5 anos depois
Cascais
O tempo passou, eu já sou arquitecta. O Tomás também. Agora estamos os dois a trabalhar com o Diogo que se tornou um dos nossos melhores amigos.
Pensem num cota fixe ( velho legal).
A minha Matilde nasceu com saúde graças a Deus.
Quando fui fazer o registo dela tive que dar o nome do pai pois aqui desde 1977 ninguém é filho de pai ou mãe incógnito.
Não me importei, até gostei. Se estivesse lá no Brasil eu quereria que ela convivesse com ele e com a família.Ela com os seus quase 5 anos sabe algumas coisas sobre o pai. Não sabe tudo porque tem coisas que para já ela não ia perceber.
Sabe que é engenheiro, que canta. Sabe até as músicas dele todas. Já lhe mostrei algumas fotos dele.
Hoje tivemos uma reunião com o Diogo.
- Bem! Sem rodeios. Quem de vocês está disposto a voltar ao Brasil?
- Como assim, voltar? Eu olhei para Tomás e os dois para o Diogo.
- Estou em negociações com uma sociedade brasileira de engenheiros e arquitectos. Se as negociações derem resultado preciso que um de vocês seja o meu representante lá.
Não precisam de responder já. Na próxima semana viajo para lá. Ficarei um mês e depois de regressar resolvemos quem vai.
Eu e Tomás não dissemos nada mas saímos dali sem esboçar qualquer palavra.
- Voltar. Era a única palavra na minha cabeça.
- Estás tão calada Ju?
- Como tu.
- Não sei se quero! E o João? Ele ainda tem mais 2 anos de faculdade.
Disse Tomás.- Eu também não sei. Tenho medo do que vou encontrar.
- Medo de quê? Um dia destes a Matilde vai querer conhecer o pai.
- E se ele refez a vida? Não vou aguentar.
- É uma hipótese que tens que considerar sempre. Tu é que não te permitiste ser feliz.
- Mas eu sou feliz. Tenho a Matilde, a ti, a Joana, e o meu trabalho.
- Tu entendes. Podias ter dado uma chance ao Diogo.
- Não seria verdadeira com ele.
- Mas agora seria a altura ideal para regressar. A Matilde vai entrar na escola para o ano e assim iniciava lá e não havia o problema de integração.
- Isso tem sempre. Já viste que ela nunca falou como nós. É uma portuguesinha autêntica. Espero que isso não se torne um problema com os coleguinhas.
- Está decidido! Quando o Diogo voltar tu serás a opção.
Fui para casa com a cabeça a mil. Como estarão todos? Será que a Lia se lembra de mim? E o Rod., será que casou ou tem alguém?
Fui tomar um banho para refrescar as ideias.Brasil
Por algum motivo a fusão das sociedades não deu certo lá atrás. Hoje o assunto voltou a ser falado.
Estava chegando um arquitecto de Lisboa que pretendia ter representação aqui no Brasil.
Chegava na próxima segunda feira.
Terça logo pela manhã teríamos reunião.Arquitecto - Lisboa, duas palavras que me lembram dela.
Ela já deve estar formada se continuou os estudos e eu acredito que sim pois é muito determinada.
Terça acordei animado com a reunião.
Cheguei ao local e feitas as apresentações ficámos conversando enquanto a sala não estava pronta.- Então, de Lisboa?
- Sim. Mais propriamente de Cascais.
- É grande lá?
- O quê, Portugal? Cabe no estado de S. Paulo e ainda sobra muita gente.
Toca o telefone dele.
- Liguei sim. E só para a Ju pedir ao Tomás que vá para a reunião que eu tinha hoje. Esqueci-me de dizer.
- Está bem. Vou agora entrar para a reunião. Se precisar ligue depois. Adeus Ju.
Ju, Tomás, eu ouvi bem? Será que são os mesmos?
Quando vou para perguntar chamam-nos para a reunião.Tentei concentrar-me já que os assuntos a debater eram importantes mas vez em quando a mente vagueava.
Finalizados os acordos decidimos agrupar todos os serviços num só edifício.
Cada um teria o seu gabinete incluindo o representante do Diogo que vinha de Portugal. O Diogo só viria ao Brasil esporadicamente.Perguntei se almoçávamos juntos.
Todos tinham compromissos com excepção do Diogo.
Óptimo, pensei.
Seguimos para um restaurante que eu conhecia.
- Já veio alguma vez ao Brasil?
- Trata-me por tu já que vamos ser sócios.
- Vim 2 vezes a passeio.
- E em Portugal como vai o negócio?
- Vai bem. Não tenho razão de queixa. Por isso quero outros mercados.
- Casado?
- Não, porque ela não quer.
- E porquê?
- É apaixonada por outro mas não se vêem. Uma desilusão amorosa. Vive para a filha.
Já fui casado, mas agora só ela me prendia. Trabalha comigo mas tenho muito respeito por ela e pela vida dela. Somos bons amigos.- E tu?
- Solteiro. À espera de saber onde anda a minha princesa. Fugiu um dia por estupidez minha. Assim que souber vou lá buscá-la.
- Será que ela quer vir? Foi há muito tempo?
- 5 anos. Vai querer.
- Que coincidência!
- O quê?
- Nada. Uma ideia que surgiu agora.
Terminámos o almoço e cada um seguiu a sua vida.
Cheguei ao hotel e liguei ao Tomás.
- Tomás! Por acaso sabes o nome do pai da Matilde?
- Sei. Rodolffo. Porquê?
- Acho que o encontrei. Desculpa mas vai ser a Ju que vem para o Brasil porque ele está à espera de saber onde ela está para a ir buscar.
- Acho que o levo quando retornar.
- Nós já tínhamos decidido que era ela que ia regressar.
- Então está na hora de fazermos a nossa amiga feliz.
- Por favor não lhe contes nada. Deixa eu fazer surpresa.
- Prometo.
Cheguei a casa pensativo. Por um momento a luz acendeu no meu coração mas quando o Diogo disse que ela só vivia para a filha, foi como que um balde de àgua fria caísse sobre mim. Ou será que...
Não pode ser. Foi só uma vez.
- Diabo! Afasta de mim estes pensamentos.
Entrei debaixo do chuveiro e deixei a àgua correr por largos minutos.