira que estava o deixando maluco, prestes a arrancar todas aquelas faixas ásperas do corpo e coçar as costas com a ponta de uma flecha.

Racionalmente, ele sabia que o pior tinha passado, os dias após o acontecimento foram os piores, seus ferimentos infeccionaram e Lucian passou dois dias desmaiando e acordando em um estado febril, incapaz de diferenciar sonho de realidade, como se assistisse o mundo por um reflexo em águas turvas.

Quando a febre abaixou, ainda ficou mais um dia completamente incapaz de se mover, derrotado pela mais pura exaustão enquanto seu corpo lutava contra os lanhos em suas costas, não estava mais alucinando, mas a dor de cabeça que o tomou o impossibilitava de abrir os olhos, a simples chama de uma vela era o suficiente para cegá-lo, tamanha a sensibilidade de seus olhos.

Apenas no quarto dia Lucian acordou totalmente consciente, neste dia ele se isolou na cama por vontade própria, sendo esmagado pelo peso opressivo de todas as coisas que tinham acontecido naqueles últimos dias, coisas que ele não teve tempo o suficiente para refletir sobre, considerando que se colocou quase que em coma na primeira oportunidade que teve de fugir de uma discussão — pessoas mais sábias usariam álcool, talvez fosse um método menos autodestrutivo.

A mãe o visitou todos os dias, e todos os dias, eu seu estado febril, Luca ficou feliz em tê-la por perto, feliz por não estar sozinho naquele momento, mas, ao acordar são pela primeira vez em dias, não ficou muito animado quando o rosto aliviado e sorridente de Maia surgiu diante dele.

Vê-la encheu o rapaz de emoções conflitantes, em partes estava feliz por não estar sozinho. estava feliz ao ver a mãe tão aliviada, mas a conversa entre eles ainda estava fresca em sua memória, ele se lembrava da facilidade com a qual ela mentiu em seu rosto, como desviou o assunto, como, mesmo diante de um confronto, Maia parecia incapaz de dizer a verdade.

Outra pessoa que não deixava sua mente em paz era Augustus, Luca sabia que o príncipe havia o visitado mais de uma vez durante sua onda de sonolência, mas os fragmentos de memórias que surgiam de tempos em tempos, pedaços de conversa, o olhar entristecido de Augustus, pareciam ilusões tiradas de um sonho – e o jovem soldado não saberia dizer se esse era um pensamento reconfortante ou deprimente.

No quinto dia, Luca acordou realmente bem, ciente de que ficaria maluco se tentasse dissecar cada interação que teve nos últimos dias, especialmente por não conseguir diferenciar o que era real e o que era falso, por isso decidiu, pelo menos por enquanto, deixar de lado todos os sentimentos pavorosos que o tomavam.

Foi Hanna quem explicou que o rei havia partido na noite do incidente para uma visita na Ilha Emi e ainda não havia retornado, por isso Augustus havia tomado todas as responsabilidades do pai agindo como Príncipe Regente e, embora tenha tirado alguns minutos de seus dias para visitá-los durante a febre, suas obrigações o forçaram a ficar acordado até tarde na noite anterior e, com o acúmulo de compromissos, ele provavelmente não apareceria pelos próximos dias.

Amisterium: O Herdeiro LegítimoOnde histórias criam vida. Descubra agora