Amisterium: O Herdeiro Legítimo

Capítulo VIII: A Vida no Castelo

Luca acordou buscando desesperadamente por ar, todos seus sentidos gritavam com uma sensação de perigo, ele conseguia sentir as garras apertando sua garganta impedindo que o ar entrasse por mais que fizesse força para tentar encher seus pulmões.

Esse tipo de sensação não era frequente, mas também não era incomum, várias vezes se flagrava preso em sonhos estranhos e pressentimentos ruins durante a noite, embora nunca tivesse sentido algo tão forte quanto naquele momento.

Quando os pontos escuros que cobriam sua visão finalmente desapareceram, o rapaz se deu conta de que não estava em sua cama na Fortaleza de Pedra, e sim em uma cama ainda mais confortável em um enorme quarto que ele não conhecia e que tinha muito mais espaço que qualquer pessoa precisaria, um quarto que não pertencia a ele no Castelo de Prata.

Se a noite do baile parecia um sonho, o jantar da noite anterior era quase uma ilusão, completamente surreal, e, mesmo estando no lugar mais seguro de todo o reino, Luca não conseguia afastar a sensação de que estava em perigo - como a sensação sufocante de um pesadelo do qual não conseguia acordar.

A janela do quarto exibia o azul escuro do meio da noite, a lua não era mais que uma metade iluminada e as estrelas ainda pontilhavam o céu; Luca sabia que não dormira muito, e por mais que estivesse exausto, ele sentiu o sono esvair de seu corpo, deixando-o completamente inquieto.

Por um momento Luca pensou no que sua mãe diria ao saber que planejava sair durante a noite em um local praticamente desconhecido, porém imediatamente se lembrou que ela ainda tinha explicações a dar por sua hipocrisia e decidiu que não devia explicações a ela naquele momento - e provavelmente não deveria por um bom tempo.

Um calafrio percorreu seu corpo quando seus pés descalços tocaram o chão frio, a camisa branca que usava não fez muito para impedir que o frio infiltrasse seus ossos, mas Luca não tinha tempo para procurar roupas mais quentes naquele quarto sufocante que não pertencia a ele, e saiu, descendo a escadaria de pedra branca, seguindo na direção que acreditava ser o jardim considerando que a atmosfera do castelo era mais úmida naquela direção.

Luca gostava de andar pela grama quando precisava de conforto, ele sabia que o jardim não seria igual, mas teria de ser próximo o suficiente; seus pensamentos estavam perdidos na perspectiva de um pouco de ar puro quando vozes no fim do corredor chamaram sua atenção.

O rapaz sabia que, após a discussão séria com Augustus, não estava em um bom lugar com a família Real de Amisterium - o que antes não faria tanta diferença, mas considerando que sua mãe ia se casar com o rei, ele deveria começar a se preocupar -, sabia que era um intruso no castelo e com certeza não era o favorito de Arnold, mesmo assim não hesitou em desacelerar seus passos a fim de fazer o mínimo possível de barulho e seguir o som da discussão até se aproximar das portas duplas de uma sala que parecia uma espécie de escritório.

Havia estantes cheias de livros e artefatos, um candelabro dourado,uma mesa de madeira entulhada de papéis, e uma cadeira alta que mais aprecia uma poltrona acolchoada com tons de marrom e azul, onde se encontrava o rei, sem sua coroa, sem as roupas luxuosas que exibiam o brasão de Amisterium, parecendo exausto sob a luz tremulante do candelabro, vestindo roupas simples, como alguém que tinha a intenção de dormir, mas não pôde.

À frente da mesa, em pé, exibindo uma postura que Luca conhecia bem o suficiente para reconhecer como tensão, e ainda usando as mesmas roupas que usava no jantar, estava Augustus, ouvindo as palavras do rei e pacientemente esperando por sua vez de falar.

- Sua visão é muito bonita,mas também é muito tola, principalmente para um Amisterium - o rei dizia em um tom surpreendentemente alto para alguém que não fazia o menor esforço para levantar a voz, mesmo de fora da sala Luca conseguia ouvi-lo com perfeição - Não seja ingênuo, Augustus, lembre-se de que estamos falando de Colin. Estive em combate com eles em mais de uma ocasião e ainda assim fui tolo de chamar um deles de amigo, e veja onde isto nos levou. Não se dá as costas a um Colin, meu filho. Um homem sábio dorme com os olhos abertos quando um Colin dorme sob seu teto.