Capítulo V: O Baile do Sol

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Larissa respirou fundo, porém não tanto quanto gostaria, pois o espartilho apertava sua cintura, estava coberta em um longo vestido azul cuja cauda era tão grande que a garota teria que passar a noite toda cuidando para que ninguém pisasse e a derrubasse.

Olhando-se no espelho, o esforço quase valia a pena: seu longo cabelo castanho estava preso em um penteado de tranças que formavam uma coroa decorada com flores em sua cabeça, o tecido azul destacava seus olhos escuros, e com todas as joias que usava como ornamento, Larissa se sentia mais parecida com a mãe que nunca.

Cordélia, que a observava com um brilho orgulhoso no olhar, abriu um enorme sorriso.

— Você será a mulher mais bonita neste castelo. — ela disse e Larissa ergueu uma sobrancelha, virando-se para encarar a irmã mais velha em seu vestido que parecia prata derretida, com seus olhos azuis encantadores, lábios cheios e curvas.

Larissa sabia muito bem que a palavra "princesa" era usada entre o povo como uma descrição de beleza inalcançável – enquanto as mulheres nas aldeias exibiam mãos ásperas, braços e pernas musculosos por conta do trabalho braçal, princesas e mulheres da nobreza eram tinham pele delicada protegida dos ataques do sol, mãos macias, cheias de curvas por viver em abundância.

Porém, a princesa mais jovem não era assim, suas mãos eram rachadas, seus braços tinham músculos pelo esforço que fazia longe dos olhos do pai, não tinha curvas, nem pele delicada, nunca seria tão bela como Cordélia, e por mais que a irmã lhe afirmasse com frequência que era uma mulher linda, Larissa se questionava se um dia acreditaria.

Naquela noite ela se sentia linda mesmo assim, ainda estava animada pelo baú no canto do quarto, mas havia prometido para Cordélia que se preocuparia com isso mais tarde e Larissa nunca quebrava uma promessa.

— Posso ser a mulher mais bonita neste castelo, mas com certeza não serei a que se alimentará melhor. Pode afrouxar o espartilho só um pouquinho?

A irmã deu uma gargalhada.

— Deveria ter dito isso antes de terem te enfiado em camadas e mais camadas de tecidos, não temos tanto tempo. Mais tarde, depois da primeira dança, te ajudo a se vestir e resolvemos isso, tudo bem?

Larissa bufou, soltando o peso dos ombros, apenas para receber dois toques delicados de Cordélia no braço – Déli sempre fora melhor que Larissa nessa coisa toda de princesa, às vezes Larissa se perguntava se não tinha nascido no lugar errado, porém amava o castelo, amava o reino, o povo e sua posição, e felizmente tinha Cordélia com seus toques delicados lhe dizendo o que fazer.

Duas batidinhas com a unha na mesa e Larissa notava que pegou o talher errado, dois toques no braço e sabia que precisava ajustar a postura, um toque na cintura significava que estava andando muito rápido, quase correndo, ou estava agitada demais.

Podiam ter crescido sem a mãe, e dezenas de tutoras não substituiriam isso, mas a presença calma de Cordélia era um conforto especial.

Augustus tinha muito mais delicadeza que Larissa, o que era curioso considerando que também era o melhor esgrimista de Amisterium e ótimo em combate corpo a corpo – às vezes Larissa brincava de lutinha com ele, faziam isso desde crianças, levou um tempo para Augustus aprender a controlar sua força, especialmente no período que saía da infância e era um estranho ao seu próprio corpo, e Larissa demorou para encontrar sua própria força, ela sabia que ainda hoje Augustus se segurava para não machucá-la, mas poderia apostar que não perderia dele com facilidade em uma luta real.

Como se invocado por sua memória, Augustus bateu na porta e Cordélia abriu alegremente, deixando-o entrar, ele parecia mais tenso e cauteloso que normalmente – o que já era muita coisa – e até a animação de Déli pareceu se acalmar e se adaptar ao irmão, mas ambos sorriam como se nada estivesse errado.

Amisterium: O Herdeiro LegítimoOnde histórias criam vida. Descubra agora