08. Não lute assim ou te amarei mais, disse a aranha para mosca

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Diego já não aparentava mais ter um semblante aterrorizado e vigilante, a calmaria finalmente tinha tomado o lugar de todas aquelas sensações indesejadas. Apesar de que o rapaz ainda parecia sofrer de algum mal que o afligia até mesmo em seus sonhos.

Por muitas vezes murmurou durante à noite, rolou pela cama inquieto, como se estivesse em um outro lugar. Como nas outras ocasiões, o rapaz sonhava com algo terrível, algo que vivenciava noite após noite até despertar na manhã seguinte em prantos e completamente suado.

Por diversas vezes, pensou em de uma vez por todas silenciar todos aqueles medos, todas suas angústias e vergonhas que lhe perseguiam desde a morte de seu melhor amigo. Gabriel, por sua vez, travava suas próprias batalhas internas.

Beba... Descubra todos os segredos que ele guarda...

Toda vez que encontrava-se neste estado de fome, ouvia os sussurros daquela maldita voz. Não sabia até quando conseguiria resistir aos seus instintos e desejos. Seus olhos se acenderam novamente.

O corpo de seu amigo adormecido soava mais como um convite, um banquete preparado especialmente para si. Gabriel cravara as unhas dentro da madeira do guarda-roupas. Com a porta semiaberta, observava o amigo durante o sono, pois ele mesmo não dormia. Os batimentos do coração de Diego pareciam lhe convidar como um canto xamânico, um que não podia simplesmente recusar, já que tudo em seu corpo aparentava estar em perfeita harmonia com aquela viciante canção. Os cheiros envolvendo aquele quarto invadiam seu ser, a fome falava cada vez mais alto, gritava dentro de si, dentro de sua cabeça, sentindo aquela mesma eletricidade, aquela mesma adrenalina.

Quando percebeu, já não estava mais dentro do guarda-roupas, mas sim, sobre a cama do amigo, que dormia encolhido. Gabriel era como uma aranha que capturara sua presa, sacudindo sua cabeça de um lado para o outro. Avaliava qual era a melhor forma de descender sobre o corpo do rapaz. Observava cada detalhe de Diego, desde o rosto muito bem desenhado, as linhas mais longas e finas, o formato de seus lábios, o bigode e cavanhaque que deixara crescer.

A pele bronzeada do amigo e o calor emanado, pareciam lhe chamar. O vampiro via nitidamente as veias do pescoço dele. Desceu sobre seu corpo, flutuando como um fantasma que se alimentava dos sonhos ruins dos adormecidos. A ponta de seus dígitos tocou o rosto de Diego, e sentiu a sutil diferença entre eles, como se estivesse tocando um fino véu que os separavam. O rapaz virou-se, e as unhas do vampiro arranharam sua bochecha, fazendo-o passar a mão em um reflexo inconsciente de espantar algo sobre seu rosto.

Um pequeno rastro de sangue se formou no rosto do rapaz, e todo o corpo do vampiro estremeceu em resposta. Os olhos devoravam a presa imóvel, sem que ela sequer percebesse o perigo iminente, perigo que Diego convidara para dentro de sua casa. Gabriel tocou a bochecha do amigo, e com a ponta do indicador, e a longa unha que adquirira, capturou a pequena gota rubra que se formava sobre a pele morna de Diego.

O vampiro levou o dedo a boca, sentiu todo o seu corpo estremecer uma segunda vez, algo gritava dentro dele, queria experimentar do néctar dos deuses que percorria pelo corpo de seu amigo. Suas presas estavam a mostra, não conseguia mais lutar contra o desejo que tomava controle de seu ser. Diminuiu a distância entre eles, podia sentir a respiração quente do rapaz sobre sua pele, seu peito subia e descia vagarosamente, junto das batidas de seu coração.

Como se ouvisse o tique-taque de um relógio preso à parede, Gabriel se deixava levar pela melodia que o coração do amigo tocava. Percebeu que ele parecia estar prestes a despertar.

— Continue dormindo — sussurrou no ouvido de Diego, que anuiu com um grande sorriso em seu rosto. Era como se o vampiro o embalasse em um sonho que finalmente compensava por toda a dor que sofrera.

O Outro Lado do AnoitecerOnde histórias criam vida. Descubra agora