Gabriel tinha chegado cedo e afoito em casa, aquele tinha sido um dia cheio de felicitações para o menino, afinal era seu aniversário. Diego e Cris tinham lhe trazido presentes e lhe entregaram durante a aula. O trio ficara na sala durante o intervalo, enquanto os dois olhavam o amigo desembrulhar os presentes. Não era possível medir qual dos três estava mais ansioso, se era Gabriel que parecia estar perdendo uma batalha de vida ou morte contra o embrulho de papel que os pais de seus amigos fizeram, ou se eram Cris e Diego que se aninhavam cada vez mais em cima do amigo. Diego até roera as unhas dos dedos em antecipação.
Quando chegou em casa naquele dia, o menino não conseguia se aguentar de ansiedade para mostrar para sua mãe, o que seus melhores amigos tinham o presenteado. Assim que adentrou a sala de estar, ele arremessou a mochila após recolher de dentro um boneco do Godzilla que Diego lhe dera, seu amigo não conseguia compreender o que Gabriel via de interessante no monstro radioativo que aterrorizara a cidade de Nova York no blockbuster de 1998. Já Cris lhe presenteara com um livro de uma de suas escritoras favoritas. A menina pediu aos pais que comprasse "A Ilha Perdida", pois presenciara o amigo tentar alugar o livro na biblioteca diversas vezes, mas ele sempre não conseguia ter sucesso. Quando ele retirou o livro de dentro da embalagem, ficou muito animado, levantou-se de sua carteira naquele mesmo momento e envolveu a menina pequena e de óculos fundo de garrafa em um abraço de urso. Diego ficara enciumado ao ver a reação do melhor amigo ao receber um "livro estupido", de acordo com as palavras do garoto.
— Manhêe — gritou ofegante — Olha o que eu ganhei hoje!!! — completou após uma profunda tragada de ar.
O garoto estranhou a casa vazia, as luzes da sala estavam acesas, mas a televisão que era de costume estar ligada enquanto mostrava a novela das seis, na rede Globo, enigmaticamente estava desligada. Gabriel chamara pela mãe uma outra vez, sabia que haveria de estar em casa, pelo menos ela, já que seu pai não costumava retornar tão cedo por causa do trabalho.
— Mãe? — chamou novamente e desta vez mais desconfiado.
O pequeno coração de Gabriel enchia-se de frustração à medida que dava passos receosos pela sala. A alegria que o menino transbordara quando adentrou a casa, agora parecia aos poucos desaparecer dando lugar a um sentimento de preocupação. Teria sua avó ido para o hospital novamente? Justamente em seu aniversário?!
— Vó?
O menino não recebera nenhuma resposta. Finalmente chegou até a cozinha que estava com as luzes desligadas, ele já estava prestes a entrar em prantos quando finalmente alcançou o interruptor e iluminou o local, revelando sua mãe, avó e seu pai com chapéus de festa de aniversário na cor verde.
— Surpresa!!! — gritaram em uníssono.
Gabriel chorou copiosamente. Achava que passaria a noite de seu aniversário sozinho em casa, seu pai fora o primeiro a ir de encontro ao garoto e o envolveu em um carinhoso abraço. O homem de porte alto e fortes braços enterrara o menino contra seu peito, dando um beijo em sua cabeça, afagando os cabelos curtos do garoto.
— Ei, por que está chorando? — Seu pai perguntou confuso.
O menino tentou responder, mas entre uma fungada e outra, olhara para a avó que agora estava sentada e em seu colo tinha um cãozinho de pelagem marrom e orelhas grandes caídas, ela sorria para o menino que sentia-se aliviado por ela estar bem. Já a mãe estava atrás da mesa e tinha um largo sorriso em seu rosto.
— Parabéns, meu amor!
As lembranças de aniversário e outros momentos felizes, davam lugar para a interminável tristeza de ter perdido o único filho. Dona Claudia segurava um porta-retratos de Gabriel, em que o garoto estava ao lado dela e de sua dupla inseparável, Cris e Diego. A foto que ela segurava, era a de formatura do Ensino Fundamental, de três anos atrás. Gabriel se formaria ao final deste ano, se tragicamente não tivesse perdido a vida e deixado um imenso vazio no coração de todos.
VOCÊ ESTÁ LENDO
O Outro Lado do Anoitecer
FantastiqueO que você faria se descobrisse que um outro mundo pudesse se revelar diante de si toda vez que o sol se põe? Gabriel jamais imaginou que isso um dia poderia ser possível, e agora se vê obrigado a aprender as regras deste mundo tão estranho e hostil...