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IZABEL

Ele estava parado diante de mim esperando uma resposta que eu já sabia qual seria, no entanto, por qual razão pareciam tão amargas? Tão difíceis de serem ditas?

-Eu ficarei ao seu lado, Leon. -Falei sem mesmo notar que tais palavras saíram de minha boca.

Leon sorriu de maneira genuína. Nunca presenciei uma expressão tão espontânea e legítima vinda dele. Mas eu não conseguia retribuir. Não conseguia sorrir ou até mesmo fingir transparecer uma alegria que naquele momento não existia em mim.

-Mas eu tenho duas condições... -Falei ao erguer os dedos e ele assentiu atento ao que eu falaria. -Primeiro, não quero continuar naquele hotel... Eles já sabem demais sobre mim, certamente pode haver retaliações ou coisas do gênero, não quer permanecer ali. -Suspirei. -Quero que Héstia fique ao meu lado, contrate ela, ofereça um salário melhor com todos os benefícios que ela pedir... Dê a ela alguma recompensa, pois se estou viva, devo isso principalmente a ela.

[...]

-Venho buscá-la amanhã. -Leon indagou ao ouvir a voz de Héstia.

-Certo. -Forcei um sorriso ao mirar minha atenção na direção da televisão.

-Me atrasei... -Héstia lamentou ao trazer consigo uma mala que com muito custo conseguiu colocá-la na poltrona de acompanhante. -Acho que trouxe tudo. -Falou enquanto mexia nas roupas.

-Ainda bem... -Suspirei. -Quero tomar um longo banho, por favor, chame a enfermeira para tirar essa porcaria do meu braço, Héstia. Por mim eu iria embora agora mesmo, já me sinto bem. -Bufei ao passar as mãos em minha face totalmente impaciente. -Leon virá nos buscar amanhã, certo?

-Tem um ditado que cresci ouvindo... Sabe qual? -Héstia mexeu em sua bolsa e retirou uma sacola transparente. -O diabo não barganha. -Ela suspirou. -Sua reserva no hotel já foi encerrada e algumas funcionárias já estavam arrumando seus pertences, ou seja, ele já tinha planos de levá-la para outro lugar antes mesmo de consultá-la, talvez queira protegê-la não só dos inimigos... Talvez queira mantê-la longe de... Você sabe de quem. -Ela me encarou por alguns segundos em silêncio.

Olhei para a sacola transparente que estava em meu colo e logo reconheci as roupas que vestia antes de chegar ali. Aquelas roupas rasgadas, sujas e marcadas com o sangue de desconhecidos.

-Jogue fora. -Falei ao desviar o olhar. Aquelas roupas rasgadas e sujas causavam-me repulsa e pesar.

Entre os objetos que peguei encontrei o colar que havia sido presente de Eros.

Pensei em jogá-lo fora juntamente com o restante dos pertences, mas não fui capaz de fazê-lo. Então apenas abri a mala e o coloquei no bolso lateral, apesar de não conseguir me desfazer dele, não queria voltar a usá-lo... Pelo menos não agora.

-Eu disse para não lavar o cabelo! -Héstia correu até mim assim que sai do banheiro. -Ainda mais nessas circunstâncias! -Indagou impaciente ao pegar uma toalha e envolvê-la em minha cabeça enquanto tentava secar meu cabelo. -Eu avisei que só poderia depois de quinze dias, Izabel! -Bateu levemente em meu ombro e eu franzir o cenho ao tomar certa distância dela.

-Quer deslocar meu outro braço? -Dissimulei ao apontar para a tipoia. -Meu cabelo estava sujo de sangue e suor, Héstia... O cheiro e a aparência estava me causando ânsia, além disso, não há mais nada aqui para manter seguro... -Desviei o olhar. -Já aconteceu o pior, certo? -Suspirei. -Enfim, será que poderia ir até a lanchonete e comprar algo decente para mim, por favor? Aquela água quente poderia ser qualquer coisa, mas tenho certeza de que não era chá! -Revirei os olhos. -Querem que eu me recupere rapidamente, mas me alimentam com uma água suja e três bolachas. É ridículo!

-Vou até a copa e pedirei para que preparem um mingau para você. -Héstia falou e saiu do quarto rapidamente parecendo prever minha reclamação.

Balancei minha cabeça negativamente e voltei para o banheiro enquanto tentava pentear meu cabelo usando minha mão esquerda para todas as minhas ações.

O espelho refletia que imagem de uma mulher que eu definitivamente não reconhecia. Não pelo fato de estar sem maquiagem e cabelo úmido, diante de mim estava uma figura apática, ferida e frágil.

Uma camisa larga branca e uma calça de flanela vermelha e os pés descalços deixava-me com o aspecto ainda pior.

Balancei minha cabeça negativamente tentando afastar os pensamentos ruins que me sabotavam.

Ao sair do banheiro tamanha foi minha surpresa ao encontrar Eros parado ao lado da porta segurando um arranjo de flores, especificamente de "copo de leite".

Sua cabeça baixa não fazia jus ao seu comportamento de sempre.

Quando enfim ergueu a cabeça e nos encaramos de maneira profunda, não houve nada além de um "silêncio ensurdecedor".

Aquele não era o Eros que eu conhecia.

Sua postura desnorteada e o olhar tão quebrado demonstrava o quão disperso estava.

Dei um forte e alto suspiro, em seguida caminhei até o leito onde minha mala estava e guardei os pertences que estava em minha mão ainda em silêncio.

Mesmo sem dizer esboçar som algum eu o sentia atrás de mim. Seu perfume e calor eram inigualáveis e eu os reconheceria em qualquer outro lugar.

-O que foi, Eros? -Questionei num tom baixo.

-Eu sinto muito, Izabel. -Eros estava exposto. -Minha raiva de Khaios não é maior do que a raiva que sinto de mim mesmo por não ter protegido você... -Ele tocou meu ombro e eu virei para encará-lo. -Eu não protegi você e nem a criança que... -Interrompi.

-Não diga mais nada! -Rosnei ao olhar para o arranjo em sua mão. -Talvez nem fosse sua. -Dei com os ombros. -Não dê tanta importância ao fato.

-Mas poderia ser meu. -Replicou de imediato.

-Sim, poderia ser seu. Mas você mesmo disse "poderia", no passado. Não existe mais... Um filho bastardo? Não. Não mesmo. -Sorri fraco.

-Não haveria bastardo nenhum, Izabel. -Dessa vez Eros parecia estar irritado. -Eu o assumiria. Eu assumiria vocês dois. -Falou com firmeza e novamente eu sorri. Mas não existia felicidade naquele sorriso ou bons sentimentos. -Eu sou um homem que honra seus compromissos, não me ofenda! -Esbravejou.

-É tão fácil falar o que faria ou não faria depois que tudo já aconteceu, não acha? Eros... -Bati em minha testa. -Você age como se tudo estivesse sob seu controle e como se devêssemos esperar seu comando para só então poder agir... Não vê? Só estou nesse país por conta do Leon. Leon trouxe-me para cá. -Bati em sua mão fazendo com que as flores caíssem no chão. -Se ele não tomasse essa atitude não estaríamos aqui, você certamente estaria transando com uma outra obsessão e nem se lembraria de mim... Minha vida continua, Eros. Não posso esperá-lo. -Meu peito arfava conforme aquelas palavras saíam da minha boca tamanha amargor que causavam.

-Eu não queria vê-la nessa situação, Izabel. Eu realmente não queria. -Proferiu ao tentar tocar meu rosto e eu recuei. -Eu... Eu me arrependo de não a ter trazido comigo, talvez agora você não agiria de maneira tão defensiva e também não trataria Leon com tanta devoção.

-Não meta Leon nisso!

-Você não precisa tentar salvá-lo, Izabel. Essa não é uma obrigação sua!

-Você não entende nada mesmo... -Fechei meus olhos e senti meu corpo ser abraçado por Eros, no entanto, não retribui ou fiz qualquer outra coisa além de permanecer imóvel.

-Desde muito cedo nunca tive chance de ser egoísta e pensar somente em mim... Tudo sempre girou em torno desse mundo que você conheceu. -Suas mãos tocaram meu cabelo em uma carícia e eu prendi minha respiração. -Mas quando estou com você esqueço da realidade... É como se só existisse nós dois e esse peso que carrego em minhas costas desaparece de imediato. Gosto de ser egoísta quando estou ao seu lado. Gosto de não pensar em nada além de nós dois. -Senti suas mãos quentes segurarem meu rosto firmemente entre elas e então abri meus olhos e encontrei aquele par de íris azuis me encarando atentamente parecendo ansiar por descobrir tudo o que se passava em minha mente naquele momento.

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