Ressentimento

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...

Não lembra ao certo quanto tempo se passou desde que adentrou o quarto de Richarlyson, mas foi tempo suficiente para o garoto ficar cansado e cair no sono. Pisando de maneira cuidadosa sobre o chão da madeira do castelo, ele saiu do quarto do menor, fechando a porta, a todo momento certificando-se que não estava fazendo nenhum barulho.

Aos poucos, se afastava do cômodo, com um certo cuidado para não despertar seu filho. Ouvia vozes no final do corredor, quais reconhecia de longe, aquele sotaque mexicano era típico do rapaz. Roier falava em um tom mais baixo que o comum, provavelmente conversando com seu marido sobre a situação anterior. Fez questão de caminhar quietamente até lá, sem fazer um grunido sequer. Talvez poderia escutar sobre o que os dois tanto falavam.

— Eu realmente não sei... — Cellbit disse em meio a um suspiro. — Vamos esperar para ver o que ele diz.

O loiro apareceu atrás do brasileiro, que logo se virou para ver o que queria. Seu olhar parecia mais opaco que o comum: agora ele entendia o porquê. Não ter aparecido assim tão cedo, talvez tivesse ficado ali, ouvindo os dois conversarem entre si, mas a ansiedade já estava tomando conta de si, afinal, como Cellbit sabia? E quem mais sabia daquilo?

Se olharam em silêncio, qual durou pouco tempo: Forever não aguentava mais aquela sensação constragedora. Era agonizante, ficava aflito só de pensar. Aproximando-se um pouco do casal, tentou ao máximo não demonstrar seu receio, ele comentou:

— Ele finalmente pegou no sono — Disse enquanto sentava-se no mesmo sofá que permanecia o outro brasileiro ali presente, um pouco afastado.

— O Richas ainda não tinha dormido? — Roier questionou.

— Não. — Discordou com a cabeça, sem fazer contato visual. — Estava sentado, com a luz acesa e cara de paisagem.

Silêncio. Mesmo o rapaz não querendo aquilo, era inevitável. O casal se olharam entre si, como se lessem o pensamento um do outro: ambos tinham em mente perguntas parecidas, só não sabiam por onde começar.

— É melhor a gente ir direto ao ponto. — Cellbit afirmou, encostando suas costas no sofá, ajeitando a sua postura. — Por que você estava com o Philza? Esqueceu que seu filho quase morreu é?

— Não seja tão grosso com ele...

— Eu vou. Porque eu sei o quanto ele se preocupa, ou pelo menos o quanto ele demonstra se preocupar com o Richarlyson.

Forever pensou por um momento antes de responder. Tudo que ele falasse podia ser usado contra ele a qualquer momento. Cellbit também sabia disso, e se realmente fosse necessário, usaria.

— Eu tava mal pra caralho depois que aquilo aconteceu. Sei lá... me deu um treco. Meu corpo amoleceu e eu só conseguia chorar. Você provavelmente não viu isso porque estava preocupado com o Richas, e eu te dou razão por isso. Eu fui fraco aquela hora, me desculpa.

— Você teve uma crise, é isso?

Roier perguntava tudo com cautela. Ao contrário de seu marido. Queria entende-lo, e não condenar o mesmo por não estar presente quando o filho dele precisava. Não era como se o rapaz passasse pano para suas atitudes, mas nem por isso o julgava igual Cellbit.

— Eu acho que sim. É meio difícil compreender o que eu senti no momento. Era algo além do medo...

— Eu também chorei pra cacete e nem por isso eu tava por ai me esfregando com macho.

— Ele pelo menos me acalmou e me entendeu, diferente de você.

— Forever, você tá sendo hipocrita. Não era você que matava alguém se necessário pelo Richarlyson? Onde você tava quando ele quase morreu?!

— Eu acabei de te explicar isso porra!

— Dá pra parar vocês dois? Richarlyson está dormindo. — Roier era ignorado pelos rapazes, que pareciam cada vez aumentar o tom de voz.

— Você não estava tendo uma crise quando estava se beijando com o Philza lá na praia, feito uma piranha.

— Aquela hora tava um zilhão de pessoa aqui, deixei pra vir depois quando já tava tudo calmo pra conversar certinho com ele porra. E outra, agora você vai querer se meter na minha vida romântica?!

— A partir do momento que isso envolve o meu filho eu tenho a total liberdade de saber o que está acontecendo!

— Vai toma no meio do teu cu Cellbit!

— Ei ei! Chega vocês dois! Vocês estão passando dos limites. Forever ja pediu desculpa e se explicou, não é isso que você queria? Não tem o porquê dessa discussão idiota.

Os dois brasileiros se olharam, em silêncio: ali, naquela quietude, morava o ódio. O loiro não entendia o porquê do rapaz implicar tanto assim com ele. E Cellbit não aceitava o fato dele ter "trocado" seu filho pelo Phil. O rapaz serrou seus lábios, desviando seu olhar daquele que estava a sua frente e se dirigindo a Roier. Ele era o único que se manteu minimamente estável naquela conversa, seria melhor questionar as coisas para ele. E então fez, perguntando em um tom relativamente baixo, como se não tivesse gritando com o esposo do mesmo a segundos atrás:

— Só pra saber... Foi vocês que me viram lá em Copacabana?

— Foi o Maximus. — O outro brasileiro respondeu como se a pergunta fosse para ele, com um tom rude.

Ele engoliu aquela situação a seco: parecia que a cada segundo a situação piorava. Olhou para Cellbit novamente, logo desviando seu olhar para o mexicano. Mesmo tentando disfarçar, seus olhos transmitiam o que sentia: uma espécie de receio e arrependimento, misturado com espanto que teve ao ouvir aquilo.

— O Max...? — Perguntou novamente, ainda em choque com a situação.

— Foi ele sim. — Roier também afirmou com a cabeça. — Ele contou pra alguém, que contou pro Tazer e pro Craft, e agora todos nós sabemos... e provavelmente a ilha toda... — Disse a última parte em um tom mais baixo, quase num sussurro.

— Boa sorte com o Missa, piranha talarica.

Teve que lançar sua última frase antes de se retirar do local, indo buscar uma xícara de café, como de costume. Entre os dois rapazes que ali estavam apenas restou o silêncio, ecoando os passos de Cellbit pelo corredor do castelo. O loiro colocou sua mão sobre o rosto, tentando entender o porquê de beijar Philza naquele fim de tarde. Ele não sabia se precisava parar de agir por impulso, ou começar a ser um pouco menos imbecil: ou um pouco dos dois.

Ergueu seu olhar novamente, Roier o observava, com um olhar um tanto preocupado. Forever se sentia envergonhado. Levantou-se, dando alguns passos a frente, em direção onde ficava a warpstone.

— Eu vou indo. Obrigado por me defender Roier.

— De nada Forever. — Também levantou, aproximando-se um pouco do brasileiro. — Pode ir, vai ficar tudo bem.

— Eu espero...

O rapaz se teleportou, saindo do local e indo em direção a sua base.

Ilusões (CANCELADO)Onde histórias criam vida. Descubra agora